Entre vistas: Dani Rosolen e Incabível
Integrante do Coletivo Discórdia fala sobre seu primeiro livro, ‘Incabível’.
Dani Rosolen é poeta e escreve para elaborar o mundo dentro de si. Incabível (Patuá) é seu primeiro livro solo e foi uma maneira de compartilhar as dores e as experiências da anorexia e da compulsão alimentar para ajudar outras pessoas que passaram ou passam pelo mesmo problema. Já participou das coletâneas Não Pretendia Criar Discórdia (Giostri, 2017), Eros Ex Machina (@link, 2018) e Era de Aquária (Oito e Meio, 2019).
O lançamento acontece nesta quinta-feira (06 de junho), das 19:00 às 23:45, no Patuscada-Livraria, bar & café. Você encontra todas as informações no evento do Facebook. (Só clicar e confirmar presença! )
Dani, você é uma poeta de muita intensidade e quantidade. Mesmo jovem, já tem um número bem grande de poemas escritos. Uma passarinha me contou que são 400! Como funciona esse processo tão fértil na escrita? E por que você escolheu a Poesia?
Escrevo, pelo o que me lembro, desde meus 12 anos. Encontrei na poesia uma maneira de elaborar o que acontecia comigo e entender o que se passava com o mundo ao meu redor. Acho que colocar no papel o que eu estava sentindo me ajudava a dar sentido a tudo. Na verdade, eu tenho um pouco mais que 400 poemas. A maioria não tem qualidade (risos), mas está lá na minha lista, fez parte da minha história e um dia ainda pode virar algo melhor. Vai saber...
Como foi o processo de seleção dos poemas que entraram no Incabível? Tem algum que você se arrepende de ter deixado de fora?
Justamente por acreditar que o que já foi feito e não tinha valor em determinado momento pode passar a ser precioso mais adiante é que acho que vale a pena escrever e anotar tudo o que vem à mente. Os poemas de Incabível são um misto de poucas poesias que escrevi (e não valorizei) na fase em que estava doente, mas que me incitaram a escrever a maioria dos poemas que compõe o livro. Ou seja, não houve bem uma seleção. Peguei uns cinco, seis poemas que já tinha sobre o assunto, mergulhei no tema, revivi minha história e dali nasceram novas criações. Sobre me arrepender, sempre acho que poderia ter falado algo mais. Mas a rotina de quem tem transtornos alimentares é meio repetitiva, por isso acredito que alguns poemas acabaram falando mais do mesmo, reforçando, de certa forma, essa questão da doença. Ou seja, talvez escrever mais seria apenas redundância.
O tema do livro está relacionado com sua experiência pessoal. Por que você escolheu escrever sobre esse tema e por que decidiu publicar seu primeiro livro justamente sobre algo tão particular? Doeu ou aliviou?
Escolhi falar sobre algo que ainda acho tabu: um transtorno psiquiátrico e a questão da autoimagem que perturba muitas meninas e meninos, mas que ainda é tratado à quatro paredes e não como um tema que deveria ser esmiuçado às claras e sem medo de julgamentos. Quem nos dias de hoje nunca teve que recorrer a um psicólogo, precisou de um floral ou de alopatia? As pessoas têm medo de falar de depressão, de mostrar a vulnerabilidade, de dizer que sofrem. Eu quis escancarar isso. Doeu muito reviver toda a fase mais conturbada da anorexia e da compulsão, mas posso dizer que foi uma das melhores terapias que fiz.
A abordagem do assunto, à primeira vista, pode parecer muito restrita; mas qualquer pessoa que tenha se sentido desconfortável dentro de si mesma, -seja por questões físicas ou não-, com certeza vai se identificar. Qual a importância de falar sobre autoimagem e que pontos urgentes essa reflexão atinge?
Acho que não só pessoas com transtornos alimentares podem se identificar com o livro, mas qualquer um em uma sociedade que nos obriga a estar dentro de um padrão. Em que a mídia, as novelas, as séries, as celebridades, as empresas e, às vezes, até nossa família, dizem que devemos nos vestir de um jeito, gostar de tal estilo de música, consumir alimentos do tipo x, manter o corpo da forma y. Cada um é único, cada um deve fazer suas próprias escolhas. Mas volta e meia nos pegamos presos ao que os outros esperam de nós e não ao que realmente queremos para nossa vida.
Como a Dani de hoje se relaciona com autoestima e como ela encontrou um caminho saudável para lidar com ela? Nos mostre um pouco dessa trajetória e em que ponto ela está hoje.
Sempre tive baixa autoestima, mas acho que hoje sei os gatilhos que me deixam down, sei que não é só o físico, que são coisas internas mal resolvidas que precisam se organizar para que eu me valorize. A partir do momento que faço essa reflexão, as coisas começam a mudar. Quando paro para pensar em todos os meus privilégios, vejo que minha autoestima deveria estar lá em cima e que eu deveria estar lutando para ajudar outras pessoas a elevarem seu amor próprio.
Para nós, mulheres, o caminho de aceitação do próprio corpo é muito mais árduo e até mesmo cruel. O movimento feminista tem conseguido questionar algumas certezas, destruir alguns padrões; porém, ainda estamos em processo. Como você sente esse avanço? A luta coletiva pode ajudar na autoaceitação ou não está relacionada ao individual?
Acredito que o movimento feminista tem ajudado muito nessa luta, mostrando que é preciso quebrar padrões enraizados e que nos sufocam há muito tempo. Juntas, com certeza somos mais fortes. Mas cabe a cada uma compreender, no seu tempo, o que é estar bem consigo mesma. Às vezes, isso não tem nada a ver com a aparência. É algo bem mais profundo e que precisa de uma auto análise para saber onde o calo aperta.
Que conselhos você daria para as novas gerações de meninas e mulheres que se sentem ainda incabíveis?
Meu conselho é: não tente se encaixar em padrões. Você é única e essa é sua maior vantagem, seu maior encanto.
Hoje, ao se olhar no espelho, que Dani você vê? Como é esse reflexo?
Vejo uma Dani mais madura, longe de não ter crises, mas consciente de que elas podem ser superadas e o que o tempo é capaz de cicatrizar muitas dores e ajudar a consertar as peças que a mente nos prega.
O que já coube antes, -naquelas Danis-, e hoje não cabe mais, na Dani que você vê refletida aqui e agora?
Hoje cabe em mim mais perdão, mais flexibilidade, mais vontade de mudar, mais amor próprio, menos rigidez. Não cabem mais regras imutáveis, autoflagelações ou pena.
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