Humanidade e Narrativa | Sapiens e a Revolução Cognitiva

Seres humanos, seres contadores de histórias.

Victor Góis
digitalmente
4 min readMar 31, 2018

--

Nós contamos, ouvimos e acreditamos em histórias desde que passamos a andar sobre duas pernas. Talvez até antes. Na verdade, o começo da nossa história como espécie teve início, segundo alguns, a partir do que chamamos hoje de revolução cognitiva. Antes disso, éramos pré-históricos, ou seja, vivíamos um período antes da história. Foi só quando conseguimos expandir nossas formas de comunicação que passamos a fazer as perguntas triviais da nossa espécie e que até hoje não encontramos respostas definitivas:

De onde viemos? Para onde vamos?

Mais importante que isso, foi a partir da revolução cognitiva que nossa espécie conseguiu formular respostas para essas perguntas que fizessem sentido para toda uma comunidade de homo sapiens.

Animais bastante similares aos humanos modernos surgiram por volta de 2,5 milhões de anos atrás. Mas, por incontáveis gerações, eles não se destacaram da imensidade de outros organismos com os quais partilhavam seu habitat, inclusive outras espécies de humanos. Sim, nós Homo Sapiens somos apenas uma espécie de ser humano. Aliás, a única que restou para contar história. É o que nos conta Yuval Noah Harari, o autor do bestseller “Sapiens — Uma Breve História da Humanidade”. Segundo Harari, esses humanos arcaicos possuíam relações de amizade, amor e competiam por status e poder, mas da mesma forma o faziam outros animais como chipanzés, elefantes e o Homo Erectus (nosso primo não tão distante assim).

Yuval Noah Harari/ Reprodução

Por algum tempo acreditamos e creditamos ao nosso cérebro (e seu tamanho avantajado) o maior crédito por nos propiciar uma capacidade cerebral maior do que os dos nossos primos hominídeos. Mas lembrem-se. Embora um cérebro grande ofereça vantagens, ele também apresenta grandes desvantagens. Nós tínhamos que passar mais tempo em busca de comida, pois apesar do cérebro ser equivalente a 2 ou 3% do peso corporal, ele consumia 25% da energia do corpo quando estava em repouso. Em segundo lugar, nossos músculos atrofiaram. Justamente por toda essa energia estar sendo canalizada para outro lugar. A gente desviava uma grande quantidade de energia dos bíceps para os neurônios. E essa é uma característica bastante importante quando se está lutando pela sobrevivência.

Como então o homo sapiens conseguiu se tornar essa espécie que domina o mundo inteiro e que em breve irá mandar pessoas a outros planetas?

O próprio Harari nos esclarece: “a resposta mais provável é propriamente aquilo que torna o debate possível. O Homo Sapiens conquistou o mundo, acima de tudo, graças à sua linguagem única. (…) O surgimento de novas formas de pensar e se comunicar, entre 70 mil e 30 mil anos atrás, constituiu a Revolução Cognitiva. O que a causou? Não sabemos ao certo. A teoria mais aceita afirma que mutações genéticas acidentais mudaram as conexões internas do cérebro dos sapiens, possibilitando que pensassem de uma maneira sem precedentes e se comunicassem usando um tipo de linguagem totalmente novo.”.

Homo Neandertalis/Reprodução

E o que tem de mais especial na linguagem humana?

Nós podemos consumir, armazenar e comunicar uma quantidade extraordinária de informação sobre o mundo à nossa volta. Contudo, a versatilidade, mesmo tendo sua importância, não é o grande diferencial da nossa linguagem. O que nos diferencia como espécie é a capacidade de criar e transmitir informações sobre coisas que não existem. Somente os sapiens podem falar sobre coisas que nunca viram, tocaram ou cheiraram. E dessa forma criar realidades paralelas. “Lendas, mitos, deuses e religiões apareceram pela primeira vez com a Revolução Cognitiva. Antes disso, muitas espécies animais e humanas foram capazes de dizer: ‘Cuidado! Um leão!’. Graças à Revolução Cognitiva, o Homo sapiens adquiriu a capacidade de dizer: ‘O leão é o espírito guardião da nossa tribo”, esclarece Harari.

O autor afirma que a capacidade de falar sobre ficções — que também são conhecidos no meio acadêmico como “construtos sociais” ou “realidades imaginadas” — é a característica mais singular da linguagem dos sapiens. E diz que “a ficção nos permitiu não só imaginar coisas como também fazer isso coletivamente. Podemos tecer mitos partilhados (…). Tais mitos dão aos sapiens a capacidade sem precedentes de cooperar de modo versátil em grande número (…). Foi o surgimento da ficção que possibilitou que um grande número de estranhos pudesse cooperar de maneira eficaz por acreditar nos mesmos mitos. Toda cooperação humana em grande escala — seja um Estado moderno, uma igreja medieval, uma cidade antiga ou uma tribo arcaica — se baseia em mitos partilhados que só existem na imaginação coletiva das pessoas.

Contudo, é importante salientar que uma realidade imaginada não é em si uma mentira. Ao contrário da mentira, uma realidade imaginada seria algo em que todo mundo acredita e, enquanto essa crença partilhada persiste, essa realidade exerce influência no mundo e em todas as pessoas que compartilham do mesmo construto social. Harari arremata:

Como você faz para as pessoas acreditarem em uma ordem imaginada como o cristianismo, a democracia ou o capitalismo?

É simples. Nunca admita que a ordem é imaginada.

Olá. Meu nome é Victor e este foi mais um ensaio no digitalmente. Desta vez, usei como base para este ensaio um texto de Santahelena aqui no medium. Muito obrigado e até o próximo ensaio.

O texto original pode ser encontrado em https://medium.com/@raulsantahelena/sapiens-e-a-revolu%C3%A7%C3%A3o-cognitiva-ce2f804af4b8

--

--

Victor Góis
digitalmente

Pesquiso e produzo sobre cultura digital. Me interesso pela convergência entre comunicação, filosofia, arte, política e tecnologia.