Su Verri
Diário de Bordo de uma Mãe Autodirigida
8 min readMar 31, 2021

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Mais um capítulo: sobre partos, revisitas, ressignificações, movimentos, adolescentes

Mais um parto, mais um capítulo do meu Diário de Bordo

Hoje percebi que grande parte de escrever um diário é revisional. Depois de todos esses anos escrevendo e vivendo essas experiências tão peculiares e quase secretas porque foram compartilhadas com poucas pessoas, percebi que escrever um diário é acima de tudo olhar para trás, para o que já passou, revisitar os momentos e talvez até ressignificar e também fazer uma espécie de curadoria para definir o que dizer, como dizer, quando dizer.

Muitos momentos não foram registrados, outros foram registrados mas não foram elaborados, existe um grande acervo em nossa narrativa oral familiar que vai sendo compartilhado nos momentos descontraídos quando estamos à beira do rio ou tomando um longo café da tarde ao redor do fogão a lenha, quando recebemos amigos e familiares em nossa casa ou quando sou convidada para contar as minhas histórias nas comunidades de aprendizagem ou nas oficinas e encontros com as mães autodirigidas atualmente.

Eu sou aquele tipo de pessoa altamente comprometida, sou muito exigente comigo mesma, então para cada coisa que eu crio cair no mundo, existe um processo de gestação às vezes exageradamente longo e sofrido além do necessário. Venho trabalhando nestes tópicos e acredito que depois de tantos partos a gente vai aprendendo novos jeitos de fazer a coisa…

A questão é que agora o meu compromisso é compartilhar minhas vivências como mãe autodirigida, afinal de contas eu já tenho várias memórias escritas e fotos e, que ideia foi essa??

Apesar de ter refletido muito sobre isto antes de começar, escrever é sempre um processo de fecundação, fertilização, gestação e parto. Mas sim, a ideia continua sendo linda e estou me divertindo bastante com todos esses processos. Estou pronta para revisitar, ressignificar, fazer a curadoria, gestar e parir para vocês as nossas histórias, as nossas muitas aventuras, apenas espero que vocês tenham paciência para esperar todo o processo acontecer…

Quantos partos eu tenho feito nesses últimos anos!!! Ao mesmo tempo que é fabuloso, maravilhoso, são muitos filhos sendo colocados no mundo, também existe uma necessidade de acalmar as águas, sair dessa fase de parto e puerpério e ver as crias crescendo e tomando novos rumos.

Esses últimos seis anos da minha vida consistiram num processo de transformação pessoal bem profundo e junto com isso a gestação e o nascimento de novas perspectivas de trabalho, nova rede de amigos, nova equipe de trabalho, crescimento dos adolescentes, amadurecimento dos projetos, aprofundamento dos estudos.

Desabafo…

Para mim, mesmo no período em que eu trabalhava como professora escolar, registrar era um dos meus desafios, era algo que eu fazia com precisão, exigência e muito esforço. Quando fui diretora eu registrei todos os feitos da escola, montava portfólio anual, escrevia os projetos e registrava as ações com fotos e documentos para apresentar para as secretarias, além das atas e registros de matrícula dos alunos e todas essas coisas de registros escolares.

Quando eu saí da direção da escola uma boa parte da documentação história, dos portfólios com os projetos realizados e o patrimônio histórico cultural desta comunidade foi jogado no lixo como algo sem valor, como mais um bando de papel de escola. (Essa é uma história longa que ainda não estou totalmente pronta para contar).

Resgatando as memórias aqui hoje para escrever este texto me lembrei disto e acredito que esta dor tenha me deixado bem mais displicente em relação aos registros dos movimentos unschoolers por aqui.

De toda maneira o pouco que está registrado mais as nossa memórias e os meus diários têm conteúdo para muitos e muitos textos, só preciso encontrar a disciplina e a motivação necessárias para cumprir com este intento.

Ressignificação

O fato é que me propor a escrever um diário público é um desafio, mas que neste momento da minha vida se torna um desafio motivador. Esta é uma possibilidade de curar aquela dor de ter minhas obras jogadas no lixo, de ressignificar a minha trajetória, reviver, recontar e ter um espaço que é só meu, que é nosso, para quem se interessar em estar por aqui. E também contar as coisas inéditas porque na verdade eu ainda tenho muitas e muitas histórias para contar…

Revisitando os projetos com adolescentes

Primeiro encontro ALC Nature com Adolescentes (Muito amor por essas pessoas!!!!)

Durante o movimento de fecundação deste texto minha intenção era pensar um pouco sobre o meu trabalho com os adolescentes unschoolers que venho realizando desde 2018 e percebi o quanto realmente contei muito pouco sobre as nossas aventuras…

Revisita a textos antigos… (o começo do começo)

Fiquei muito feliz em voltar nos primeiros textos que eu escrevi aqui no Medium e encontrei este texto de Novembro de 2018 em que eu estava começando a proposta do grupo com adolescentes.

E depois de três meses este aqui que conta um pouco sobre os nossos feitos de janeiro de 2019.

E por último este aqui de quando eu conheci o ALC e estava bem no comecinho das ações e da minha relação com Aprendizagem Ágil.

Tentando escrever um pouco sobre adolescentes…

Então realmente há muito que se falar, mas falar sobre adolescentes e a minha relação com eles é daqueles temas super desafiadores tipo falar sobre Unschooling, é abstrato, profundo, complexo e está sempre em transformação. É mais fácil falar sobre o que eu já vivi do que sobre o que ainda estou vivendo.

No final eu acho que este pensar da nossa relação com as crianças e com os jovens está relacionado com repensar o nosso próprio entendimento sobre o que é Humano.

