Superlotação da emergência em hospitais: problemas e soluções

Como a ocupação da emergência em hospitais afeta o tratamento dos pacientes? Vou responder essa pergunta e explicar algumas intervenções que mitigam esse problema.

Otavio Corrêa
ARGO — Divulgação Científica
5 min readApr 22, 2021

--

Destaques

Altas taxas de ocupação nos Departamentos de Emergência (DEs) de hospitais levam ao aumento da taxa de mortalidade nos pacientes críticos.

A ocupação do DE reflete no período de estadia de pacientes no DE e no tempo de decisão dos profissionais de saúde.

Alocar médicos na triagem, permitir que enfermeiros(as) peçam testes de diagnóstico e implementar “unidades médicas para pacientes agudos” reduzem o tempo de estadia dos pacientes e ocupação dos DEs.

Segundo o American College of Emergency Physicians, em 2008, superlotação do Departamento de Emergência (DE) hospitalar é:

“Quando não há espaço suficiente para atender as necessidade de tempo do próximo paciente que precisa de atendimento de emergência.”

E quais problemas a superlotação dos DEs leva ao paciente e ao atendimento de saúde? Existem soluções que mitigam isso?

Não se esqueça de comentar dúvidas e sugestões na publicação!

Aumento da mortalidade de pacientes críticos

Uma pesquisa¹ foi conduzida com objetivo de relacionar a taxa de mortalidade de pacientes críticos, admitidos no Departamento de Emergência (DE), com a taxa de ocupação do DE (número de pacientes no DE dividido pelo número de camas licenciadas do DE).

Os dados foram coletados de um DE entre 01/01/2009 e 31/12/2010, de que foram selecionados 1846 pacientes críticos (pacientes com pressão sanguínea menor que 90 mmHg, por decisão dos autores), excluindo pacientes com parada cardíaca.

A taxa de ocupação do DE foi dividida 4 quartis. Em outras palavras, os dados ordenados segundo a taxa de mortalidade foram divididos em 4 partes com o mesmo número de amostras. Disso, os autores notaram que, com o aumento da taxa de ocupação, a mortalidade tende também a aumentar, o que varia de diagnóstico para diagnóstico. A relação foi mais acentuada para diagnósticos de infecção, doenças cardiovasculares e trauma:

Figura 1 — Taxa de mortalidade dos pacientes, por quartil de ocupação. A taxa de ocupação de ED foi dividida em quartil 1 (média de 0.94 ± 0.11), quartil 2 (1.17 ± 0.05), quartil 3 (c) e quartil 4 (1.61 ± 0.14). Fonte: [1].

Os autores concluíram que altas taxas de ocupação nos DE levam ao aumento da taxa de mortalidade nos pacientes críticos admitidos no DE, especialmente nas categorias de trauma e infecções.

Aumento da estadia dos pacientes no DE e aumento do tempo de decisão dos profissionais e saúde

Uma segunda pesquisa², conduzida entre 01/07/2011 e 30/06/2012, sugeriu que a ocupação do DE reflete no período de estadia de pacientes e no tempo de decisão dos profissionais.

Nesse estudo foram contabilizados pacientes que se apresentaram em dois DEs (com 80 e 60 camas) durante o turno do dia (7h00 às 15h00), e que não tinham diagnóstico de trauma. Também foram contabilizados 76 médicos que trabalhavam em tempo integral.

Os pacientes foram agrupados em 4 quartis baseados no número total de pacientes no DE no momento da visita. O tempo de decisão dos médicos foi definido como o período para se decidir o nível de cuidado que o paciente deve receber após sair do DE (se o paciente será enviado para casa, internado no hospital, etc). Já o período de estadia era o intervalo entre a chegada ao DE e a saída do DE. Com isso, os autores chegaram às tendências:

Figura 2 — Eficiência clínica (horas), por quartil de ocupação. Eficiência clínica do DE dividida em quartil 1 (<24 paciente no DE), quartil 2 (24–39 pacientes no DE), quartil 3 (39–62 paciente no DE) e quartil 4 (>62 pacientes no DE). Fonte: [2].

Entre outras coisas, os pesquisadores relataram que, em alta ocupação, o tempo de decisão de médicos do DE aumenta de 18 minutos (ou 19%) e o período de estadia dos pacientes aumenta de 66 minutos (ou 29%), em relação à baixa ocupação.

Intervenções

Por fim, podem ser levantadas algumas intervenções que reduzem o tempo de estadia dos pacientes e ocupação dos DEs. Para isso, foi formulada uma visão geral³ dos artigos de revisão sistemática — artigos que reúnem e avaliam estudos semelhantes para, se possível, extrair conclusões e resultados integrados — que tratavam de intervenções para superlotação dos DEs.

Foram selecionadas revisões sistemáticas que propunham intervenções restritas apenas ao DE (excluindo intervenções na gestão do hospital, por exemplo). Essas, por sua vez, foram classificadas segundo a avaliação AMSTAR 2 — uma classificação de revisões sistemáticas de acordo com a qualidade da metodologia de seleção de artigos utilizada — que regulou o impacto do artigo nas conclusões finais. As principais intervenções foram:

Alocar médicos(as) na triagem

Sugerido por 4 revisões de qualidade moderada que incluíram, todas, grupos de controle. Nessas revisões, o médico(a) atuava sozinho ou junto a um(a) enfermeiro(a), e o período de estadia do paciente, além do período de espera por paciente por médico(a), diminuiu na maioria dos casos.

Permitir que enfermeiros(as) peçam testes de diagnóstico

Antes mesmo que um médico(a) veja o paciente, enfermeiros(as) podem pedir testes para verificar ou não a ocorrência de uma doença. Isso foi sugerido uma revisão de qualidade moderada e outra de qualidade baixa.

Implementar “unidades médicas para pacientes agudos”

Pacientes agudos têm condições clínicas agudas mas não correm risco de morte imediato, apesar de necessitarem de acompanhamento enquanto recebem cuidados no DE. Isso foi sugerido por 5 revisões, uma de alta qualidade e 4 de qualidade baixa ou criticamente baixa.

Conclusão

Mesmo abaixo do limite, taxas de ocupação elevadas nos DEs têm efeitos negativos para os pacientes. São eles: o aumento da taxa de mortalidade de pacientes críticos, o aumento do tempo de estadia de pacientes no DE e o aumento do tempo de decisão dos profissionais da saúde. Apesar disso, algumas intervenções, como alocar médicos na triagem, permitir que enfermeiros(as) peçam testes de diagnóstico e implementar “unidades médicas para pacientes agudos”, obtiveram bons resultados na redução do tempo de estadia dos pacientes nos DEs e redução da ocupação dos DE.

--

--