Arrozeiros gaúchos apresentam alternativas para a economia do setor

Thainah Mazin
Dinheiro e Poder
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7 min readSep 1, 2019

Adversidades climáticas e legislação têm sido barreiras para os agricultores na produção de arroz. Na busca por soluções que aumentem os lucros, o maior polo produtor do cereal se reúne no Dia do Arroz.

Cozinha da Oficina ministrada pela nutricionista do SENAR na Expointer. Créditos: Thainah Mazin

Por Thainah Mazin

A maior feira agropecuária da América Latina, a Expointer, que acontece há 49 anos no Parque de Exposições Assis Brasil, em Esteio (RS), dedicou um dia para celebrar a 30ª Abertura Oficial da Colheita do Arroz. Promovido pelo Instituto Rio Grandense de Arroz (Irga), no dia 26 de agosto, o Dia do Arroz, expôs as inovações e diferenciais do cultivo arrozeiro nas lavouras gaúchas.

No primeiro evento, ocorrido na manhã, o debate “Tecnologia Irga a Favor do Clima”, apontou que as lavouras gaúchas já diminuíram em até 48% a emissão de CO². Mara Grohs, pesquisadora do Irga, vê nos cuidados em todas as etapas do cultivo um diferencial da produção gaúcha. Para ela o agricultor “É um herói, por todas as dificuldades que enfrenta”, e deve usar o fato de poluir menos, como estratégia de venda.

Aspecto que também é valorizado por Guinter Frantz, presidente do Irga “Nosso arroz tem que ser conhecido pelo mundo, o consumidor deve saber o que de fato está consumindo”. Ou seja, instigar que os agricultores agreguem à venda do arroz, a questão de saúde e de tecnologia, para auxiliar na comercialização dos grãos produzidos em áreas gaúchas.

O Rio Grande do Sul, é responsável por 70% da safra nacional de arroz, como lembrou Eduardo Leite, o governador do estado, no caminho para a Expointer “Nós somos o maior polo produtor e beneficiador de arroz do Brasil, e estamos discutindo com o setor produtivo ações que possam ajudar a incrementar o consumo do arroz, e assim garantir os melhores benefícios econômicos ao estado”. De acordo com a pesquisa realizada pelo Euromonitor, encomendada pela Associação Brasileira de Arroz (Abiarroz), há atualmente uma redução no consumo do cereal no Brasil.

Plantio que gera a principal fonte de renda

“O setor orizícola é bastante importante, principalmente na zona sul, de onde eu venho”, contou Leite e seguiu afirmando que “A metade sul do estado, é conhecida pelo plantio e pelo beneficiamento do arroz, portanto, ele é um setor que gera bastante empregos”. Este setor faz girar 3% do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), no estado gaúcho, onde 26% dos municípios se ocupam com o setor arrozeiro como a principal fonte econômica.

Ainda que gere trabalhos, e ocupe os agricultores, a produção nacional de arroz teve redução de 13,6% na safra 2018/2019 em comparação com a anterior. Esta queda, ocorreu devido às adversidades climáticas nas regiões de maior produção do cereal. “Pegou num período crítico, que não tem mais o que fazer, não tem replantio, não tem alternativa”, afirma José Alberto Pacheco Ramos, produtor rural e presidente da Cooperativa Agroindustrial do Alegrete (CAAL). Ramos ainda reitera que tal situação causa prejuízo ao produtor “Hoje a orizicultura está doente”, demonstrando a preocupação do setor.

Para o presidente da CAAL, há uma necessidade de que se revise com urgência a orizicultura do estado gaúcho “É geral, é carga tributária, é logística”, e continua ao mencionar a taxa de contribuição para o desenvolvimento do setor “O CDO está em R$ 0,64 que a orizicultura paga para o governo, fora todos os encargos normais que são pagos para a agricultura”, mas o comentário é consciente de que é preciso melhor gestão de todos envolvidos.

Das reduções de CO² às aberturas para importação de agroquímicos

Um das soluções propostas é colher os benefícios de menores impactos de poluição ambiental que as safras gaúchas estão causando. No entanto, esta não é a única alternativa do ponto de vista de quem trabalha na produção de arroz. O barateio dos custos com produtos também influenciaria para mais ganhos dos agricultores.

Hoje o Brasil importa arroz do Paraguai para suprir as necessidades da população. Já que, comprar determinados produtos do país fronteiriço não está em cogitação, afinal, não são permitidos pela lei brasileira. “Que se possa comprar os produtos do Uruguai, Argentina e Paraguai e que não sejam taxados de contrabandistas”, reivindica o presidente da CAAL. Para ele há incoerência em o Brasil poder comprar o arroz, que leva em seu cultivo o produto, que o agricultor brasileiro não pode importar.

Se este agroquímico fosse importado reduziria os custos de produção, na perspectiva de Ramos “É preciso reclamar ao Mercosul, que foi criado há mais de 20 anos, com outra realidade ambiental, de consumo, e produtos”. Esclarece “Nós não queremos que o Uruguai, Paraguai ou Argentina não produzam, que eles produzam!”,mas que o Brasil tenha acesso a produzir com baixos custos também, para que em conjunto estes países alcancem outros mercados “Vamos aproveitar este potencial do Mercosul e vamos abastecer o mundo”, declara.