Depois que eu deixei as escolas como professora, fiquei bem receosa de pintar uma imagem linda, mas irreal sobre Unschooling, não queria reproduzir a tal velha e conhecida hipocrisia do “finge que eu ensino e você finge que aprende” ou de fotos de perfil maravilhosas tipo família Doriana.

Eu precisava deste tempo de maturação, de deixar meus meninos aprenderem e se desenvolverem sem a pressão externa, social, fiscalizadora, checando para ver se eu estava ou não cumprindo parâmetros e currículos. Para agora sim após seis anos de trajetória começar a compartilhar tudo isso.

Quando eu penso se fiz um bom trabalho agora que o Rafael está beirando os 18 anos eu concluo que priorizamos e escolhemos o melhor para o momento. Meu foco na jornada de aprendizagem dos meus filhos não foi curricular, portanto neste sentido eu passei por diferentes momentos de auto reflexão sobre ter realmente feito um bom trabalho.

Hoje eu vejo o que poderia ter feito melhor, pois conheci ferramentas novas, construí uma nova rede de pessoas, estudei, pesquisei e pratiquei bastante. E eu digo, sim eu poderia ter feito um trabalho melhor, mas eu fiz o melhor que eu pude com o que eu tinha naquele momento e no final das contas é disso que se trata a aprendizagem, darmos o nosso melhor sempre.

Por outro lado me sinto bem mais segura para vir aqui e escrever todas essas coisas e compartilhar das experiências e apoiar as famílias que estão nessa transição, porque eu já vivi muita coisa…

Aprender é viver, ou viver é aprender?

O tempo da minha vida que passei conversando, explorando a natureza, refletindo sobre a vida, cozinhando, limpando a casa e me conectando com meus filhos através destes momentos simples do dia a dia, tão subvalorizados pela sociedade do capital são os mais valiosos de nossas vidas.

Esses momentos são a verdadeira base de conhecimentos que meus filhos vão levar para onde quer que eles queiram ir. Se houve uma certa defasagem curricular, foi porque realmente este currículo não muda em nada a nossa vida, foi porque o nosso currículo autodirigido tem como principais disciplinas o conhecimento de si mesmo, o desenvolvimento da comunicação e da expressão autêntica, o romper das hierarquias e o estudo de uma espiritualidade profunda e não religiosa.

Nós ultrapassamos barreiras muito grandes, passamos por desafios que achamos que não iríamos superar, desde questões financeiras até o rompimento com pessoas da família e amigos que jamais poderíamos pensar que iriam acontecer. Mas assim é…

O caminho da autodireção também é um caminho pela transparência, pela nitidez, também consiste em olharmos para a nossa vida e auto gerenciarmos ela para que possamos ter paz e sermos felizes sendo autênticos e há que se fazer travessias…

No final eu queria falar sobre a adolescência e os adolescentes e acabei falando muito sobre mim, sobre a minha trajetória.

Um diário não era para demorar dois meses para ser atualizado para seus leitores, mas eu com essa minha mania de gestação, auto cobrança e perfeccionismo também não quero só postar mais um texto. Há que ter consistência, há que ter conteúdo, memórias, há que valer a pena para quem gentilmente vier aqui e estiver numa busca verdadeiramente aprofundada sobre novos caminhos e tals.

Filho novo!!

Aproveitando para trazer aqui meu mais novo filho. O livro Se Joga que Aqui tem Rede: um desmanual para comunidades de aprendizagem. O livro tem distribuição gratuita e dialoga com todos os temas que eu trabalho e vivencio, espero que aproveitem!!

Este parto foi coletivo, foi em conjunto, foi intenso, profundo e a sensação de ter parido com essas pessoas é muito boa!!! A sensação de estar em rede, fazendo rede já com um novo paradigma existencial é o resultado de muito trabalho e de uma busca árdua até chegar aqui.

Achei bacana trazê-lo neste contexto porque justamente um dos textos meus que está neste livro é a Minha trajetória autodirigida, ou seja, a continuação dos dois textos que eu compartilhei acima aqui no texto, está no livro.

Momento atual

Dei toda essa volta porque é muito mais fácil falar do que já passou do que falar do que ainda está em processo de gestação. A situação atual do grupo de adolescentes é que estamos vivendo uma pausa criativa.

Nossos laços de amizade, de companheirismo e parceria vão além dos projetos, aos poucos vamos percebendo quem faz parte da nossa turma, da nossa comunidade e isso se modifica a cada ano, pessoas novas chegam, alguns se desconectam e isso vai acontecer e continuar acontecendo independentemente da Pandemia pois não importam os meios, se vai ser virtual, se vai ser presencial, se vai ser telepático um dia, o que acontece é que a vida não para nunca e as nossas crianças e jovens estão em pleno processo de desenvolvimento e aprendizagem.

Aprendizagem é bem diferente do que as escolas estão impondo. Hoje que eu trabalho exclusivamente com aprendizagem e me libertei dos moldes da educação, da “ensinagem” e da escolarização. Atualmente eu consigo perceber com bastante nitidez este paradigma, porém foi uma longa travessia, um longo processo de ressignificação que continua acontecendo em níveis cada vez mais profundos.

Aprendizagem é processo, é construção a longo prazo.

Por hoje é só minha gente, continuarei resgatando e contando as histórias do passado, do presente e as ressignificadas.

Em breve vocês terão boas novidades sobre os nossos movimentos.

Para mim é um grande prazer ter você aqui!! Lembre de deixar seus claps e compartilhar com os amigues para a nossa rede expandir cada vez mais.

Gratidão!!

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Su Verri
Diário de Bordo de uma Mãe Autodirigida

Mentoria em Educação Autodirigida; Facilitadora Ágil (ALF); Comunidade de Aprendizagem Autodirigida; Desescolarização/Unschooling;Fundadora do ALC Nature