Doença de Parkinson e as novas tendências tecnológicas

Nesta publicação, vamos entender o contexto da doença de Parkinson e como as novas tecnologias melhoram a qualidade de vida dos afetados.

Higor Souza Cunha
ARGO — Divulgação Científica
9 min readDec 17, 2020

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Figura 1. Idoso com tremores devido à doença de Parkinson. Fonte [1]

Destaques

Uso de laserterapia e pressão negativa se mostrou eficaz ao induzir redução acentuada das dores provocadas pela rigidez muscular e diminuição dos tremores involuntários em pacientes com Parkinson.

Os principais benefícios da neuromodulação são o controle dos sintomas da enfermidade e a maior precisão na avaliação feita pelo profissional da saúde.

Os índices de melhora com o processo da neuromodulação são bastante altos, sendo que cerca de 95% dos parkinsonianos têm melhora significativa da qualidade de vida.

As novas tendências tecnológicas

O Mal de Parkinson é uma doença crônica e progressiva e, apesar de possuir tratamento medicamentoso e terapêutico, não possui cura. Nesse contexto, é um desafio da ciência buscar meios mais eficientes de melhorar a qualidade de vida dos afetados. Para maior entendimento sobre a doença de Parkinson sugere-se a leitura da seção “Contextualização” ao final desta publicação.

Neste texto serão apresentadas duas iniciativas tecnológicas promissoras no contexto apresentado: uso de Laserterapia com Pressão Negativa e Neuromodulação.

Laserterapia e Pressão Negativa

Pesquisadores do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP desenvolveram uma nova técnica para tratamento de pacientes com Parkinson [2]. O novo protocolo, que combina laser e pressão negativa, tem como objetivo implementar uma nova possibilidade de tratamento não invasivo e não farmacológico para amenizar as chamadas dores musculares do paciente parkinsoniano, inclusive aliviando os desconfortos causados pelos tremores. Tal projeto foi desenvolvido por pesquisadores do IFSC em parceria com o Centro Universitário Central Paulista (Unicep) e a Univesidade Martin Luther-Halle (Alemanha), cujo artigo [3] foi publicado na revista Journal of Alzheimers Disease & Parkinsonism.

O protocolo proposto é feito por meio do Vacum Laser, um aparelho desenvolvido há três anos pelo Grupo de Óptica, do IFSC. O aparelho combina em uma única plataforma o vácuo (sucção) por ventosas que provocam pressão negativa no local e o laser de forma concomitante centralizado na ventosa.

Figura 2. Vacum Laser. Fonte [2]

Para a validação da tecnologia foi realizado experimento com 3 grupos de parkinsonianos: o primeiro grupo foi tratado só com laser; o segundo recebeu aplicação de pressão negativa com ventosa; o terceiro recebeu as duas terapias. Os pacientes do terceiro grupo obtiveram melhores resultados em seu estado de saúde, com redução acentuada das dores provocadas pela rigidez muscular e diminuição dos tremores involuntários, resultado que permite o retorno do paciente às suas atividades anteriormente limitadas. De acordo com o pós-graduando Antônio Aquino, um dos pesquisadores envolvidos no projeto [2]:

“O laser é capaz de promover tanto a analgesia quanto ação anti-inflamatória, beneficiando o paciente que já está sob ação da pressão negativa, o que proporciona relaxamento por meio da sucção do músculo, de modo a realizar uma massagem sem que seja necessário pressionar a musculatura que já está em contínuo estresse.”

Figura 3. Detalhe do tratamento com laser e pressão negativa. Fonte [4]

O equipamento, que está devidamente aprovado pela ANVISA [5], já permite o tratamento gratuito na Santa Casa de São Carlos e clínicas particulares já utilizam a tecnologia. A aplicação dura 30 minutos e deve ser realizada duas vezes por semana.

Neuromodulação

A neuromodulação é um processo que influencia a sinapse neuronal (junção entre os neurônios onde ocorre a propagação do impulso nervoso) deixando-a mais rápida e eficiente. No contexto da doença de Parkinson, a neuromodulação é caracterizada pelo DBS (Deep Brain Stimulation — Estimulação Profunda do Cérebro), dispositivo implantado cirurgicamente, semelhante ao marcapasso cardíaco, para fornecer estimulação elétrica às áreas precisamente direcionadas do cérebro. Os principais benefícios da neuromodulação são o controle dos sintomas da enfermidade/doença e a maior precisão na avaliação feita pelo profissional da saúde.

O DBS, além de controlar os sinais da patologia, é composto de um sistema de monitoramento contínuo capaz de captar os sinais cerebrais do paciente 24 horas por dia. Permite ao médico analisar os resultados e adequar a terapia sem a necessidade de recorrer à avaliação clínica ou relato de impressões pessoais, e o acesso dos dados se dá por meio de um aplicativo. Vale destacar que o dispositivo também permite que o paciente seja submetido a ressonância magnética, um dos principais exames de controle do Parkinson.

