Malcom & Marie: o confinamento das relações, do sucesso e do racismo
A direção de Sam Levinson e as atuações brilhantes de John David Washington e Zendaya nos tiram o fôlego, neste filme que já nasceu clássico.
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Antes de mais nada, uma obra prima fotográfica. Um bálsamo ao olhar de quem gosta de olhares apurados. Um soco no estômago da superficialidade. Um convite ao mergulho das camadas do texto falado e filmado. Cada cena daria uma excelente resenha semiótica.
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Da história, muitas coisas se misturando e distorcendo qualquer possibilidade de pensar em apenas um argumento como central — trata-se de uma narrativa multiversa. O que surpreende, visto que é o filme de um realizador branco com protagonistas negres. Aliás, que protagonistas.
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Eles seguram o filme com a elegância de uma lavadeira leva a bacia para o Rio na cabeça. E olhe que o filme pesa uma tonelada.
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O filme é uma metalinguagem de angústias profundas que atravessam corpos negros em espaços de visibilidade, como é o caso do cinema. Mas também é sobre a misoginia e o roubo intelectual de mulheres negras por parte de seus parceiros. Também é sobre a devastação que o racismo traz sobre estes corpos, deixando-os vulneráveis às armadilhas do sucesso ou das drogas.
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É sobre o confinamento de relações tóxicas, autocentradas, porém mergulhadas em subjetivas cumplicidades e criativas dependências psíquicas. É um filme sobre dororidade e mais uma vez surpreende a perspicácia do criador, visto seu lugar de fala.
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Recomendo fortemente a obra. Quero revê-la ainda muitas vezes, mas por hoje, já estou produtivamente angustiada.