A política internacional é a vida de Rodrigo Lopes

Paulo Nunes
Dinheiro e Poder
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11 min readOct 7, 2019
Rodrigo Lopes na redação integrada do Grupo RBS. Foto: Paulo Nunes

Por Paulo Nunes

Grandes coberturas no exterior fazem parte dos sonhos de todo jornalista que cobre assuntos Internacionais, tais como a política internacional. Para Rodrigo Lopes, Jornalista, formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, (UFRGS), em 2001, e atual colunista de assuntos internacionais e Repórter Especial do jornal Zero Hora, vive desde 2003 essa experiência com viagens e grandes coberturas.

Aos 41 anos, Rodrigo Lopes define que tudo que envolve uma grande cobertura no exterior é a realização de um sonho. Desejo que foi cultivado desde a infância, quando começou a cultivar o sonho de estudar e trabalhar com o Jornalismo, principalmente com assuntos relacionados ao redor do mundo. Ele, nos recebeu na redação integrada do Grupo RBS, em Porto Alegre, e contou como iniciou a sua carreira, rotina de trabalho e bastidores de algumas das suas grandes reportagens.

Como nasceu o sonho de ser jornalista ?

Eu tinha 12 anos, minha prima, Simone Lopes, era jornalista, foi uma das primeiras mulheres a trabalhar com esporte no Rio Grande do Sul. Ela voltava dos eventos com camisetas da imprensa, eu gostava daquilo, e queria usar aquelas roupas. Comecei a gostar de Português, História e Geografia. Gostava também de desenhar mapas, bandeiras e de decorar as capitais dos países. No fim do ensino médio fiz um teste vocacional e o resultado foi comunicação.

Como foi o seu início de carreira?

Entrei na UFRGS em 1996, me formei em 2001. No primeiro semestre da faculdade fui na redação da Zero Hora para fazer um trabalho. Na oportunidade entrevistei três jornalistas, Diogo Olivier, Cyro Martins e o João Borges. O João Borges disse que era só preencher uma ficha que tinha vaga de estágio na ZH. Me inscrevi, fiz o teste, e passei. Então, em 1996 entrei para ser um auxiliar de redação, algo que me orgulha, porque aprendi muito. Sempre acho importante começar de baixo e valorizar os passos que damos ao longo da vida.

E os primeiro dias de trabalho?

Quando cheguei para o meu primeiro dia de trabalho na redação da Zero Hora, me disseram que aqui seria o mundo, eu não entendi, mas depois percebi que era a editoria de mundo.Mais adiante comecei a trabalhar na editoria de mundo como tradutor. Ali é a minha paixão. Gosto do produzir jornalismo internacional. Depois fui buscando o meu espeço, e sendo enviado especial para as coberturas dos grandes acontecimento ao redor do mundo.

Como é o seu na redação?

Estou sempre preparando uma matéria grande, algo especial, em média a cada 15 dias, mas sem um prazo exato. Faço a coluna no jornal nos finais de semana, terças e quintas-feiras. No digital é tudo instantâneo, faço sempre algo relacionado ao mundo. Eu ainda sou editor no papel, responsável pela gestão da agencia RBS. E por fim, às vezes penso em Podcasts. Aqui na ZH, sou cobrado também para aplicar o meu conhecimento do jornalismo internacional, no local, pautas de Porto Alegre relacionadas a cidade.

Como você convive com essa rotina?

Eu trabalho muito, estou tentando diminuir um pouco o ritmo. São oito horas diárias na RBS, dou aula de Jornalismo duas vezes por semana na Fadergs e ainda faço especialização em Relações Internacionais. Os meus dias livres são, quartas e quintas-feiras à noite, e dois domingos por mês. Nas horas vagas gosto de andar de bicicleta, voltei a jogar tênis, tenho buscado ler mais, e gosto de olhar muitas séries. Sou um cara muito família, não sei cozinhar, mas faço um “churrasquinho” de vez em quando. Embora faço muitas viagens, eu gosto sempre de voltar para Porto Alegre, gosto da cidade.

Rodrigo Lopes em Ramadi, Iraque, cidade ao oeste de Bagdá capital do país, em 2016. Foto: Arquivo pessoal.

