Um mar de notícias sobre o mar de lama

Diego Bonetti
Diego Bonetti
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5 min readJun 1, 2018

Por Diego Bonetti

A percepção do brasileiro diante do amontoado de informações

O bombardeio de informações sobre a atual crise política no país não é novidade, e você deve ter acompanhado a verdadeira guerra virtual que se estabeleceu nos últimos tempos. Desde o início da Operação Lava Jato, que investiga um grande esquema de corrupção na Petrobras envolvendo diversos políticos e empreiteiras, uma onda de manifestações tomou conta das redes sociais.

Diante dos últimos acontecimentos relacionados à crise política no Brasil, foi possível perceber o poder de todas essas redes, que se mostraram como local de mobilizações, manifestações e reivindicações. Notícias sobre as decisões do poder público, abaixo assinados, e um festival interminável de memes sobre a situação do país viralizaram e ganharam força na mídia.

Não bastasse a interferência direta dos próprios indivíduos, um personagem novo — e perigoso — entrou na já tão famosa “guerra de narrativas”. Aliás, um não, vários: são os robôs.

O estudo Robôs, Redes Sociais e Política no Brasil, realizado pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV/DAPP), em agosto de 2017, mostra que “contas automatizadas permitem a massificação de postagens e se convertem em uma potencial ferramenta para a manipulação de debates nas redes sociais. Especialmente em momentos de relevância política. Na greve geral de abril de 2017, por exemplo, mais de 20% das interações ocorridas no Twitter entre os usuários a favor da greve foram provocadas por esse tipo de conta. Durante as eleições presidenciais de 2014, os robôs também chegaram a gerar mais de 10% do debate”.

Com isso, diz o estudo, “o mundo virtual tem permitido a adaptação de velhas estratégias políticas de difamação e manipulação de debates públicos, agora em maior escala”:

“Importante meio de comunicação, informação e construção de conexões, as redes sociais são parte cada vez mais significativa do dia a dia das pessoas. Estudos realizados pelo Pew Research Center mostram, por exemplo, que
a maioria dos adultos nos Estados Unidos (62%) se informa por meio das redes sociais. No entanto, 64% afirmam que as notícias falsas que circulam nas redes causam “confusão” sobre fatos e acontecimentos diários. No Brasil, a Pesquisa Brasileira de Mídia 2016, realizada pela Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República, revela que 49% das pessoas já se informam pela internet, uma fatia em rápido crescimento. É nesse ambiente de “confiança”, mas de alta circulação de informações duvidosas que os robôs se proliferam”.

As mídias sociais estão repletas de revoltas contra os políticos em geral e afirmações extremas sobre os mesmos. O ódio contra a corrupção que afeta a população é mais do que aceitável, é necessário. As páginas no facebook pedindo impeachment da presidente e esbravejando contra a corrupção dos poderosos ganham milhares de seguidores todos os dias e defensores mais que calorosos. Pessoas que votaram em um candidato se sentem superiores e adoram gritar aos quatro ventos que não colaboraram com o caos regrado à corrupção que temos vivido atualmente.

Mas será que entendemos, de fato, o que está acontecendo? A cobertura sobre corrupção ganhou espaço nos veículos de comunicação como nunca antes havíamos visto. Com tantas informações sobre operações, inquéritos policiais e delações premiadas, conseguimos processar e assimilar tudo isso?

A reportagem do LabJor FAAP foi às ruas para entender como as pessoas têm recebido essa enxurrada de informações. Ao serem questionados sobre a Operação Lava Jato, obtivemos as mais variadas respostas.

Juliana, doméstica, 32 anos, entende que a Operação Lava Jato “primeiramente é uma grande roubalheira”. Indagada se era a favor da operação, a resposta foi no mínimo curiosa:

“Não. Não sou a favor. Acho que os políticos só estão preocupados com o bolso deles, isso faz com que o país esteja na crise que está”.

