Batman Begins : Um discurso poderoso, mas incoerente.

Leonardo Miranda
Didaticamente
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4 min readOct 11, 2020

Batman Begins (2005) foi dirigido por Christopher Nolan, escrito em colaboração com David S. Goyer e estrelado por Christian Bale, Kate Holmes, Liam Neeson e um baita de um elenco, como diria craque Neto. É o primeiro filme da aclamada trilogia dirigida e escrita por Nolan e teve a missão de reintroduzir o personagem ao mundo cinematográfico, após 16 anos do filme de Tim Burton.

E como um filme de origem, ele cumpriu de maneira extraordinária o seu papel, apresentando o personagem para uma nova geração, criando uma “nova” atmosfera para filmes de heróis (filmes mais “dark” como ficaram conhecidos popularmente). Isso tudo com um personagens cativantes, frases de efeitos que circulam a internet até hoje e um roteiro bem amarrado, com uma profundidade e um discurso muito interessante de ser analisado.

No primeiro encontro do Bruce com o Ducard (que se revela o verdadeiro Ra’s al Ghu posteriormente), Bruce caçoa da liga das sombras e recebe como resposta:

“Um vigilante é apenas um homem perdido na busca pela sua própria gratificação”

E é engraçado porque essa é uma ótima definição para o Batman.

Antes de reassistir, não lembrava como esse filme tem um debate muito carregado sobre justiça, vingança, criminalidade e políticas sociais. O filme bate muito na tecla de como o sistema que vivemos se retroalimenta e de como a pobreza é um plano político de uma faixa do estado social. Esse discurso é evidenciado nas falas da Rachel, amiga de infância de Bruce e co-protagonista.

Como por exemplo:

“Justiça é harmonia. A vingança é sobre você se sentir melhor. É por isso que temos um sistema imparcial.”

ou

“Você se preocupa com a justiça? Olhe além de sua própria dor, Bruce. Esta cidade está apodrecendo. As pessoas falam sobre a depressão como se fosse uma história, e não é. As coisas estão piores do que nunca aqui. Falcone inunda nossas ruas com crime e drogas, atacando os desesperados, criando novos Joe Chills todos os dias. Falcone não matou seus pais, Bruce, mas está destruindo tudo que eles representavam.”

O filme nos mostra que a desigualdade não é aleatória. Ela é premeditada em muitas situações em uma aliança entre o poder político e econômico( economia que ser gerada de maneira legal ou ilegal). Um financia o outro em Gotham e no Brasil por exemplo, em um ciclo que se retroalimenta e mantém as coisas da mesma maneira sempre.

Gotham nos mostra que tanto os que controlam o poder político, quanto os que estão dentro da esfera econômica, tem atitudes amorais. Eles não se importam com ideologia política, com valores, com ideias para seguir, o que importa é a manutenção e perpetuação do seu poder, cada um no seu setor. E para conseguir isso, ele joga no campo que for preciso. Se o pêndulo estiver na direção da democracia, eles serão democráticos. Se for autoritarismo, eles são autoritários. Se precisar se aliar a empresários, milícias, traficantes, agiotas, evangélicos, católicos, espíritas ou que for, se aliaram, sempre ao gosto do freguês.

E ao mesmo tempo fala sobre uma justiça não punitiva e vingativa e sobre uma mudança social que pare de fabricar novos Chill’s (assassinos do pais do Batman), o filme tem como figura central obviamente o Batman.

Um bilionário traumatizado e mascarado com métodos bem questionáveis de fazer justiça e que acredita ser um símbolo que deve guiar a sociedade. O que é de certa forma autoritário e incoerente com o discurso. O que não estraga, afinal ainda é um filme sobre um herói de quadrinhos, ainda é preciso uma suspensão de descrença e o Batman precisa se manter relevante para se ter sequências.

Mas o conflito argumentativo está posto e vale a pena se discutir essa filosofia e discurso politico que está no roteiro. Ainda mais de uma serie de filmes que se proposta ser algo mais crível, mais “real” e dentro de um universo possível.

E no fim do filme temos mais uma enfraquecida (bem suave) ao apagar um pouco o discurso proposto pela Rachel e em menor medida pelo Alfred, fazendo com que eles se tornem uma especie de “voz da consciência” do Bruce Wayne. Tudo isto para justificar e suavizar a presença do Batman como uma especie de “mal necessário” para Gotham e para sequencias.

Para encarar, entender e realmente ver que o Batman não é necessário (e em certa medida até atrapalha) para que as mudanças aconteçam e que as injustiças da cidade sejam combatidas, Bruce iria precisar de mais 2 filmes e muito mais frases de efeito. O que inclusive me faz olhar com outra perspectiva para o final e o roteiro do terceiro filme. Mas isso é assunto para outro dia.

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Leonardo Miranda
Didaticamente

Cursa Licenciatura em biologia na UFSCar - Campus Sorocaba. Professor de biologia, Filosofo de internet e Teólogo Amador.