Como as redes sociais distorcem a realidade?

A revolução digital e a ascensão das múltiplas realidades

Victor Góis
digitalmente
4 min readApr 15, 2018

--

Arte de Carl Bearsley

Vamos ser sinceros por um minuto. Quanto tempo vocês passam na internet por dia? Quanto desse tempo vocês estão interagindo em alguma rede social? Nós temos uma breve impressão de que passamos muitas horas por semana dando atenção às telas. E uma dessas telas em especial. Um estudo recente sobre o uso de aparelhos mobile no Brasil deixa claro, em números, o quanto do nosso dia dedicamos ao uso do celular. No ano de 2016, o brasileiro, gastou em média, 3 horas e 14 minutos de seu dia acessando a internet pelo celular. Média maior que todos nossos vizinhos sul americanos. Agora, se formos olhar para quais aplicativos nós usamos mais, acho que não precisamos de dados para confirmar nossas suspeitas.

Sim. Estamos gastando muito tempo em redes sociais. E sem fazer juízo de valor sobre se é certo ou errado gastar seu tempo com isso. Eu mesmo gasto mais tempo no youtube do que deveria. Contudo, quando contextualizamos estes dados com o cenário político, econômico e social que nos acompanha nos últimos anos, é impossível não fazer relação alguma. Não faltam estudos, brasileiros e gringos, sobre a relação entre o consumo de mídia digital e política. Então, se formos ir um pouco mais a fundo nisso, precisamos entender de maneira simples como funcionam os algoritmos que trazem os feeds de notícias.

Fluxograma de um algoritmo simples

Um algoritmo é basicamente uma fórmula matemática. Então, como em uma equação qualquer, temos variáveis. O algoritmo do facebook possui centenas de variáveis. Cada ação que você faz dentro da rede social conta como uma variável. E cada variável apresenta um peso diferente. Logo, duas timelines nunca vão ser idênticas. O problema deste modelo é que a partir de um momento tudo o que te alcançar nas redes sociais será produto de escolhas que você não fez realmente. Tua percepção do meio digital, como realidade, não irá condizer com a condição da maioria e, portanto, a realidade. Outro fenômeno negativo que tem acontecido bastante, principalmente no queridinho dos brasileiros, o Whatsapp, são as chamadas Fake News.

As Fake News são nada mais do que notícias falsas. O Whatsapp, ao contrário do facebook e do twitter, não possui um feed de notícias. Sua característica que permite a proliferação de conteúdo enganoso é exatamente a facilidade de se compartilhar esse conteúdo. E aí ajuda nesse processo, nossa própria cultura, aonde queremos sempre ter razão. Afinal, quem nunca brigou com alguém e saiu de algum grupo?

Talvez, o que estamos aprendendo com tudo isso é que a percepção do que é chamado de real, que antes era individual e influenciada por limitados meios de comunicação, tenha mudado drasticamente com o avanço da internet. De acordo com o filósofo francês Jean Baudrillard:

Imagens e signos se tornaram mais reais para nós do que a realidade em si mesma.

Logo, faz todo sentido que fenômenos como fake news e pós verdade tenham aparecido com força nos últimos anos. O atual presidente da maior potência do mundo foi eleito contando mentiras em uma rede social. E em tempos de questionamento do que é verdade, o jornalismo como o conhecemos se encontra em uma situação bastante delicada. Principalmente aqui no Brasil que, a exemplo dos Estados Unidos, tem sua mídia televisiva e impressa se segmentando cada vez mais.

Umberto Eco. The Paris Review/Reprodução

“O drama da Internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade”

Disse o filósofo e escritor Umberto Eco em 2015. Eu concordo com a frase de Eco, mas sou um pouco mais otimista. Acredito que a relação entre mídia digital e sociedade é um dos desafios do século XXI. É um desafio que passa por questões complexas como inclusão digital, regulação da mídia nacional e fomento a produção independente. E mesmo que a internet que hoje conhecemos seja controlada por poucos, prefiro pensar no seu potencial como força democrática. Sejamos essa mudança.

Este ensaio está disponível no formato de vídeo ensaio no nosso canal no youtube: https://bit.ly/2JLiWi6

dgtl.mente. 2018

--

--

Victor Góis
digitalmente

Pesquiso e produzo sobre cultura digital. Me interesso pela convergência entre comunicação, filosofia, arte, política e tecnologia.