Perigos da Automedicação

Nesta publicação, vamos entender por que devemos nos preocupar com a automedicação e qual a ação no nosso corpo de remédios populares.

Higor Souza Cunha
ARGO — Divulgação Científica
6 min readAug 29, 2021

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Figura 1. Automedicação e o uso irresponsável. Fonte [1].

Destaques

Entre 2010 e 2017, o medicamento foi o agente tóxico mais frequente nas notificações aos órgãos de saúde, correspondendo a 52,8% do total das ocorrências;

• A automedicação é um hábito comum a 77% dos brasileiros;

• Familiares, amigos e vizinhos são os principais influenciadores na escolha dos medicamentos usados sem prescrição — 25% do total;

Em um contexto de uso irresponsável, o analgésico, anti-inflamatório e relaxante muscular, medicamentos mais consumidos pelo brasileiro, podem culminar, respectivamente, em insuficiência renal, úlcera e alterações neurológicas.

Contextualização

Muitos de vocês devem ter assistido à série The Queen’s Gambit (O Gambito da Rainha), cuja temática versa sobre uma moça prodígio do xadrez e que luta contra vícios em meio aos contratempos da sua jornada. Um fato curioso é o vício desenvolvido pela protagonista Beth nas “pílulas verdes”, drogas psicoativas para supressão de humor e que ajudam a tratar ansiedade.

Embora seja uma trama fictícia, ela ilustra um problema de saúde pública extremamente preocupante que é a automedicação. O uso irresponsável de medicamentos e o apreço pelo alívio imediato comprometeu a vida de muitas figuras públicas ao longo da história, como Bruce Lee (reação alérgica a um relaxante muscular), Prince (overdose de um analgésico potente) e Elvis Presley (arritmia cardíaca devido ao abuso de medicamentos prescritos).

Figura 2. Temática da automedicação na série “O Gambito da Rainha”. Fonte [2].

Desde 1994, o medicamento é o principal agente causador de intoxicação em seres humanos no Brasil, segundo estatísticas do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (SINITOX) [3].

O estudo intitulado Characterization of the profile of drug intoxications by self-medication in Brazil, from 2010 to 2017 (Caracterização do perfil das intoxicações medicamentosas por automedicação no Brasil, de 2010 a 2017)[4] levantou, através dos dados fornecidos pelo DataSUS, os casos de intoxicação no Brasil entre 2010 e 2017. Foram notificados 565.271 casos e, destes, 298.976 tiveram o medicamento como agente tóxico mais frequente, correspondendo a 52,8% do total das ocorrências. Os medicamentos intoxicaram mais do que drogas de abuso, agrotóxicos agrícolas e raticidas, responsáveis por 88.686 (15,6%), 37.950 (6,71%), 34.027 (6,01%) dos casos respectivamente.

Figura 3. Aumento anual de notificações acerca de intoxicação atreladas aos medicamentos. Fonte [4].

Diante desse cenário faz-se necessário uma conscientização maior acerca dos perigos envolvendo os medicamentos, além de um controle mais rigoroso pelos orgãos governamentais. Nesta publicação, vamos entender melhor a ação no nosso corpo de algumas categorias de medicamentos populares e por que devemos nos preocupar.

Medicamentos Populares

Segundo uma pesquisa feita pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF) [5], a automedicação é um hábito comum a 77% dos brasileiros, além de que familiares, amigos e vizinhos são os principais influenciadores na escolha dos medicamentos usados sem prescrição (25%).

O farmacêutico Tarcísio Palhano, em entrevista da Globo, ressalta tal contexto alarmante na seguinte fala [5]:

“Qualquer dorzinha, qualquer sintoma, qualquer sinal, a pessoa já se automedica. Isso pode, inclusive, dificultar o diagnóstico de uma doença mais grave.”

Segundo o Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade (ICTQ), os medicamentos mais consumidos por conta própria pelos brasileiros são:

Figura 4. Medicamentos mais consumidos pelos brasileiros. Fonte [6].

Vamos entender então como algumas dessas classes terapêuticas agem em nosso corpo e quais seriam as reações adversas após o consumo irresponsável.

Analgésicos

Resumidamente, o analgésico diminui ou interrompe as vias de transmissão nervosa, reduzindo a percepção de dor.

