Nem tudo dá certo​

adailton moura
adailton moura
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3 min readDec 1, 2017

Mas tende bom ânimo

Acredito que tudo vai dar certo. Oro a Deus. Confio. Tenho fé. Os pensamentos são positivos. Me blindo da negatividade. Planejo. Crio expectativas. Faço a coisa certa. Mas, NEM TUDO DÁ CERTO. NEM TUDO É BENÇÃO. E não foi por falta de aviso. Jesus havia dito que teríamos aflições [João 16.33]. E não há isenção. Cada um tem sua “cruz” para carregar. O peso é relativo. Uns superam. Outros desistem. De imediato, julgamos os que abandonam a luta sem ao menos ter a pretenção de saber o motivo. É fácil opinar e fazer análises observando de uma posição confortável. Difícil é se colocar no lugar de quem “sofre”. Alegramos com os que cantam. Já, chorar com os que choram é desfavorável. Não compensa.

Salomão escreveu: “O coração do sábio está na casa onde há luto, mas o dos tolos, na casa da alegria*”. O “problema” é que não estamos preparados para lidar com a dor alheia. Infelizmente, aprendi da pior maneira. Experimentei o féu sem poder recusá-lo.

Perdi a Serena.

TUDO saiu do controle. O plano seria ter um parto em casa. Estávamos esperançosos para que dessa vez fosse possível, pois o do Anthony teve de ser no hospital por conta da pressão alta que surgiu no período gestacional. Era a oportunidade de realizar o sonho frustrado. Ouvíamos: dessa vez VAI DAR TUDO CERTO. Energias positivas. Orações. TODOS os exames perfeitos. A Serena crescia saudável. Aí, veio o baque. Em 1º de maio, a Ana deu a luz com 26 semanas de gestação. De imediato, a Serena foi colocada na incubadora e levada para a UTI neonatal. Viveu pouco mais de 3 horas.

DEU TUDO ERRADO. Sepultei minha filha.

Uma enorme lacuna ficou aberta. É difícil compreender o propósito. Mais difícil ainda é aceitar. Perder é complicado. Sempre estamos convictos que vamos vencer. Queremos sempre ter a posse. A verdade é que NÃO TEMOS POSSES. Chegamos e partimos de mãos vazias. Observo que só refletimos sobre isso, quando estamos junto de pessoas enlutadas — ou vivemos o luto. É como o atleta vencedor: ele só pensa nas consequências da derrota quando perde uma importante competição.

Os dias passam. Os questionamentos aparecem: por que os “amigos” se afastam nos momentos obscuros?; por qual motivo as pessoas estão pouco dispostas a simplesmente ouvir seu desabafo?; preciso silenciar minha história para que as pessoas não fiquem preocupadas com as intempéries?

As respostas são vagas. Suponho que seja pela falta de tempo. A correria. O trabalho. Os estudos. As prioridades. O medo de que o meu problema se torne o problema dos outros. Não há culpados. Humanos erram. Talvez eu tenha cometido os mesmos erros. Mas nunca é tarde para mudar.

Vivemos acomodados. E, pela liquidez dos relacionamentos, abandonamos o ESTAR JUNTO. A união que a tecnologia proporcionou, também fez separações. Mensagens substituíram os diálogos. E as palavras não se converteram em ações. NEM TUDO DÁ CERTO. APRENDI A LIÇÃO.

Evolui em tempo recorde. Abri os olhos para aquilo que não enxergava, quando levava minha “estável” vida. Fiquei mais empático. Amadureci. Reprogramei os objetivos.

O processo de transformação foi doloroso, mas extremamente necessário.

*Eclesiastes 7:4

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adailton moura
adailton moura

jornalista. autor do livro “A Indústria da Música Gospel”. txts no @ RAPresentando, Sounds and Colours, TAB UOL, AUR, Rapzilla, Per Raps, Bantumen, Gospel Beat.