Figura 4. Detalhe da implantação do DBS em um paciente. O eletrodo esverdeado capta a atividade cerebral e o dispositivo no peito do paciente emite pulsos elétricos, além de permitir o ajuste de acordo com as necessidades clínicas. Fonte [6]

Segundo Murilo Marinho, especialista em distúrbios do movimento, além de atenuar os sintomas da doença, as informações disponíveis pelo monitoramento cerebral podem ser usadas para rastrear o estado do paciente ao longo do dia e, por meio de programação expandida, permitir um controle mais preciso da terapia, mesmo a distância [7]. Para além do Parkinson, o dispositivo pode ser um bom tratamento auxiliar para outros distúrbios neurológicos. Ele também destaca a perda da eficácia com o tempo no tratamento tradicional (medicamentoso), além das possíveis reações adversas (efeitos colaterais):

“Alguns anos após o uso [dos medicamentos], pode-se observar movimentos involuntários, alucinação e delírios. Ainda, a partir do quinto ano de tratamento medicamentoso, quase metade dos indivíduos terá flutuação motora relacionada ao medicamento. Mesmo com o ajuste da dosagem, os sintomas continuam atrapalhando a vida do paciente. O efeito benéfico dos fármacos, por sua vez, fica cada vez mais curto, chegando a apenas duas ou três horas depois de cada dose ingerida”

Os índices de melhora com o processo da neuromodulação são bastante altos, sendo que cerca de 95% dos parkinsonianos têm melhora significativa da qualidade de vida [8]. Segundo o Dr. Antonio De Salles, neurocirurgião, chefe do HCor Neuro (Hospital do Coração de São Paulo) e professor emérito de neurocirurgia e radiação oncológica da Universidade da Califórnia (UCLA), a tecnologia também é muito útil em outras doenças como a depressão:

“Em nossa experiência com estimulação de nervos periféricos para tratar depressão, conseguimos melhora em aproximadamente 95% dos pacientes. São pessoas que mudam a vida após a cirurgia”

Apesar de todo o potencial da tecnologia há limitações que dificultam o seu proveito em massa. Somente os aparelhos para tais operações custam cerca de 100 mil reais e tudo o que envolve a cirurgia pode sair por cerca de 150 mil [8]. No SUS, há uma cota limitada de dispositivos, mas a principal limitação passa pela necessidade da elevada especialidade, pois um neurocirurgião habilitado para realizar uma cirurgia de neuromodulação pode demorar de 15 a 20 anos para ser formado.

Conclusão

Como visto neste texto, a doença de Parkinson compromete muito a vida dos afetados e isso traz a necessidade do desenvolvimento de tecnologias que consigam melhorar a qualidade de vida dessas pessoas. Apesar do tratamento tradicional composto pelas vertentes farmacológica e terapêutica, o caráter crônico e progressivo torna a anomalia ainda mais complexa com o passar dos anos, o que exige novos métodos para tratar os doentes, como aqueles vistos nesta publicação.

O desenvolvimento de pesquisas na área permitiu o desenvolvimento de um aparelho por parte do IFSC que já está trazendo benefícios àqueles necessitados, apesar de não ser uma solução/cura, mas sim um tratamento que permite uma melhora mais consistente e temporária. A neuromodulação traz uma tendência tecnológica que já apresenta resultados interessantes para muitas doenças de cunho neurológico, mas o procedimento ainda apresenta limitações consideráveis. Apesar da doença de Parkinson ainda não ter uma cura propriamente dita e as metodologias atuais apresentarem limitações, é evidente que os cientistas e pesquisadores estão em busca de melhorar o quadro da doença, a tecnologia está em constante evolução e as limitações tendem a diminuir, tornando o cenário cada vez mais promissor aos afetados que tanto almejam a qualidade de vida.

Contextualização

A doença de Parkinson ou Mal de Parkinson é um distúrbio do sistema nervoso central, uma doença crônica, degenerativa e progressiva causada pela morte dos neurônios de uma determinada região do cérebro, antes da hora e segue ritmo de crescimento com o passar dos anos [9]. A doença afeta uma área muito pequena do cérebro chamada Substância Negra, região onde é produzida a dopamina, um neurotransmissor responsável pelo controle dos movimentos do corpo.

Figura 5. Detalhamento da região Substância Negra. Fonte [10]

Atualmente não se conhece a causa ou uma cura para a doença, mas há tratamentos eficientes com resultados rápidos que podem melhorar a qualidade de vida. A doença não é de notificação compulsória, isto é, não é monitorada pelos órgãos de saúde, deste modo não se sabe ao certo o número de portadores no Brasil e no mundo. Há, no entanto, uma estimativa de pelo menos 200 mil pessoas com Parkinson no Brasil [11] e espera-se que em 2030 mais de 600 mil brasileiros possam sofrer da doença em virtude do envelhecimento da população [12].

