Música para danças fractais, #devir46

Marcelo Maceo
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Published in
2 min readSep 21, 2018

Veja Guilherme, se entregando ao espontâneo instantâneo.

Perde toda noção de si mesmo, esquece da pseudo-existência de sua própria individualidade, simplesmente, perde-se.

Nesta perdição seu corpo erra por todos os movimentos. Não pensa. E não é Guilherme que sente. Ele é o instante fractal de aromas multicoloridos.

Ele é fluxo e muitos e, neste estado, encontra-se na multidão.

Quem embala esta dança é aquela música debilmente conhecida como clássica, erudita.

O que será que Guilherme ouve? Com que ouvidos Guilherme escuta?

Com certeza não com os seus. Ninguém escuta a música a não ser ela mesma. Ninguém dança a música a não ser ela mesma.

Quem é esta harmonia? Onde está esta melodia? Qual a fonte destes ritmos?

Nunca um dançarino embalado pela mediocridade imaginaria tantas nuances de amor, vôos de tristeza, explosões de agressividade, a depressão do profundo abismo e a sublimação do êxtase em uma só e mesma música… essa mesma, erudita, transpirando em seu próprio corpo todos os movimentos que desejam sair e beijar o toque do ar.

Aqueles críticos aprisionadores de corpos, burocratas do movimento, sacerdotes da expressão, buscam sem compreender os motivos que originaram o instante mais inovador de seus corações. Gelo que se quebra de dentro pra fora, porque aquela dança é semente que irrompe a vida.

Esta música não deveria possuir nada como uma técnica. Seus co-autores conectados pelo fluxo que embala os mistérios de nossa própria humanidade expressavam a metamorfose caótica que somos. A escrita musical foi a jaula segura da sociedade domesticada. Por trás de cada nota, um universo borbulhando de invenções.

Não é Guilherme que dança. É o autor, o músico, a orquestra, os ouvintes, toda humanidade. Seu suor mostra que não há tempo nem espaço que limitem quem somos.

Fractalmente, todos.

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