Quando usado em excesso pode gerar desde efeitos transitórios simples, como um quadro de azia ou de mal-estar abdominal, até quadros graves, como insuficiência renal (doença em que os rins perdem a capacidade de remover e equilibrar fluidos no organismo), levando o indivíduo a fazer hemodiálises, segundo o neurologista João José Carvalho [7].

Anti-inflamatórios

Os anti-inflamatórios são capazes de impedir ou amenizar uma reação de inflamação (resposta do nosso sistema imunológico a alguma infecção ou lesão nos tecidos do organismo). A consequência do mecanismo de ação desses fármacos é a redução da vasodilatação e do edema (inchaço) da região inflamada [8].

No geral, o uso abusivo de anti-inflamatórios pode estar associado a problemas como gastrite, úlceras, insuficiência renal e hepatite medicamentosa [9].

Relaxantes Musculares

Esses medicamentos têm o propósito de aliviar em pouco tempo as dores nos músculos perante as mais variadas causas, como torções ou doenças. O relaxante faz com que os músculos se tornem menos tensos ou rígidos, reduzindo as sensações de dor e desconforto.

Sob o uso indiscriminado, o medicamento tem como efeito adverso mais importante as alterações neurológicas, que incluem confusão mental, alterações de concentração, agitação e até mesmo mal-estar e coma. Secura da boca, alterações visuais e anormalidades do batimento cardíaco também são consequências do uso indevido dessas medicações [10].

Consequências danosas à saúde

Para fins de resumo gráfico, a seguir são apresentadas as principais consequências danosas à saúde no contexto da automedicação, o que ressalta ainda mais por que devemos nos preocupar e se conscientizar sobre o tema.

Figura 5. Os perigos da automedicação. Fonte [11].

Conclusão

A partir desse texto podemos entender um pouco os perigos da automedicação e a necessidade de uma maior conscientização sobre o tema.

Diariamente os meios de comunicação divulgam propagandas desenfreadas e massivas sem uma política de regularização efetiva, as quais só recomendam a orientação do profissional de saúde e lerem à bula. Em um país como o Brasil, onde o analfabetismo e o pouco acesso à educação e à informação estão enraizados, o cenário passa a ser extremamente preocupante, pois pode acarretar em consequências gravíssimas ao público leigo. Mais do que isso, o uso irresponsável de medicamentos está presente na maioria da população.

A população precisa ser informada, conhecer os riscos relacionados aos medicamentos e, sobretudo, ter a oferta de um sistema de saúde adequado que leve o paciente a procurar pelo médico e não pelo medicamento.

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Referências

[1] https://www.ufrgs.br/farmacologica/2018/06/24/um-pouco-sobre-a-automedicacao/

[2]https://observatoriodeseries.uol.com.br/netflix/por-que-beth-consegue-ver-o-xadrez-no-teto-no-final-de-o-gambito-da-rainha

[3] https://sinitox.icict.fiocruz.br/dados-nacionais

[4] ANDRADE, S. M. de; CUNHA, M. A.; HOLANDA, E. C.; COUTINHO, G. S. L.; VERDE, R. M. C. L.; OLIVEIRA, E. H. de. Characterization of the profile of drug intoxications by self-medication in Brazil, from 2010 to 2017. Research, Society and Development, [S. l.], v. 9, n. 7, p. e236973952, 2020. DOI: 10.33448/rsd-v9i7.3952. Disponível em: https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/3952. Acesso em: 26 aug. 2021.

[5] https://g1.globo.com/bemestar/noticia/2019/05/13/automedicacao-e-um-habito-comum-a-77percent-dos-brasileiros.ghtml

[6] https://ictq.com.br/pesquisa-do-ictq/871-pesquisa-automedicacao-no-brasil-2018

[7] http://g1.globo.com/jornal-hoje/noticia/2010/07/uso-constante-de-analgesicos-pode-causar-problemas-de-saude.html

[8] https://www.fcf.unicamp.br/pt-br/institucional/noticias/390-como-funcionam-os-anti-inflamatorios

[9] https://hospitalsiriolibanes.org.br/sua-saude/Paginas/tomados-excesso-analgesicos-anti-inflamatorios-podem-trazer-prejuizo-saude.aspx

[10] https://aps.bvs.br/aps/quais-as-complicacoes-do-uso-indiscriminado-de-analgesicos-e-relaxantes-musculares/

[11] https://br.pinterest.com/pin/701154235742682563/

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