Sintomas

Em virtude do comprometimento da região onde se produz a dopamina, o controle dos movimentos do corpo passa a apresentar falhas, levando na maioria dos casos ao descontrole dos movimentos e tremores. Outro sintoma que assola o bem estar dos pacientes é o endurecimento dos músculos, que gera desequilíbrio e dificuldade de locomoção, contribuindo para um maior risco de quedas. Além disso, distúrbios na fala, alterações no sono (insônia à noite e sono excessivo ao dia), alterações no sistema respiratório e distúrbios no aparelho urinário são outros possíveis sintomas que acompanham a doença de Parkinson, que por sua vez pode desencadear quadros de ansiedade e depressão devido à perda de autonomia do indivíduo afetado.

Diagnóstico

O diagnóstico ocorre através de exames clínicos, o médico (geralmente o neurologista) pergunta sobre o histórico do paciente e para complementar pede alguns exames para descartar outras possibilidades (não há exame específico para o diagnóstico da enfermidade) e, assim, poder afirmar que está diante de um caso de Parkinson. A anomalia pode se manifestar por volta dos 55 anos em diante, mas é mais comum após os 70 anos, majoritariamente em homens.

De acordo com a Fundação Nacional de Parkinson, nos Estados Unidos, pesquisas concluem que pessoas com pais ou irmãos diagnosticados com Parkinson têm o dobro de chance de desenvolver a doença no futuro [13]. Pesquisas também mostram que o contato com produtos químicos e materiais tóxicos aumentam os riscos de alterações cerebrais, assim como impactos na cabeça (seja em acidentes, quedas ou lutas) [9].

Tratamento

O tratamento da doença de Parkinson é essencialmente farmacológico e terapêutico, com fisioterapia, terapia ocupacional e fonoaudiologia. A fisioterapia atua na contenção de eventuais dores, aumenta a flexibilidade dos músculos e melhora a mobilidade, conferindo mais independência à pessoa idosa. A terapia ocupacional auxilia o paciente com técnicas de reabilitação para se manter independente nas atividades diárias, estimulando sua autoestima e segurança. Devido aos possíveis distúrbios na fala, a fonoaudiologia atua na estimulação da fala do paciente através de exercícios, além de ajudar na manutenção de uma comunicação clara.

Dependendo do caso e da intensidade, o médico pode indicar a realização de cirurgia, realizada na região do cérebro responsável pela substância que gera os movimentos, visando reduzir os efeitos restritivos no paciente.

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Referências

[1] http://www.angelsnaturais.com.br/blog-detalhe/50/doenca-de-parkinson-. Acessado em 15/12/2020

[2] https://jornal.usp.br/ciencias/nova-terapia-promove-qualidade-de-vida-a-pacientes-com-parkinson/. Acessado em 12/12/2020

[3] https://www2.ifsc.usp.br/portal-ifsc/wp content/uploads/2020/06/Tamae-2020.pdf. Acessado em 12/12/2020

[4] https://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2020/08/10/pesquisadores-da-usp-sao-carlos-desenvolvem-tratamento-para-reduzir-sintomas-de-parkinson.ghtml. Acessado em 13/12/2020

[5]https://www2.ifsc.usp.br/portal-ifsc/nova-terapia-devolve-qualidade-de-vida-a-pacientes-com-doenca-de-parkinson/. Acessado em 13/12/2020

[6] http://rsaude.com.br/contato/materia/tratamento-cirurgico-da-doenca-de-parkinson-a-nova-velha-alternativa/21663. Acessado em 14/12/2020

[7]https://www.em.com.br/app/noticia/bemviver/2020/12/14/interna_bem_viver,1220328/neuromodulacao-melhora-qualidade-de-vida-de-pacientes-com-parkinson.shtml. Acessado em 14/12/2020

[8]https://drauziovarella.uol.com.br/reportagens/neuromodulacao-ajusta-desequilibrios-no-cerebro-para-tratar-de-parkinson-a-depressao/#:~:text=Reportagens-,Neuromodula%C3%A7%C3%A3o%20ajusta%20desequil%C3%ADbrios%20no%20c%C3%A9rebro%20para%20tratar%20de%20Parkinson%20a,mas%20acesso%20ainda%20%C3%A9%20restrito. Acessado em 14/12/2020

[9] https://corasenior.com.br/doenca-de-parkinson-tudo-o-que-voce-precisa-saber/. Acessado em 12/12/2020

[10] https://cemedmg.wordpress.com/tag/substancia-negra/. Acessado em 12/12/2020

[11] http://www2.ebserh.gov.br/web/chc-ufpr/noticias/-/asset_publisher/kolvfeKgK2VF/content/id/3020361/2018-04-doenca-de-parkinson-atinge-cerca-de-200-mil-pessoas-no-brasil#:~:text=Doen%C3%A7a%20de%20Parkinson%20atinge%20cerca%20de%20200%20mil%20pessoas%20no%20Brasil,-Tratamento%20pode%20aumentar&text=A%20Doen%C3%A7a%20de%20Parkinson%20%C3%A9,de%20movimentos%20e%20tremores%20musculares. Acessado em 13/12/2020

[12] https://www.prosaude.org.br/noticias/em-2030-mais-de-600-mil-brasileiros-poderao-sofrer-do-mal-de-parkinson/. Acessado em 13/12/2020

[13] https://www.erichfonoff.com.br/parkinson-e-hereditario/. Acessado em 13/12/2020

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