Falta tempo pra ter tempo

Lucas Guarnieri
Lucas Guarnieri
Published in
5 min readOct 13, 2015

O que mais ouço ultimamente é: não tenho tempo pra isso. Posso estar conversando com amigos, parentes, professores, colegas de trabalho, todos se queixam da mesma coisa.

Concordo e também me percebo muitas vezes vivenciando esta mesma sensação, parece que os dias estão realmente passando mais rápido, parece que os anos passam em uma velocidade que não conseguimos acompanhar.

Fonte: https://www.pinterest.com/pin/389209592768040395/

Há alguns anos atrás — ainda menor de idade pensando em entrar pra faculdade — os mais velhos me diziam: “daqui pra frente vai passar muito rápido”. Aquilo realmente não fazia sentido pra mim. Como que, de uma hora pra outra o tempo vai passar mais rápido? Não tem como, sempre fui muito racional. As vezes até demais (desconsiderando os meus universos paralelos, que vou tentar explicar outro dia).

Segui os planos e entrei pra faculdade. No começo tudo certo, conseguia me dedicar aos meus estudos e também ao meu trabalho. Com o passar dos meses o trabalho foi exigindo mais de mim. A faculdade também foi proporcionalmente exigindo mais de mim. Já não conseguia tirar tempo para lazer, pensava que era provisório e que mudaria logo: “é uma fase”. Não era.

Num piscar de olhos minha vida tinha mudado. O tempo de sobra que tinha antes não existia mais. Eu senti o tempo escorrendo pelos dedos da minha mão. Eles tinham razão! Droga!

O tempo realmente passa mais rápido agora. Não é que a rotação da terra tenha mudado só pra mim, mas preciso fazer muito mais, produzir mais, estudar mais, no mesmo tempo que a Terra continua levando para girar no próprio eixo. Isso é realmente muito confuso.

Recentemente li um artigo (link abaixo) sobre o nosso estilo de vida já ter sido planejado e como somos manipulados pelas grandes corporações e mídia para nos fazer ter pouco tempo livre, e com isso consumir cada vez mais para saciar nossa vontade voraz de “aproveitar a vida”.

No começo da leitura isso me parecia uma teoria da conspiração cruel, mas… faz todo sentido. Tenho que assumir.

Somos manipulados desde cedo, nos fizeram acreditar que o melhor para nossas vidas era estudar do método mais tradicional possível (nos ensinaram a decorar desde cedo), buscar um emprego em uma área que gostamos (mas que fosse financeiramente viável, afinal ninguém vive de um sonho), sendo que na maioria das vezes nós nem sabemos o que gostamos, aliás, precisamos gostar de uma única área na vida? E como sei que realmente gosto disso? Acho que isso é tema para outro post.

Isso nos foi imposto de uma maneira tão eficiente que não conseguimos até hoje entender como frear este movimento. Não, nossos pais não são os culpados. Eles também seguiram o que parecia melhor para nós. A questão é: como podemos quebrar essa linha de raciocínio que cria operários para suprir as necessidades da cadeia produtiva? Não sei, e você com certeza não vai achar respostas neste artigo. Desculpa aí, não escrevo conteúdo motivacional.

Recentemente tive o prazer de ser aluno do professor Aurélio Andrade, que em uma aula sobre pensamento sistêmico resumiu muito bem o nosso padrão de vida atual através de uma análise simples mas ao mesmo tempo reveladora. Ele utilizou uma ferramenta de pensamento sistêmico para criar um mapa mental da nossa lógica de vida:

Calma que eu explico!

Quanto mais trabalho, mais tenho renda, mais tenho despesas, menos sobra. Se sobra menos, tenho proporcionalmente necessidade de trabalhar mais. Se trabalho mais, tenho menos tempo livre mas mais renda. Com mais renda tenho mais despesas, e por aí vai.

Isso parece realmente muito óbvio. Porém, na loucura do dia-a-dia muitas vezes não nos damos conta. Não digo realmente que isso esteja errado. É assim que crescemos na vida, trabalhando, aprendendo, fazendo dívidas e deixando nosso tempo pessoal de lado. É necessário abrir mão de alguma coisa para se ter outra. Na balança é isso mesmo.

Mas espera aí! Precisamos abrir mão do único recurso não-renovável que dispomos em nossas vidas para acumular bens? Para trocar de carro, ter o smartphone top, ter o computador top, ou outros itens de consumo — supostamente — duráveis, mas que com o tempo vão se desvalorizando e terminando.

Compramos essas coisas com dinheiro. Mas o que compra o dinheiro? nosso tempo. Se analisarmos os fatos, compramos o que pode não ser realmente necessário em troca do nosso tempo, para investir o que nos resta de tempo nelas, sendo que estes mesmos produtos serão desgastados por quem? pelo próprio tempo! Aliás, este que durante todo esse fluxo não parou de correr.

Só pra mim isso não faz sentido?

Analisando tudo isso tento aos poucos mudar o rumo da minha vida. Eu realmente parei com essa loucura de querer trocar de carro de tempos em tempos, de ter um smartphone top, de ter um computador caríssimo. De forma geral desisti de projetar compras de bens que não me agregam mais do que capital e um cartão de crédito com dezenas de parcelas pendentes. Não me parece mais um modelo de crescimento sustentável.

Além disso, tenho buscado experiências e sensações diferentes. Ouço música diferente, vou à restaurantes comer algo novo (não precisa ser caro pra ser diferente, ok?), vou em festas e eventos que me provoquem sensações novas (tem TEDx de graça rolando por aí e um monte de conteúdo bacana no youtube). Estudo sobre o que me parece interessante, sem grandes objetivos. Me divirto e aprecio mais as coisas simples.

Durante minha adolescência tinha pretensões realmente ambiciosas, queria ter dinheiro, ter uma casa gigante, ter um carro novo. Hoje — um pouco mais maduro — meus objetivos são outros, quero ter uma vida tranquila, viver perto de quem me faz bem, viver boas experiências.

Quero fazer a diferença na vida das pessoas e fazer a minha valer a pena. Não quero mais lutar contra o tempo (essa luta já começa perdida) gastando-o pra conseguir dinheiro. Quero fazer o tempo valer a pena e viver com o necessário. Se o dinheiro entrar nessa conta, bem vindo, se não entrar, paciência, vou viver com o que conseguir. O tempo não vai me dar outra chance.

— postado originalmente no lucasguarnieri.com

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