Condições portuárias e estruturais também entram na exposição de Ramos, que finaliza suas sugestões “Que tenhamos condições de exportação, pois o Brasil é autossuficiente”, se referindo às propícias condições do cultivo em solo brasileiro.

O nicho que coloca o RS em uma primeira posição

Na posição de maior produtor de arroz orgânico da América Latina, o Rio Grande do Sul, ainda tem nesse produto um mercado de nicho. Segundo Ivo Mello, produtor de arroz orgânico e conselheiro do IRGA, o primeiro arroz certificado orgânico foi produzido em Alegrete, há cerca de 25 anos “Nos instigaram a fazer uma produção de orgânico, não existia nem lei, nem regulamentação ainda, e a gente fez”.

A certificação neste período, ainda era feita pelo Instituto Agroecológico, conta “Um modelo que às vezes até gasta menos para produzir, menos insumo, e etc, mas ao mesmo tempo a logística dele acaba causando um custo adicional que inviabilizam alguns mercados”, destaca Mello.

Um dos principais compradores é o próprio governo, desde que a Lei nº 12.125 de Alimentação Escolar começou a vigorar. Ela determina que se dê preferência para aquisição de produtos orgânicos, quando produzidos pela agricultura familiar. “É muito importante este consumo ser priorizado nas escolas”, afirma Marjana Favin, nutricionista e instrutora do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR).

Há poucos instantes de começar a oficina sobre uso da farinha de arroz, que teve sua primeira edição no ano anterior, Favin enumera características do cereal “O arroz é rico em vitaminas do complexo B, tem ferro, ajuda muito na saúde, sendo orgânico é melhor ainda”, já que é mais saudável por manter todos os nutrientes e ter uma absorção superior.

O papel dos assentamentos do Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), nas áreas arrozeiras é ressaltado por Mello “Eles tem uma produção legal de arroz orgânico, e ele tem esse mercado, que é uma política bem interessante, que o mecanismo público oferece”. Sem exclusividade de venda, o arroz pode ser comercializado em outros mercados.

“Nós não podemos também depender somente do arroz orgânico, porque não temos como ter uma escala e porque é um mercado restrito”, pondera Alexandre Azevedo Velho, presidente da Federação das Associações dos Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Fedararroz).

A compra ainda tem um valor elevado quando comparado ao tradicional, e isto limita o consumo, juntamente com a pouca oferta de lugares para o consumidor final encontrar, segundo Favin. “O arroz orgânico é mais ativo, já que não tem nenhum outro produto para competir com seus nutrientes”, afirma a nutricionista.

Novos mercados, outros destinos

“Mas também tivemos várias dificuldades do pessoal entender a proposta, até o ponto de colocar um revendedor Paulista”, conta Mello ao relatar um episódio vivido por ele, quando chegou em um local de armazenamento do cereal orgânico que tinha sido preparado com pastilhas de agroquímico para esperar a safra. Lamentando a perda de todo aquele investimento na produção orgânica que se perdera por falta de informação. No entanto, afirma que faz parte do processo.

O relatório Euromonitor revelou que há mais desejo por produtos mais naturais, e que o setor dos “naturalmente saudáveis” movimentou US $ 249 bilhões globalmente em 2016, e que prevê um crescimento mais rápido ainda nos próximos 3 anos. Os ingredientes orgânicos adicionam valor na perspectiva de qualificação de produto saudável.

Quando questionado sobre novos mercados de exportação da produção gaúcha Mello defende “Olha eu vou te dizer assim, do jeito que a gente tem condições climáticas favoráveis para a produção de arroz com menos produtos e interferências antrópicas, quanto mais conseguirmos incrementar os mercados, melhor”.

Ainda com tom de esperança, Mello expressa “Tomara que isso aconteça (a exportação dos orgânicos), o que a gente tem observado é que não tem sido muito fácil, tem sido em uma velocidade ainda lenta, mas temos que continuar trabalhando”.

Retomada Econômica

Após o primeiro final de semana da 42ª Expointer Internacional, os números de visitantes e do movimento econômico da agricultura familiar já despertaram expectativas positivas para os negócios “E termos de volume de negócios, também excelentes expectativas, a agricultutra familiar já vendeu mais de 51% em relação ao primeiro final de semana do ano passado, então tem uma expectativa pela retomada da economia”, relatou Leite.

Esse sinal de esperança, recebe auxílio dos resultados divulgados após o encerramento da feira, em que o número de visitantes foi o mais alto desde 2014, e capaz de superar as expectativas para esta edição. Também entra na conta os cerca de meio milhão de reais faturado a mais pela agricultura familiar, em relação ao ano anterior.

Seja com redução de emissão de gás carbônico, apresentada pela pesquisa do Irga, seja com importação de produtos com baixo custo, ou com exportação de produtos orgânicos, algumas alternativas já estão sendo apresentadas pelos representantes do setor, para reverter o quadro econômico, que deve seguir dialogando com os administrados da máquina pública.

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