Coberturas

Rodrigo Lopes já realizou dezenas de coberturas relacionadas à política internacional. Algumas foram marcantes na sua carreira, onde lhe renderam indicações e prêmios de Jornalismo. Lopes, nos contou como foram essas coberturas.

A notícia foi — Jornalista da Zero Hora é detido por forças de segurança de Maduro em Caracas. Como isso aconteceu?

Isso ocorreu em janeiro de 2019. Cheguei às 5h da manhã de sexta-feira, em Caracas, fui para o hotel e fiz os primeiros contatos. Depois fiquei na fila 4h para conseguir um chip de celular, conversei com algumas pessoas e consegui um carro para me deslocar pela cidade. Ao meio dia, o Juan Guaidó, Deputado Nacional, e atual presidente da Assembleia Nacional da Venezuela iria aparecer em público pela primeira vez após se auto proclamar presidente. Fui para a praça e acompanhei o comício dele. Então, às 17h, fui até a sede do governo Nicolás Maduro, queria caminhar como um cidadão comum. Mas vi que tinha uma manifestação dos apoiadores do Maduro. O motorista me disse que daria para fazer uma foto, eu fiz três, e quando baixei o celular, chegou a milícia do Maduro, vestidos de Vermelho. Eles perguntaram quem eu era, e disse que era turista. Pediram para apagar as fotos. Comecei a deletar,mas com o meu celular nas mãos deles. Quando apaguei aquelas três fotos vieram as outras imagens do comício do Guaidó. Então eles me prenderam, me acusando de apoiador do Guaidó. Tive que me identificar como jornalista, me prenderam, me ameaçaram, disseram que iriam me colocar em cárcere. Fiquei duas horas sem celular e passaporte retido.

Como foram esses momentos?

Naquele momento não sabia o que aconteceria comigo. Não tinha como me comunicar com a embaixada brasileira, até porque o Brasil não reconhece o governo do Maduro. Ninguém sabia que eu estava lá, nem o jornal, estava sem contato com ninguém. Após duas horas fizeram fotos, me ficharam, e acabaram me liberando. Disseram que se eu fosse pego de novo seria preso.

E para sair de lá?

Voltei ao hotel e comuniquei o jornal, em uma decisão de comum acordo retornei para o Brasil. Foi uma tristeza ver a liberdade de imprensa cerceada, mas a repercussão serviu de contribuição para mostrar a realidade atual do país. E de certa forma tudo foi importante para mostrar como o país está vivendo uma ditadura.

Crise na embaixada brasileira em Honduras, 2009 — foste o primeiro jornalista de rádio e TV brasileira a ingressar no prédio brasileiro onde Manuel Zelaya estava hospedado, sob cerco das tropas. Como foi esse momento?

Essa cobertura é o maior furo jornalístico da minha vida, porque eu consegui chegar lá dentro, onde todos queriam estar. O Manuel Zelaya foi deposto pelo governo de Roberto Micheletti, e se refugiou dentro da embaixada brasileira. Toda a imprensa na porta, e o pessoal do golpe não deixava ninguém entrar, eles cercaram a casa onde estava o Zelaya. Pela primeira vez ser um brasileiro era um problema. Arranquei a bandeira brasileira do meu colete, porque o fato do Brasil ter dado guarida ao Zelaya era um problema para você circular nas ruas. Os apoiadores do Micheletti não gostavam disso. Depois de uma semana consegui com uma fonte ligada ao golpe que deixasse eu furar o bloqueio militar. Outra fonte, ligada ao governo brasileiro a entrar na embaixada. Durante cinco dias dormi na cozinha, a comida era revistada pelos cachorros. Dormindo na cozinha eu conseguia sinal no telefone facilitando para entrar no ar, e conseguia mandar imagens para o jornal. Tudo isso foi impressionante, e conseguir entrar ali foi o maior furo jornalístico da minha carreira.

E para sair, como foi?

Depois de cinco dias, eu decidi que já estava tempo o suficiente ali dentro. A comida era enviada pela ONU, e passava por revista. Falei com um representante da ONU, ele me passou algumas orientações, e logo depois um promotor entrou em contato comigo. Recebi todas as orientações, me aprontei, com tudo marcado e no dia combinado, eu sai com o promotor, no carro dele, direto para o Hotel. Se não saísse com ele, eu corria risco de ser preso.

Você disse que ser brasileiro às vezes é um problema, e ser Jornalista pode ser problema em alguns casos?

