(Des) Influenciadores e o poder da atração ao contrário

Katia Delavequia
Dioramas Modernos
Published in
6 min readOct 7, 2019

afaste de mim esse #cálice

Photo by Diggity Marketing on Unsplash

É novidade para exatamente 0 pessoas que estamos em plena era dos influenciadores e blá blá blá. Posso dizer que o termo até já se tornou popular (existe até uma personagem de novela interpretando esse papel).

Todo mundo surfando na onda seja famoso ou não. Aquelas postagens do café da moda ou do passaporte na mão no aeroporto virou o clichê do “olha como vivo minha vida de glamour e sucesso”.

E como toda tendência gera uma bolha, chega um momento em que a bolha estoura e se estabelece a contramão do babado todo. Então a edição de hoje vai se dedicar a uma nova categoria: os desinfluenciadores ou unfluencers (para quem foi alfabetizado em inglês tal qual Sasha).

O tema é interessante pra mim pois tenho uma certa antipatia ao hype. Por exemplo quando vejo 64737 influenciadores fazendo publi de determinado produto ao mesmo tempo. De repente minha timeline tá inundada de tal coisa e eu passo a ter ódio do produto e começo a desprezá-lo. O objetivo de me despertar o desejo causa o efeito contrário de nunca querer ver na minha frente.

Chega a ser irônico já que me formei em Publicidade e Propaganda. Pensa, passei 4 anos aprendendo a como despertar o desejo das pessoas a consumirem coisas. Sei como funciona. Conheço os artifícios. E amo tá. Estou na profissão certa e é por saber como a banda toca que o efeito em mim nem sempre funciona. Um belo dia vi que não estou só em meu pequeno ranço.

Em uma das newsletters que assino, alguém sugeriu a leitura de um artigo da The Cut (uma das sessões online da revista New York) exatamente sobre esse assunto. O fato de passar a odiar o que tanto tentam te vender, seja produto ou modo de vida. Culpa dos unfluencers. Vou reproduzir algumas partes do texto escrito por Marisa Meltzer, pois quando li pensei ‘amiga me abraça’:

“Aqui está uma hora da minha vida que perco todos os dias no Instagram. É um ato sempre solitário, geralmente depois do jantar ou às vezes durante insônia no meio da noite, e atinge algum tipo de crescente, como comprar sapatilhas de US$ 30 que prometem tornar os saltos altos menos dolorosos (tão convincentes no anúncio!) Ou mergulhando fundo nessa mulher que é a ex da amiga de alguém com quem eu cresci. Ela publica fotos de roupas do The Talented Mr. Ripley e uvas estranhas, com aparência de enfeitiçadas. Para isso, ela tem cerca de 20 mil seguidores. Eu me torno um deles.

No começo, estou curiosa sobre a logística da vida dela. Parece haver uma quantidade inspiradora de conteúdo #influencer que não está realmente alinhada com o seu alcance de seguidores. Ela coloca tags em cada item de suas roupas como se fosse uma superstar em uma estreia. Há muito conteúdo: selfies suadas da academia como desculpa para mostrar seu abdômen, café com leite (lattes) da moda, jantar com “as garotas” no Pastis, legendas como “Acabei de fazer um teste de DNA, acontece que sou 100% daquela puta”, ”Dicas sobre como reduzir sua pegada de carbono”, várias fotos de azulejos durante uma viagem a Lisboa (“meu escritório da semana”, “moro aqui agora”).

Tudo começa a irritar, e logo eu como seguidora, me transformei oficialmente em uma seguidora com ódio. Seu feed está me afastando de coisas que eu já amei, como tamancos e peles da Patagônia. Por fim, estou fechando os olhos e esfregando a ponta do nariz — o que faço apenas quando realmente não consigo lidar com a vida — e sussurrando em meu telefone: “Não, não estrague os Negronis para mim também”.

Conheça os desinfluenciadores, pessoas que me fazem querer fazer o oposto do que estão fazendo e jogar fora o que eu já possuo e que eles já tenham postado. (…)

(…) Um desinfluenciador tem o poder de mexer com sua cabeça, te deixando desequilibrado e te fazendo questionar o que gosta e o que não gosta, o que você sabe ser legal e o que é brega. Me faz pensar se os pessoas legais que eu sigo — digamos, as garotas de Chinatown sempre vestidas com Issey Miyake vintage — talvez não sejam tão legais na vida real?

Isso pode se resumir ao narcisismo com pequenas diferenças. Durmo em lençóis de linho e ocasionalmente faço lattes de aveia com um batedor especial e não sinto a necessidade de mostrá-lo, o que me faz sentir irracionalmente superior. Mas por que a desinfluenciadora está postando como se fosse o trabalho dela, mesmo quando não é? Ela acha que fica bem em todos esses macacões, ou continua posando neles porque gosta dos comentários? Ela está apenas procurando coisas grátis? E então minha mente divaga para as questões macro: a onipresença de um certo tipo de gosto auto-referente diminui seu apelo?

Estou sendo dramática e dramaticamente mesquinha, o que é, naturalmente, um próprio tipo de prazer. Mas isso também faz parte do efeito pernicioso do desinfluenciador. É inerentemente uma busca solitária. Há algo gratificante em sentir que você é o único que não acha que essa pessoa é tão legal quanto o resto do mundo. É um pouco como “As roupas novas do imperador”, mas, em vez disso, estou me forçando a respirar profundamente através da minha raiva de mulher que continua tagueando cada caftan que usa como se fosse a rainha dos vestidos fluidos.”

Encarem essa edição como reflexão e não como crítica, pois eu estou inserida nesse mundinho aí também. Trabalho com comunicação. Já postei meu copinho de café. Já comprei algo por que tal pessoa disse que é bom. Acho digno o trabalho dos influenciadores postando produtos e ganhando dinheiro com isso. Meu objetivo foi mostrar o outro lado da moeda e o que pode causar em algumas pessoas.

📺 Te Amo, Agora Morra. ❌ Já aviso é pesadíssimo, então só assista se depressão e suicídio não forem gatilhos ❌. O documentário da HBO conta o caso da morte de Conrad Roy, garoto depressivo encorajado pela namorada a cometer suicídio. Eles tinham um namoro online e nas intensas trocas de mensagem, ela o pressiona a tirar a própria vida. No começo você pensa ‘meu deus como pode uma menina causar esse estrago’ e conforme vai desenrolando você percebe que o buraco é mais embaixo. Há vários fatores envolvidos: família, presença virtual, ansiedade social, depressão e influência da tecnologia e das redes sociais na vida dos jovens.

📺 Explicando a Mente. A série documental acabou de chegar na Netflix. É narrada por Emma Stone e examina o que está acontecendo com nossas mentes em várias situações: sonhando, tendo ansiedade, meditando. Também mostra como nossa memória funciona. Bem legal. Já existe uma série Explicando sobre outros temas lá. Vale muito a pena.

👓 Quem quiser ler a íntegra da matéria que transcrevi um trecho acima: Conheça os Desinfluenciadores:

👓Artigo tratando sobre os lucrativos segredos da economia de modificação corporal do Instagram: Prefiro morrer linda do que viver feia:

Saudades Broad City ❤

E você, o que acha? É mais influenciado ou desinfluenciado? Comenta aí!

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