Do barracão de lona ao pavilhão da Agricultura Familiar, a trajetória do MST na Expointer

A história do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra na Expointer para construção da Feira da Agricultura Familiar.

Jéssica Polchowicz
Dinheiro e Poder
5 min readSep 6, 2019

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Imagem do arquivo do MST (Registro realizado entre 1999 e 2003) | Crédito: MST/Divulgação

Por Jéssica Polchowicz

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra conquistou seu espaço de fala na Expointer, maior evento do agronegócio do Rio Grande do Sul, em 1999 através de um acordo entre o Movimento e o governo do estado na gestão Olívio Dutra e cresce positivamente a cada ano. O evento é uma vitrine das grandes tendências do agronegócio e vive sua 42ª edição neste ano na cidade de Esteio/RS.

Aliado com as mais recentes tecnologias de máquinas agrícolas e produtos da agroindústria brasileira em exposição, o MST conquistou um espaço importante e de grande visibilidade para ofertar alimentos como arroz carreteiro orgânico, sementes, geleias, frutas e sucos naturais. Uma oportunidade única para o público urbano conhecer o trabalho desenvolvido pelos trabalhadores rurais e adquirir os seus produtos.

Conquistando um espaço fora do campo

A primeira exposição do MST na Expointer foi através de uma negociação com o governo do estado para que houvesse uma amostra da produção dos assentamentos. Foi desenvolvida a réplica de uma casa que era exemplo do projeto “RS Rural” — que estava sendo implantado nas áreas de moradias rurais e de assentamentos na época — juntamente com um barracão de lona preta comumente utilizado nos acampamentos do Movimento com a bandeira que representa a luta. “As pessoas entravam no barracão e era quase um labirinto em barraco de acampamento, com a nossa bandeira vermelha bem hasteada”, lembra Roberta Coimbra, que atua na Direção do Setor de Produção do MST/RS.

Dentro deste barracão havia uma feira da reforma agrária com amostras de sementes crioulas, fotos dos assentamentos e dos acampamentos, o que causou um grande impacto dentro do evento, frequentado majoritariamente por um público do latifúndio e da burguesia na época. Por consequência disso o governo identificou a importância de se debater a necessidade de um espaço de representatividade dentro do evento para a agricultura familiar, indígenas, quilombolas, reforma agrária, etc.

Dando forma ao pavilhão da Agricultura Familiar

Durante o governo de Olívio Dutra foram inaugurados, inicialmente, barracões alugados até surgir o projeto que aprovou a criação de um pavilhão fixo para as exposições. Nessa negociação surge o debate do governo com a participação dos latifundiários do agronegócio, cujo a pauta foi a exigência de que este espaço do MST fosse dentro dos padrões visuais da feira para que não causasse um impacto muito grande nos visitantes, conforme o que ocorreu na primeira exposição do Movimento dentro do evento.

Imagem do arquivo do MST (Registro realizado entre 1999 e 2003) | Crédito: MST/Divulgação

Esse espaço começou a existir através da organização do MST em conjunto com a Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (FETAG), Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (FETRAF), sindicatos e Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Foi uma amostra do que era de fato a agricultura familiar, por tanto, rico em frutas, verduras, sementes, artesanatos, etc.

Hoje o espaço está vinculado ao pavilhão do Projeto Sabor Gaúcho que foi um programa de agroindústria do governo Olívio. “Com isso o espaço se tornou uma amostra da agroindústria familiar, quase uma ‘vitrine da agroindústria’ e não uma exposição da agricultura familiar como um todo”, diz Roberta Coimbra. Devido a isso, Coimbra expõem outra crítica em relação ao evento, pois segundo ela “hoje quem olha acredita que toda agricultura familiar da pequena propriedade da reforma agrária se resume à essas agroindústrias, quase todas com base no salame e queijo, que foram feitas na época do programa Sabor Gaúcho, isso não mostra a potencialidade da diversidade de produção do MST”.

Apesar disso Coimbra relata que o espaço é de grande importância para a visibilidade do trabalho desenvolvido pelo Movimento, visto que é uma das principais vitrines da agricultura familiar para a população, que segundo ela, apesar do público ir ao evento passear e olhar de tudo um pouco, a maior parte dos visitante se direciona à consumação de produtos da agricultura familiar.

O resultado da conquista

Dentro do Pavilhão da agricultura familiar o MST está representado através de suas cooperativas regionais como a Cooperativa de Produção Agropecuária Nova Santa Rita (Coopan), Produção Agropecuária Cascata (Cooptar), Sucos Camargo, Padaria Sino, Agroindústria Mãe Natureza e Cooperativa dos Produtores Orgânicos da Reforma Agrária de Viamão (Coperav).

“Nós do MST ocupamos 9 espaços, nossas bancas são ocupadas por cooperativas, ou seja, os produtos ali expostos são frutos do trabalho coletivo, pode se dizer que mais de mil famílias foram representadas pelas cooperativas e associações nessas bancas”, diz Djones Roberto Zucoolotto, representante da Via Campesina na Comissão organizadora da Expointer.

Imagem do arquivo do MST (Registro realizado entre 1999 e 2003) | Crédito: MST/Divulgação

Os assentados comercializam sucos naturais, caldo de cana, arroz orgânico, embutidos, banha suína, torresmo, queijos coloniais, iogurtes, bebidas lácteas, pães, cucas, biscoitos, bolachas e bolos, entre outros alimentos também vendem sementes de hortaliças agroecológicas. E servem refeições compostas por arroz carreteiro, feijão, salada, pão e farinha de mandioca na praça de alimentação.

“O acúmulo positivo que temos desta e das edições anteriores é principalmente a possibilidade de dialogar com a sociedade sobre a nossa produção de alimentos saudáveis, orgânicos, alimentos para a vida”, afirma Zucolotto. “A população tem direito de conhecer e ter acesso à uma mesa farta e sadia por um preço justo e nós estamos levando isso até ela”.

A Feira da Agricultura Familiar é organizada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, por meio da Secretaria de Agricultura Familiar e Cooperativismo, Secretaria da Agricultura, Secretária da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural (SEAPDR), Via Campesina, Emater/RS — Ascar, Federação dos Trabalhadores na Agricultura do RS (FETAG) e Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar do RS (FETRAF — Sul).

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