Hoje em dia, Jornalista virou alvo de grupos terroristas, principalmente de guerrilhas. Em 2016 fui ao Iraque, e do outro lado do rio estava o Estado Islâmico, dava para ver a bandeira deles. A questão do jornalista em países em guerra é um problema grande. A outra é países sob governos autoritários, em alguns momentos a maneira de entrar é como turista. Nesses dois casos, e principalmente no segundo caso citado, tu se identificando como Jornalista pode acabar sendo preso, ou até sofrer consequências mais graves, como tortura.

Eleição de Barack Obama em 2008. O que você pode relatar dessa cobertura?

A eleição do Obama encerrava os oito anos do governo Bush, onde os Estados Unidos entraram em duas guerras e sofreram os atentados de 11 de setembro. A popularidade do Bush era a menor da história do país. Obama era o candidato do mundo, campanha política feita em cima das redes sociais e com discursos fortes. Iniciei a cobertura na Flórida, um dos estados decisivos na eleição e terminei em Chicago, a cidade onde Obama se tornou político. No dia da vitória, Barack Obama, fez um discurso muito emocionante. Dentre todas as coberturas, a eleição do Obama foi uma das coberturas mais felizes que já fiz. O jornalismo tem dessas coisas, ele nos faz transitar por inúmeras situações e sensações.

Como você planejou essa cobertura? É uma estratégia diferente das coberturas de Guerra ?

Eu saí de Porto Alegre com a estratégia montada para essa cobertura cobertura. Em média, um mês antes fico sabendo que vou cobrir uma eleição. Mas quando fiz a cobertura do acidente da Chapecoense e do Furacão Katrina, você planeja na hora, porque tudo vai acontecendo muito rápido. Agora, eleição é diferente, eu fico sabendo antes, e penso tudo. Eu tenho como premissa acompanhar os dois candidatos. Busco focar nos principais colégios eleitorais, principalmente aqueles que hora votam nos Republicanos, hora votam nos Democratas. Penso isso porque os candidatos dão um foco especial a estes estados como, Ohio, Flórida, Pensilvânia. Fiz isso em 2008 e também em 2012.

Eleição na Argentina, em 2003, cobertura pela qual ganhou o Prêmio Internacional de Jornalismo Rei da Espanha, na Categoria Ibero-americana. O que você lembra desta cobertura?

Eu era um guri, foi minha primeira cobertura Internacional. Eu tinha 24 anos, recém formado, e fui acompanhado de mais dois colegas, Rosane de Oliveira, Rádio Gaúcha e o Paulo Renato, da RBS TV. Fiquei na frente do presidente Carlos Menem, que anunciaria a derrota, então liguei para Porto Alegre, eles me colocaram no ar. Aquilo foi sensacional. Quando voltei, comecei a fazer um comentário diário na rádio Gaúcha sobre os assuntos internacionais. Ou seja, com 24 anos eu estava fazendo TV, rádio e Jornal. Mas aquela eleição na Argentina foi a primeira eleição após a crise dos anos 90. A cobertura me deu o maior prêmio da história, recebi junto aos Reis, em Madrid, o Prêmio Internacional de Jornalismo Rei da Espanha. Dias antes, quando fui informado sobre a premiação até achei que era mentira, achei que algo estava errado. Mas o prêmio está guardado em casa, em um lugar bem especial na minha estante.

Guerra entre Israel e Hezbollah, em 2006, único jornalista brasileiro a testemunhar a guerra pelos dois lados do front. Série de reportagens foi finalista do Prêmio Esso de Jornalismo do ano. Como foi essa cobertura para você?

Foi minha primeira experiência em cobertura de guerra, ou seja, o auge para um repórter internacional. Essa cobertura eu considero a melhor que fiz até hoje. Cobri os dois lados do conflito. Para fazer isso você precisa de tempo e obter a confiança da tua fonte. Você não pode errar, pois se a tua fonte te trair, você pode ser preso ou até morto.

Como você pensa a logística em uma cobertura de Guerra?

