Uma breve história da roupa listrada

Dhyogo Oliveira
Dhyogo Oliveira
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3 min readAug 14, 2020
Imagem de homens vestindo trajes de banho listrados. Domínio público.

Se há uma padronagem que está presente do guarda-roupa de todas as pessoas, independente de gênero, classe social ou idade, certamente é o listrado. Comecei essa pesquisa observando, em meu próprio guarda-roupa, a diversidade de listrados em tecidos de inverno e verão, tamanhos, espessuras e cores. Após algumas leituras cheguei a conclusão de que ele ainda é o mais democráticos dos padrões. Mas nem sempre foi assim.

Foi na natureza que o homem identificou as listras pela primeira vez. A pele das zebras, girafas e até mesmo dinossauros serviam de camuflagem em seu habitat. Fazendo um paralelo com a moda, uma das leituras possíveis é que até hoje usamos os listrados para se camuflar.

O livro “The Devil’s Cloth: A History of Stripes” de Michel Pastoureau se debruça sobre os significados que as listras e os tecidos listrados tiveram e tem na história da sociedade ocidental. Ele aponta que o fato mais antigo que envolve a padronagem em vestimentas aconteceu em Paris, no ano de 1254, quando religiosos recém chegados de Jerusalém entraram na cidade com vestes listradas de branco e marrom, em referência ao profeta Elias que representava para eles força e resistência. O padrão era usado por eles como um símbolo de proteção. Mas pelo fato de que ali as listras também estavam associadas aos países islâmicos na Europa, os religiosos foram considerados hereges. Há o registro de um clérigo condenado à morte em 1310 com vestes listradas.

Ao longo da história elas passaram a representar divisão, contraste, marginalidade. Ora, se o puro é representado pelo liso, reto e cores claras, faz algum sentido que elas simbolizem o oposto. Não à toa, na idade média, as leis suntuárias (leis do vestuário) proibiam o uso de vestes listradas. Naquele contexto, as listras só eram usadas por criminosos, devedores, prostitutas. Na literatura medieval o herói é sempre representado sobre um cavalo branco, e o traidor sempre em um cavalo malhado (manchado, listrado).

Com as mudanças do tempo, seus significados foram se transformando e por um momento até o sentido que a listra tinha na roupa era importante. As verticais passaram a ser usadas com exclusividade pela aristocracia e as horizontais pelos serviçais. Já na modernidade, as listras foram parar em roupas de banho, roupas de dormir e principalmente em roupas íntimas. Ponto em comum: todos os trajes associados à nudez ou ficava em contato com partes do corpo consideradas sujas e vergonhosas. Foi então que ela finalmente virou uniforme do proletariado, dos presidiários, judeus, malandros e marinheiros.

Foi quando apareceu Coco Chanel.

Os uniformes dos marinheiros da década de 1920 foram grande fonte de inspiração pela costureira. Na camisa que ficou conhecida como Breton, haviam medidas específicas e quantidade certa de listras que simboliza cada uma das vitórias de Napoleão sobre os britânicos, dizem. Chanel com sua coleção náutica ajudou a popularizar a peça. É atribuído à estilista o DNA revolucionário na história do vestuário feminino trazendo inovação e libertação.

A partir daí a camisa listrada foi incorporada na cultura pop por personalidades importantes para a sua formação como Pablo Picasso, Andy Warhol, Kurt Cobain, Marilyn Monroe. Todos fotografados vestindo a camisa Breton ou uma variação dela, como forma de incorporar para si toda a carga marginal e revolucionária que o listrado carrega de outrora.

Arrisco afirmar que atualmente não há uma temporada de moda em que o listrado não apareça em alguma coleção, ou uma estação que não esteja nas araras de todas as lojas.

A partir de agora, antes de escolher aquela peça listrada do seu guarda roupas, pense em quantos presidiários, judeus, religiosos, trabalhadores, animais, malandros e peças Chanel você vai carregar com você. risos.

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