A moda como plataforma para as questões de gênero
A moda é a plataforma mais adequada para questionar as questões de gênero na sociedade. Ela pode ajudar na discussão quando olhamos para sua história e a questionamos mas, por outro lado, oprimir no presente quando imposta. Em 2016 o desfile-protesto da Chanel, trouxe de volta a pauta feminista para a moda. As coleções seguintes da semana de moda masculina de Londres e Milão pareceram vestir homens e também mulheres, e Miuccia Prada questionou a divisão masculino/feminino colocando modelos mulheres no desfile masculino da grifee mostrando que essa divisão de gênero parece estar mesmo ultrapassada.
Mas o assunto não é novo. No início do século a estilista Coco Chanel trocou saias bufantes por calças compridas e espartilhos por camisas. A moça foi ousada e deu o primeiro passo em questões que até hoje parecem difíceis de serem assimiladas. Nos anos 1970 Yves Saint Laurent colocou o tradicional Smoking masculino num corpo feminino e fez com que as mulheres fossem as protagonistas. O momento ajudou: uma década mais tarde, as mulheres se apropriaram de ombreiras e terninhos, ressignificando estes elementos enquanto conquistavam seu espaço no mercado de trabalho. A androginia nunca antes foi tão necessária.
E falar em androginia em 1970 e 1980 é falar de música. Nessa época, a cena musical e os artistas mais expressivos se questionavam sobre o que era de homem e mulher. David Bowie se dissociava de gênero através de seu personagem, Ziggy Stardust. Madonna surgiu na cena pop vestindo trajes tipicamente masculinos para mostrar o poder feminino na sociedade. No Brasil, Ney Matogrosso era o principal expoente da androginia à moda da casa.
Na moda atual Andrej Pejic se tornou o principal modelo andrógino e desfilou tanto para marcas masculinas quanto femininas (vale destacar que hoje, Andrej se define como transsexual). Conchita Wurst foi outra modelo que, descoberta num reality show de música, onde se apresentou com cabelos longos e barba, ganhou visibilidade internacional por meio de um visual no mínimo questionador, logo foi parar nas passarelas da semana de moda de Paris. Estrelou campanhas e viajou o mundo.
Ainda que na arte as questões de gênero parecem avançar, na sociedade o efeito das discussões é mais homeopático. Mas há efeito. Cada vez mais marcas têm investido em moda agender, derrubando a barreira do gênero. Assim como as mulheres, que se apropriaram de peças antes masculinas para conseguirem, de certa maneira, conquistar seu espaço, hoje os homens estão mais à vontade para fazer o oposto. As questões de gênero chegaram na TV aberta, no entretenimento de massa, nos almoços de domingo.