#Entrevista | Bivolt: “As mulheres estão tomando o espaço (no RAP) que é delas”

adailton moura
adailton moura
Published in
5 min readNov 24, 2017

De longe, avisto uma garota toda de branco no palco. Me aproximo. Ela tem energia. Não para. Vai de um lado ao outro. Levanta o público.

Bárbara Bivolt canta, rima, grita. Tem energia. Ela faz um free enaltecendo a feminilidade. Diz: primeiramente Fora Temer. A atitude da MC chama a atenção da produção da “arena” patrocinada por um banco. “Ela não pode fala isso, diz a produtora a assessoria da artista. Observo os movimentos. Bivolt dança com os beats explodindo nas caixas.

Quando termina sua performance, Bivolt conversa com todos. Abraça, tira fotos, distribui adesivos. Entre diversos artistas que fazem apresentações na Paulista, em São Paulo, Bárbara foi escolhida para tocar em um dos palcos terciários espalhados pelo maior festival de música do planeta, o Rock In Rio.

Conversamos ao som dos tamborzões do Dream Team do Passinho. É claro que a Bivolt queria curtir o FUNK, eu também.

Parou de participar das batalhas?

Não é que eu parei de batalhar. Na verdade eu não tenho mais tempo. Graças a Deus, o fluxo de trabalho está aumentando e as batalhas são de sábado. Então… fica meio difícil ir na batalha do Santa Cruz. Mas sempre que eu colo, faço alguns freestyles só pra deixar uma marquinha.

E como está sendo essa mudança? Agora, o trabalho ficou sério.

Então! Eu tô trabalhando o meu disco, a mixtape “Lado B”. Já lancei dois clipes neste ano. Vou lançar mais trabalhos até o lançamento do álbum (previsto ainda para 2017). Pretendo soltar mais dois videoclipes, tá ligado!? A parada é que eu tô tendo a oportunidade de realizar coisas que eu sempre quis, tá ligado!? Gravar um disco é muito difícil fazer (financeiramente) do jeito que eu quero. Ainda é muito difícil alguém chegar e abraçar o seu sonho, te apadrinhar. Então, eu tive que batalhar muito pra conseguir fazer um disco do meu jeito, fazer o meu videoclipe com a minha cara, com o meu rap. A gente tá numa era no rap nacional que é muito hype… é muito: o que vai da certo? O que não vai dar certo? Mas eu estou mais voltada a ser o que eu sou, deixando de acompanhar essas “novidades”… ao mesmo tempo dá um pouco de insegurança. Tipo: a gente quer fazer um trap, mas não fluiu ainda. Pode ser que uma hora aconteça. Mas a gente vai fazendo do nosso jeito. Vai rolar na hora que bater a inspiração.

Este é o momento das mulheres no rap?

É assim: existe mulher cantando desde sempre, só que não é interessante para os homens ter mulheres como protagonistas na música. Eles não se sentem representados. Mas, quando você é uma mulher que canta e influência outras garotas, aí sim elas vão se sentir representadas e se identificar com o que você está falando. Muitas vezes a menina que curte seu som tem até vontade de fazer o que você faz, mas não bota a cara porque não tem um incentivo. E foi isso que eu acho que aconteceu com o rap atual. As mulheres estão botando a cara, porque estão se sentindo mais confortáveis, tá ligado!? Muitas meninas estão se descobrindo. Quando eu comecei a batalhar não tinha mulher que batalhava. Era uma ou outra, e olhe lá. Hoje, quando eu colo na batalha, tem oito MCs mulheres, oito MCs homens; uma batalha só de mulher; batalha só dos gays. Então, as mulheres estão tomando o espaço (no RAP) que é delas. É nosso. Se depender de mim, as minas podem contar comigo no que for pra ajudar essa parada a crescer mais. Eu sei como é necessário ter essa representatividade e esse poder que a gente cria trabalhando junto.

O que te inspira?

Tudo eu transformo em música: a minha história de vida, o meu cotidiano, tudo é música. É tipo aquela música do Chorão (talvez “Dias de Luta , Dias de Glória”)… (canta) “fazer história triste virarem melodias”… eu tô na emoção ainda, esqueci até a letra agora. Mas é isso. Pego as paradas que acontecem na minha vida e faço virar música.

E quem te inspira?

Vários artistas. Desde a cena nacional, como a internacional. Mulheres: Negra Li, Flora Mattos, Karol Conka, Cris SNJ… Elas foram essência pra mim, tá ligado!? Eu sempre ouvi e falava: as minas são novas, bonitas e botam a cara. E mesmo com um monte de homem em volta, (foda-se) elas vão lá e faz acontecer do mesmo jeito. Isso é foda. Sempre sonhei em ter um grupo tipo The Fugees. A Lauren Hill, Wyclef Jean [é interrompida por uma fã que pede para tirar uma foto]… eu corri atrás dessa parada no sonho de ter um grupo de rap. Até montei o grupo, só que as paradas fluíram melhor pra mim sozinha, sabe!? Mas eu não sei o dia de amanhã.

Este aqui não é um dos palcos mais fodas (principais) do festival [ ela me interrompe]…

É sim!! É fodissimo!!!

Como é essa experiência de tocar no RIR e ter esse contato direto com o público?

O que acontece!? São vários palcos aqui no Rock In Rio: o Palco Mundo, que recebe atrações internacionais e da elite musical brasileira… dos que conquistaram seu espaço. No Sunset tem música mais alternativa. E este aqui, o Novo Mundo, é um palco onde o Itaú reuniu pessoas que ele acredita que tem potencial pra fazer um mundo melhor. O que aconteceu: eles acharam a gente cantando na rua. Eu tava cantando na rua (na avenida Paulista), e eles bateram o olho e falaram: mano, vamos chamar ela. Tipo assim: eu já passei por tanta coisa na minha vida, sabe!? E esse convite caiu no momento certo. Foi um “combo” que os Orixás me deram. É um momento que eu estou em ascensão comigo mesma, não é nem externa, é totalmente interna. Eu estou me sentindo muito preparada para enfrentar tudo e todos. Eu quero brilhar igual o sol. Eu quero aquecer cada ser-humano que existe na terra. Foi um convite que eu aceitei de braços abertos… fiquei muito feliz e realizada de estar fazendo parte de tudo isso aqui. O pessoal me recebeu super bem. As mulheres se identificando… eu acho que fiz o meu papel. Eu cumpri minha missão aqui no Rock In Rio, porque eu trouxe o rap nacional, trouxe o feminismo, trouxe minha marca, trouxe a Bivolt. Estou muito feliz.

_publicado em 24/11/2017 no RAPresentando

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adailton moura
adailton moura

jornalista. autor do livro “A Indústria da Música Gospel”. txts no @ RAPresentando, Sounds and Colours, TAB UOL, AUR, Rapzilla, Per Raps, Bantumen, Gospel Beat.