Gladis, professora aposentada, 64 anos, afirmou “que a Operação Lava Jato é mais uma maneira de tirar o dinheiro do povo”. E vai além, “Sou totalmente contra a Lava Jato”.

Essas afirmações deixam expostas a confusão entre o esquema criado pelos políticos em benefício próprio e a investigação realizada pela Polícia Federal.

“O problema é que os policiais passam um tempão investigando, mas é como enxugar gelo. Os políticos têm foro privilegiado, fazem o que querem e vão cumprir pena domiciliar, enquanto o país fica sem hospitais, sem escolas”, afirmou Juliana, estudante de educação física, 23 anos. “Nossa única esperança é o Moro”, completou.

De acordo com o historiador, Martin Cézar Feijó, “não podemos confiar nas pessoas que assumem cargos de domínio nas instituições, seja juiz, político, governador ou presidente. É preciso ter sempre um pé atrás, um cuidado, tanto na glorificação, na heroicização, na mitificação, como também em execrar”.

O norueguês Stian, produtor musical, 39 anos, foi enfático: “Minha opinião é que o Sergio Moro foi comprado e colocado para tirar o PT. Eu não sou petista, nada disso, eu sou a favor de uma democracia”.

Apesar das respostas contraditórias, todos os entrevistados foram unânimes ao diagnosticar o resultado final da Operação Lava Jato, “tudo vai dar em pizza. De muçarela”.

Diante da enormidade de notícias sobre corrupção, o papel do jornalista é posto em cheque. Em uma sociedade com pouco conhecimento jurídico e sedenta por resoluções imediatas, a produção da notícia deveria ser o mais didática possível.

No entanto, é um trabalho extremamente complicado, conforme relata Alberto Bombig, Diretor Executivo do Jornal O Estado de S.Paulo, em entrevista exclusiva ao LabJor FAAP: “Essa sede por Justiça é complicada e esse didatismo é difícil. Até porque hoje o jornalista não sabe muito bem o que está fazendo. Como você vai explicar para um cara que rebocou parede o dia inteiro e assiste o Jornal Nacional?”

Bombig continua:

“O jornalista quando entra numa cobertura, ele tende a achar que é uma novela, que ele está seguindo uma novela. Um exemplo: Prenderam o Cunha hoje. No primeiro dia o jornalista consegue fazer um texto legível: Eduardo Cunha, foi preso hoje e a acusação é essa. No segundo dia já vem: A defesa entrou com Habeas Corpus. Neste momento, o leitor se pergunta: Habeas Corpus para que? Quem pediu? Quem que decide? Isso aí que você colocou é um grande desafio do jornalismo. É difícil para caramba a gente fazer.”

O jornalista nos conta que estabeleceu um exercício que faz diariamente ao acordar: “Vou tentar ler (as notícias) como a dona de casa, como o padeiro. E às vezes eu leio e falo: ‘ninguém vai entender isso aqui’. Mas acho que, nesse ponto, o jornalismo prestaria um grande serviço à sociedade se ele conseguisse ser mais didático e mais analítico. Não opinativo”.

João Gabriel de Lima, diretor de redação da revista Época até setembro de 2017, e atualmente dedicado à conclusão do seu mestrado sobre a construção das narrativas políticas de direita e esquerda, concorda com Bombig e vai além: para ele, quem conseguir entregar um produto mais didático terá um grande mercado a explorar:

“Esse é o grande desafio e a grande dificuldade do jornalismo brasileiro, mas tem de fazer cada vez mais. Existe uma proliferação no Brasil e nos EUA, do chamado jornalismo de contexto. Aquele jornalismo que está ali justamente para fazer você entender o incompreensível. Isso é uma grande oportunidade no mundo atual para o jornalismo. Quem fizer isso bem vai ganhar muito dinheiro. Pois isso é uma grande demanda. No Brasil é uma demanda dobrada porque a população é menos educada e o Brasil é mais complicado”.

Diego Bonetti é publicitário, estudante do curso de jornalismo na FAAP e editor da primeira edição do LabJor FAAP.

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