O sucesso das delações premiadas: a falta de confiança no “companheiro”

ISE Business School
Direção Financeira e Economia

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Oscar Simões

Muitos artigos saíram na mídia, desde as primeiras delações premiadas, referentes à teoria dos jogos, mais especificamente, ao problema que se conhece por dilema do prisioneiro.

Nesse jogo, a polícia captura duas pessoas suspeitas de terem realizado um crime e tem evidências fracas para mantê-las presas por um período longo. Porém, se um deles “delatar” que ambos fizeram o crime, este terá uma diminuição da sua pena e o outro terá a sua pena aumentada. De maneira esquemática, o problema fica da seguinte forma:

Ambos os criminosos têm duas possibilidades de ação: negar o crime ou assumir que ambos realizaram o crime (no caso, delatar o ocorrido). Se o criminoso A delata o crime, ele pega 1 ano de prisão, enquanto o criminoso B pega 5 anos de prisão. A pior situação é se ambos delatam simultaneamente. Nesse caso, não haveria informação extra a ser descoberta e, por isso, pegariam a pena padrão pelo crime cometido.

Analisando o jogo, a melhor estratégia para ambos é “negar-negar”, onde ambos os criminosos pegam somente 1 ano de prisão. Porém, se um “companheiro” não tem a certeza absoluta do que o outro vai fazer, um clima de desconfiança é instaurado. Se o criminoso confia piamente no seu “companheiro”, ele sabe que deverá negar e isso fará com que ambos fiquem com o melhor resultado conjunto. Porém, surge a dúvida: e se o bônus para o delator for irresistível? Por exemplo: prisão domiciliar (e aqui estamos falando de domicílios luxuosos e bem diferentes das celas das prisões). E se o castigo por ter sido delatado for de 37 anos de prisão? Colocando ambos na balança, talvez valha a pena delatar o cúmplice. Porém, para ser efetiva, a delação precisa ocorrer antes do outro decidir fazê-la, pois só o primeiro pode aproveitar do benefício. É com base nesse espírito que foi pensado o arcabouço das delações que vemos hoje nas investigações de corrupção no país.

Mais do que ninguém, os políticos conhecem esse jogo. Não é à toa que, quando envolvidos em acusações de má conduta, eles sempre negam o ocorrido. Primeiro, porque são apenas acusações e essa é a primeira reação de um culpado (não pego em flagrante, obviamente). Eles sabem que, se todos fizerem isso, a estratégia “negar-negar” é a melhor para todos.

Independentemente da semelhança entre o problema teórico e a prática, o ponto importante aqui é que basta a quebra de um elo de confiança para o sistema de “companheirismo” ruir. O único ponto triste dessa história toda é que provavelmente os criminosos não façam as delações pensando no bem da sociedade ou por terem sido tomados por um profundo arrependimento ético-moral. Eles o fazem simplesmente porque obterão ganho nisso, geralmente prisão domiciliar ou redução significativa da pena. Parece não haver ainda uma mudança ética-moral nesse sentido. E não podemos esperar que isso aconteça. Temos que começar a pensar nos próximos passos: fazer escolhas mais acertadas sobre as pessoas que estão à frente das decisões que nos impactam; e criar processos robustos de governança que limitem as ações desses agentes corruptos. Esse é o nosso desafio e nossa obrigação como cidadãos e como gestores.

Oscar Simões é professor do departamento de Direção Financeira do ISE Business School.

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