(Notas nº10) A Filosofia não responde, pergunta

André Silva
#Diários de bordo
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3 min readMay 7, 2020

Por que ter uma filosofia não materialista?

Pelo “sentido”. Pelo próprio sentido de se ter uma filosofia, o que do contrário a filosofia correria o risco de ser vã e de não fazer sentido. Porque nenhum sentido é desprovido de relação, mas todo sentido se dá nas ou entre as relações, em relação a alguma coisa. Um domínio daquilo que se faz, daquilo que transita, daquilo que transcende, movimenta, muda ou muta.

Na prática, uma filosofia que se estabelecesse ou se findasse na materialidade não seria mais do que procedimento formal de rotina. E a ciência não excederia o interesse comercial, submetendo a ética e interesse humanos às políticas e interesses das companhias e instituições (e qualquer semelhança à ciência atual não é mera coincidência).

A filosofia está ligada, inclusive por definição, à sabedoria, à vida que compense ser vivida por e para todos, ao modo do bom viver, ao modo de pensar pela boa vontade e experiência de bem viver bem convivendo. Como amor à sabedoria está ligado à própria espécie homo “sapiens”. Homem que é sábio. Que questiona e, assim, busca “sentido” para as coisas que se dão.

Não por acaso, o comércio ou negócio ainda definem, delimitam ou ditam os limites da ciência, cujos pesquisadores e instituições entendem imprescindível o concurso financeiro para a viabilidade de certas pesquisas, ignorando que a dimensão da pesquisa abrange mais do que apenas as exigências financeiras, não as negando, mas dizendo que uma e outra coisa são realidade. As preocupações financeiras mas também outras preocupações humanas relativas a ética, às relações sociais, ao lugar do homem no mundo, ao seu papel e seus potenciais, etc.

Mas a filosofia materialista pode estar ligada ao “sentido” e ao modo de bem viver bem convivendo sem falar de imaterialidade? Poderia se dizer que alguns filósofos modernos têm tratado sobretudo de ética e pensado o ser humano sem se voltar a um âmbito imaterial.

Seria, então, uma tal isenção possível? Seria suficiente?

Qualquer domínio que busque refletir a vida ou a ética pode se eximir de tratar do que é fenomênico? Aquele que pense a conduta e a convivência, o faz desconsiderando o contexto humano em que se encontra? E seria isto possível? Uma filosofia que defendesse uma raça pura em detrimento de outras é filosofia? A filosofia não deve por definição se portar à natureza? Poderia ela ser seletiva ou etnocêntrica? Não estaria ela traindo sua própria definição? Ademais, sua dinâmica envolve, antes, a reflexão. Não é definição ativa ao qual algo se estabelece e encerra. O exercício do pensar é um eterno infindado movimento do qual daí emergem produtos. Mas é antes de produto, produção. Uma filosofia que selecionasse nações a se exterminar e outros a se preservar mataria a si mesma, posto que a natureza não se prende a ordens artificiais, ela as permite mas a tais artificialismos não se limita, assim se identificaria uma falsa filosofia. A filosofia nem mesmo deseja perguntas, porque ela sempre pergunta, então as realiza. E filosofia é o próprio perguntar. E sua realização se dá a partir do próprio desconhecido, muito superior ao que se conhece. É, portanto, um trafegar pelas incertezas.

Uma filosofia que pretendesse encerrar as perguntas no domínio de si mesmo não possuindo as capacidades para sondar outros limites, não passaria de um esforço infantil de tentar entender os fenômenos adultos sem maturidade adequada. Essas capacidades são provenientes do reconhecimento do próprio desconhecimento e do desconhecido, pelo que e pelo qual empreende-se a busca.

Ora, uma filosofia que falasse de materialidade sem permitir o mistério da realidade imaterial que se cogita, é uma filosofia particular ou uma filosofia pobre em sua compreensão e nos termos em que se apoia para se representar informacionalmente.

Como a filosofia não pode definir e encerrar respostas sendo um esforço de transição, pode e devem haver sim ciência que utilizando da filosofia sonde o imaterial, tanto quanto essa validade existe para uma que sonde o material. E ambas devem ser vistas como correntes de uma mesma ciência.

Nota 10: 25/11/2019 — Reflexões sobre Filosofia não-materialista

Notas e Rascunhos de reflexões e meditações pessoais para produção dos meus textos finais. Essas notas são o registro da “caminhada”. Esteja claro que há, portanto, mudanças e movimentos de pensamentos no processo, para forjar o pensamento final. Publico como modo de guardar o exercício que fiz para amadurecer algum ponto de vista. Essas notas geraram (ou irão gerar) textos oficiais e definitivos que irei posteriormente referenciar aqui.

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André Silva
#Diários de bordo

Pensador, investigador e “filosofista”. Pesquisa a ciência, a consciência, o espírito, linguagem, cultura, redes, etc. Mestre em C.I. Instagram: @andrefonsis