Octávio Lemos
Dia Branco
Published in
3 min readApr 5, 2016

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O que existia era o grupo, não haviam distinções, seus elementos não se conheciam, eram indiferentes, pois tudo o que existia era o grupo. Como era curioso o modo como aquelas pessoas interagiam, era como se todos fossem espelhos e nada além do próprio ego fosse refletido. Havia fala, não diálogo, havia diversão e nenhuma felicidade, havia: O Grupo, mais nada.

“O uso deste produto leva à morte por cancêr de pulmão e efisema”

O tom de voz era alto, para que as almas distantes pudessem se ouvir, ouviam, mas não escutavam. A mente em sua pior configuração, modo supérfluo-permanente. Algo naquele olhar me fazia manter a esperança, ela não podia ser só isso. O corpo, apesar do desprezo, era o mais cobiçado, afinal, era a única coisa que dava pra ver com os olhos, ver não é enxergar. Mal sabia que todo aquele interesse era apenas pra satisfazer seu ego, eles não gostavam dela, era tão óbvio quanto o aviso na carteira de Marlboro vermelho que estava em cima da mesa: “O uso deste produto leva à morte por cancêr de pulmão e efisema”.

Entre uma vantagem contada e outra, lá está ele, mergulhado, tentando se sobressair no meio daquilo tudo, sua natureza deselegante e sua falta de auto-estima, numa tentativa desesperada de existir, gritavam para quem quisesse ouvir: PRECISO SER ACEITO! Ninguém queria. Era insistente pelo menos, não para assuntos relevantes, claro, seria muito desperdício, era insistente em existir, existir para o grupo e quem sabe assim, acabaria todo aquele profundo abismo em seu peito. Para tanto, repetia, como todos, um comportamento em comum, respostas prontas, opiniões vagas e nenhum objetivo na vida eram seu trunfo, além de, por ter bom coração, ser bastante prestativo, com quem importava, claro. Era admirável ser isso, vestir essa camisa, abraçar esse esteriótipo, afinal:

“Quem foi que disse que eu não tenho valor?”

Eu disse.

Dentre várias armaduras que carregava, talvez a mais medíocre e nefasta, era a ironia, devastando com veemência qualquer centelha de consciência que pudesse brotar, pois isso significaria emergir, respirar e estar submerso era muito confortável. Quando estava lá, nenhum de seus demônios o atormentava, pois estava muito bêbado e chapado, gastando o dinheiro que seu pai mais cedo tivera dado, numa tentativa de compensar sua constante ausência. Ele havia idealizado todo aquele espetáculo, que orgulho, criou seu próprio fracasso e nele se auto-declarou o rei e sentado em seu trono vomitava do alto suas ironias. Muita fala, pouca ação, talvez não pare nunca, depois de tanto tempo, você acaba ficando bom nisso, o segredo do sucesso é o tempo que você gasta naquilo, ou seja, aquele era sim, seu grande sucesso. Fim de noite.

16 horas, acorda, menino!

Dor de cabeça, náusea e uma tatuagem que falava algo sobre manter o foco e seguir rumo à vitória. Que ironia, só mostrava o quanto ele estava perdido.

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Fotos de ontem, várias curtidas, o ego se inflama, comenta, curte:

- Oi viado!
- Bora nessa? Tem que comprar cerveja
- Tô indo aí.

VAGA DE DEFICIENTE

“Não acredito que você vai parar aí”, “Você é um doente” bradou o rapaz que dirigia bêbado, drogado e como se não bastasse, sem habilitação. Coerência? Tudo bem. Dava pra entender. O desprezo de si mesmo é um dos maiores pesos que se pode carregar e talvez isso justificasse tudo. Guerra interna constante, quem vai ganhar? Não está ao meu alcance. Até ali, tinha feito o que podia, agora era com ele. Já dizia o poeta Raimundo, ignorado por todos em sua ilha no meio da avenida:

“Desgraçado do Homem que se abandona.”

Estas seis palavras acima, mostram que por pior que seja a situação, nunca o Homem deve considerá-la perdida.”

Assina: O Condicionado.

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