Foi difícil de fazer essa cobertura pela logística. passei por Israel, e para chegar no Líbano, precisei passar pela Jordânia, Síria e enfim chegar a Beirute. A todo o momento tinha bombardeio, eu estava com o Hezbollah (Grupo de rebeldes extremista, conhecido por sequestrar jornalista. Uma organização política com cadeiras no parlamento e grupo paramilitar fundamentalista islâmica xiita sediada no Líbano), e na guerra você está sempre no limite, entre ir e ficar. O medo te faz ficar e a adrenalina te faz ir, você precisa equilibrar isso para não entrar em uma fria. Foram 20 dias intensos de cobertura. Consegui relatar o que estava acontecendo no front e manter a minha segurança.

Cobertura que valeu indicação ao Prêmio Esso em 2006. Como foi esse momento para você?

Cobrir a Guerra entre Israel e o Hezbollah foi a cobertura mais complexa que já fiz. E naquele ano, essa cobertura foi finalista do Prêmio Esso de Jornalismo. Acabei não ganhando, mas me orgulho muito dessa cobertura.

Guerra na Líbia, 2011 — você foi o primeiro jornalista de uma rádio brasileira a transmitir ao vivo de dentro do Libia.

A cobertura da Líbia acontece em meio a Primavera Árabe. Entrei pela Tunísia fronteira com a Líbia, fiquei até sete horas contando como era a vida dos rebeldes. Eu entrei com eles na Líbia. Próximo do final do dia voltava por questão de segurança, e para enviar o material de um hotel, na Tunísia. Ali era o meu ponto de segurança. Foi uma cobertura rápida, difícil, e de tomadas de decisões rápidas. O repórter nestes casos precisa ter um senso, ir até o front e voltar no final do dia, tudo por segurança e para enviar o material, porque nada adianta você ficar 20 dias no front e não enviar nada diariamente. Em uma guerra, se não voltamos melhores jornalistas, voltamos melhores seres humanos.

Nesses casos, como você se alimenta e descansa ?

A cobertura de guerra exige muito do repórter, você emagrece rapidamente, fica tenso, muito tempo sem comer, dormir. Você consegue se alimentar a noite, no meu caso, quando retornava ao Hotel para enviar o material, já aproveitava e me alimentava e bebia bastante água. Depois buscava descansar um pouco. E no dia seguinte você faz tudo de novo.

Confiança na fonte, como acontece?

Você precisa confiar na sua fonte, seja ela quem for, e de preferência uma fonte boa. Sempre ter um pé atrás, mas você precisa estabelecer a relação de confiança. Em alguns momentos você tem uma visão parcial das coisas. Em 2011, na Guerra da Líbia, eu entrei com os rebeldes no sul do país. Eu estava contando como era a vida deles, mas logo depois retornei para a Tunísia, preservando pela minha segurança, e também porque não tinha confiança total nos rebeldes. Nesse episódio, o colega do Estadão, Andrei Netto, foi traído por uma fonte e acabou preso. Nessas coberturas você vive de tomadas de decisões instantâneas.

Como foi tomada a decisão de escrever um livro?

Penso que o livro é uma possibilidade de contar coisas que não aparecem no jornal. Tu bota mais a tua emoção, interpretação dos fatos e o bastidores. Você conta muito mais do que aparece no jornal, e vira um documento histórico. Assim tomei a decisão escrever o livro Guerras e Tormentas. Até 2012 foram 14 coberturas internacionais. mas de 2012 para cá fiz outras coberturas intensas. Sinto que está na na hora de escrever outro livro, falta tempo, mas tem histórias a serem contadas ainda.

O que é o jornalismo para você?

O jornalismo é a possibilidade de mudar o mundo, em função da sociedade e de fazer o bem para ala. Ser o guardião da sociedade e da democracia. O jornalista é o guardião contra aqueles que tentam roubá-la. O Jornalista tem de ser curioso e ser contador de história. Daqui alguns anos, quando forem buscar histórias sobre o mundo, certamente irão usar um jornalista como fonte principal para contar os fatos ocorridos no passado.

Bastidores da entrevista

Rodrigo Lopes foi meu professor de Jornalismo em 2014 na Uniritter. Quando recebi a pauta para entrevistar um jornalista especializado em política ou economia logo pensei nele. Agendei a entrevista para o dia 02 de setembro de 2019, na sede do Grupo RBS, localizada na avenida Ipiranga, com a avenida Érico Veríssimo, em Porto Alegre. Conversamos por cerca de uma hora. Lopes contou sobre o seu inicio de carreira, e sobre as suas grandes coberturas.

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