25 anos da emancipação Croata e Eslovena
As independências de Croácia e Eslovênia, em 1991, foram o estopim para a Guerra Civil Iugoslava, considerada um dos episódios mais traumáticos da Europa desde a Segunda Guerra Mundial.
Por Mandubs (originalmente publicado em 25 de junho de 2021)
Hoje completam-se 25 anos das emancipações croata e eslovena da antiga República Socialista Federativa da Iugoslávia. Mas para entender este processo de emancipação e suas consequências, é importante relembrar o que de fato era a Iugoslávia.
O primeiro Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos surgiu em 1918, como fruto da reorganização geopolítica europeia após a Primeira Guerra Mundial, mas durou pouco tempo, foi desmembrado em 1941, após rápida derrota contra o exército alemão na Segunda Guerra Mundial. A partir de então, parte dos territórios desse reino foram anexados à Alemanha nazista, restando apenas Croácia e Sérvia com estruturas de Estados independentes — a primeira sob o regime autoritário e paramilitar Ustaše e a segunda como Estado fantoche nazista.
Ainda em 1941, surgiu o movimento antifascista sérvio, Partisans, dentro do qual a figura de Josip Broz, mais conhecido como Tito, tornou-se preponderante. Ele passou a organizar o movimento de resistência contra o avanço nazista na região dos Bálcãs, por meio de uma iniciativa federalista, contando com representantes de todas as nacionalidades da região. Devido ao sucesso de Tito como líder das campanhas de liberação, ele passou a ser o Primeiro-Ministro da Iugoslávia em 1945, dotado de grande prestígio tanto no âmbito interno, quanto externo. Deste modo, a República Socialista Federativa da Iugoslávia, fundada em dezembro de 1945, após o fim da Segunda Guerra Mundial e a derrota nazista, tinha Tito como figura substancial de representação, assim como elemento principal de coesão nacional. Como efeito de sua notoriedade, Tito foi denominado presidente vitalício da Iugoslávia em 1963.
Devido ao caráter multiétnico do país, bem como o consequente do enfoque na figura prestigiosa do governante como elemento de coesão nacional, o principal impasse enfrentado pelos iugoslavos ocorreu após a morte de Tito em 1980 e a necessidade de se encontrar um sucessor para este.
A solução encontrada foi a criação de um sistema de direção colegiada, ou seja, um governo com representantes de cada república, sob a liderança de um presidente. Esse sistema, somado à degradação da economia interna, inflou o sentimento nacionalista dos grupos étnicos que compunham a Iugoslávia. Diante disto, a cada novo recenseamento, crescia o número de pessoas que se identificavam pelo seu grupo étnico, e não como iugoslavo.
Ao passo em que, devido aos interesses nacionais, a Sérvia procurava manter a unidade iugoslava, Croácia e Eslovênia buscavam meios de emancipar-se, sob amparo da Europa Ocidental. O desejo de emancipação croata e eslovena era embasado, principalmente, no elevado índice de desenvolvimento econômico de ambas em relação ao sul da Iugoslávia, devido ao investimento em infraestrutura e turismo. Além disso, o fato de Croácia e Eslovênia serem majoritariamente católicas influenciou fortemente o desenvolvimento do sentimento de diferenciação das demais repúblicas iugoslavas, cujas principais religiões eram o catolicismo ortodoxo e o islamismo.
A partir da queda do Muro de Berlim, em 1989, Croácia e Eslovênia passaram a buscar maior autonomia, ou mesmo a independência, em relação às regiões mais pobres do país, outrora governado por Tito. Ao mesmo tempo, a Sérvia objetivava maior centralização política, sob o preceito de garantir coesão entre as unidades federativas. Entretanto, devido ao desgaste das relações entre os grupos étnicos que compunham a Iugoslávia, bem como do ideal socialista naquele momento, tais identidades étnicas passaram a ser fortemente instrumentalizadas pelos líderes das federações para fins políticos.
Deste modo, com a declaração da independência eslovena em 25 de junho de 1991, teve-se início o que foi reconhecido como a Guerra Civil Iugoslava. Embora o exército iugoslavo tenha se movimentado para evitar a secessão do Estado, por se tratar de uma região com pouca diferenciação étnica em sua população, o conflito durou pouco mais de dez dias, e um acordo de paz foi estabelecido entre as partes, com o apoio da comunidade europeia.
Ao contrário da Eslovênia, a Croácia possuía uma população muito diversa etnicamente e, no decorrer de 1991, as questões étnicas foram um fator de instabilidade interna. A população sérvia dentro da Croácia havia declarado, em fevereiro de 1991, sua independência, tomando o controle da região que autodenominavam República Sérvia da Krajina, contando inclusive com aparatos de governo próprios. A partir de então, as tensões entre Croácia e Sérvia começaram a se acirrar, em especial, devido aos confrontos entre a polícia croata e a recém proclamada República da Krajina.
Com a proclamação da independência croata em junho de 1991, a Guerra Civil Iugoslava de fato passou a ser considerado o episódio mais sangrento em território europeu desde a Segunda Guerra Mundial, o que contabilizou aproximadamente 150 mil mortes e o deslocamento interno de aproximadamente 4 milhões de pessoas. Os crimes cometidos entre 1991 e 2001 passaram a ser julgados pelo Tribunal Penal Internacional para a Antiga Iugoslávia (TPII), estabelecido a partir da resolução 827 do Conselho de Segurança das Nações Unidas em 1993, com o intuito de dar respostas às vítimas deste trágico episódio da história da humanidade.