O peso das palavras não ditas

Como a gente se liberta das coisas que não diz?

Regiane Folter
Deveria ter dito

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Foto de Glen Carrie en Unsplash

Como a gente se libera das palavras que ficam presas aqui dentro e terminam dando dor de barriga, falta de ar, palpitação? Daquilo que pensamos, sentimos e até planejamos como liberar, mas que simplesmente não conseguimos expulsar?

Conheço bem essa sensação. Na minha mente, dar vazão a essas palavras faz todo o sentido do mundo. Mas o resto do corpo parece não concordar. A boca fica seca, a garganta fecha, o diafragma se aperta, o caminho em direção à saída desaparece. Tudo fica escuro e frio e as palavras dentro de mim não entendem nada. Dão voltas e voltas como baratas tontas, desesperadas por ar e luz.

Não entendo completamente essa mania que meu corpo tem de se fechar para evitar que eu fale o que gostaria de falar. Por que é tão difícil fazer algo que preciso tanto pra me sentir melhor, mais leve? Por que a liberdade pra ser e falar o que penso me assusta tanto? Sei que falar sem amarras vai me fazer bem porque já aconteceu antes. Já me libertei. Em algumas ocasiões as palavras cativas conseguiram escavar seu caminho pra fora de mim e ganharam o mundo. Me senti aliviada. Elas eram o peso que me prendiam ao chão e quando se foram, eu levitei.

Admito que nem sempre falar o que deu na lata foi uma experiência boa. Em algumas situações, falar algo que pensava me fez sentir menor, frágil, desamparada. Foram vezes nas quais errei, decepcionei alguém, ou simplesmente não soube me defender. Disse coisas que me deixaram com vergonha. Feri meu orgulho e me senti minúscula, tão, tão invisível, quase como se meus átomos se apagassem pouco a pouco. Desintegrei.

Acho que tenho medo de dizer meus pensamentos em voz alta porque sempre temi a resposta sarcástica, a pena, a visão negativa que as outras pessoas poderiam ter sobre mim. As palavras que habitam outros cérebros me apavoram quase tanto quanto as que levo comigo. Também me assusta a possibilidade de entrar em discussões que não sei se poderei vencer porque não sei o que está do outro lado das frases uma vez faladas. Enquanto somente as penso, me sinto resguardada. Palavras não ditas não existem realmente. É dolorido guardá-las aqui dentro, mas ainda assim são só minhas, de mais ninguém. A partir do momento que o pensamento ganha o mundo real, minhas palavras se tornam de todos e todas. Podem ser usadas contra mim.

Com os anos, aprendi a lidar com a angústia de ter que cuidar de pensamentos aprisionados. Os domestiquei. Não posso dizer que o incômodo diminuiu, mas sim que aprendi a conviver com ele. Mesmo assim, às vezes me arrisco. Com algumas pessoas, em alguns momentos, me jogo e tento, hesitante, liberar algumas das palavras que tanto anseiam por sair. Às vezes dá certo, às vezes não. E às vezes, somente escrever o que carrego na alma basta pra me perdoar e me libertar.

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Regiane Folter
Deveria ter dito

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