A importância do sono: você está dormindo certo?

Saiba como o sono funciona, os seus benefícios e como dormir melhor.

Julio Min
ARGO — Divulgação Científica
6 min readJan 23, 2021

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Foto de NEOSiAM 2020 no Pexels

Introdução

Quando se fala em saúde, normalmente pensamos em três pilares: alimentação, exercício físico e sono. Existem hoje muitos programas educativos para ensinar como comer melhor e também há academias a cada esquina, mas já pensou que quase ninguém fala sobre a importância do sono ou como podemos dormir melhor? Vamos tentar então elucidar como o sono funciona, o que a falta dele pode acarretar, os benefícios de dormir bem e, por fim, dicas para dormir melhor.

Sono: um mistério da humanidade

Há várias tentativas de desvendar a função do sono, que vão desde a conservação de energia à teoria psicanalítica de um estado não consciente em que realizamos os desejos reprimidos. De qualquer forma, vamos abordar aqui o que a ciência mostra sobre o funcionamento do sono.

O sono pode ser dividido em duas principais fases (ciclos de aproximadamente 90 minutos):

Sono REM: nessa fase a atividade cerebral é semelhante ao indivíduo acordado (ondas cerebrais caóticas), porém sem movimentos musculares. A principal função é estabelecer conexões entre diferentes partes do cérebro. É nesse estágio em que normalmente sonhamos.

Sono NREM: nesse estágio as atividades cerebrais são mais organizadas e ocorre a consolidação da memória de curto prazo (hipocampo) para o longo prazo (córtex).

Como o sono é gerado

Foto de https://www.shortform.com/summary/why-we-sleep-summary-matthew-walker

Durante o dia, há dois mecanismos que funcionam para gerar a vontade de dormir à noite (espero que essa vontade venha até você todos os dias):

Ritmo circadiano (circadian rhythm): comporta-se como ondas, aumentando de manhã e reduzindo no início da tarde. Está relacionado ao estado de vigília.

Pressão do sono (Sleep pressure): representado pela adenosina, uma substância que se acumula ao longo do dia no cérebro para gerar sono e a sua concentração diminui ao dormirmos.

Sistemas não acoplados, mas normalmente alinhados

Foto de https://www.shortform.com/summary/why-we-sleep-summary-matthew-walker

O sistema do ritmo circadiano e da pressão do sono normalmente funcionam juntos para gerar sono no indivíduo, mas são independentes e podem ser desacoplados em determinadas situações:

Quando madrugamos a noite sem dormir, a pressão do sono continua aumentando, mas o ritmo circadiano sobe e desce independente se o o indivíduo dormiu. Assim, sentimos inicialmente uma forte vontade de dormir lá pelas 3 horas da madrugada, mas se persistimos acordado, em meio dia sentiremos menos sono que antes. Por que isso acontece? Justamente devido ao desalinhamento do ritmo circadiano e pressão do sono. Incrível, não?

O mal do século: sono insuficiente

Com o advento da tecnologia, migramos o escritório para a palma das nossas mãos: o celular. A carga horária de trabalho está cada vez maior e “compensamos” ao dormirmos menos. Como os malefícios da privação do sono aparecem em longo prazo, seus efeitos normalmente são ignorados, e o pior: quem está privado de sono não sabe quando está privado de sono, já que se acostuma com o estado crônico de privação.

Os malefícios já são bastante evidentes na nossa população: aumento da prevalência de câncer, Alzheimer, diabetes, doenças cardiovasculares, enfermidades psiquiátricas… Se não dormimos de 7 a 9 horas por noite, há aumento da concentração de cortisol (hormônio do estresse), ocasionando o descontrole emocional. Além disso, a privação de sono ocasiona a redução da imunidade, em que há maior atividade nervosa simpática para sinalizar estado de perigo, levando à constante inflamação do sistema imune.

A obesidade é um dos principais pontos a se destacar como efeito da falta de sono, sendo considerado hoje pela Organização Mundial da Saúde como pandemia do século XXI. Muitos colocam a culpa nos alimentos industrializados, que em parte é verdade, mas poucos apontam o dedo para a falta de sono. Sabe-se que quanto menos se dorme, maior consumo de caloria por impulso e menor o seu gasto, já que afeta o córtex pré-frontal, responsável pelo poder de julgamento e tomada de decisões controladas. Além disso, fisiologicamente mais gordura é preservada e mais massa muscular é controlada.

Os inúmeros benefícios que boa noite de sono pode trazer

As vantagens já são bastante conhecidas ao dormirmos adequadamente: melhora da tomada de decisão lógica, do controle do humor, da regulação da insulina e glicose, da preservação da microbiota intestinal e do sistema cardiovascular.

Nesse sentido, durante o sono NREM, ocorre a remoção das substâncias indesejadas no cérebro pelo fluido cerebroespinhal, além da consolidação da memória. Já o sono REM aumenta a conectividade neural, induzindo conexões de ideias para formar novos conhecimentos.

“ Dormir sobre um problema” — velho ditado que mostra a importância do sono para formação de novas ideias.

Para os estudantes, dormir é uma etapa fundamental para o aprendizado. O sono na noite anterior aos estudos ajuda a concentrar e memorizar melhor, já o sono posterior ao aprendizado também é muito relevante, já que consolida a memória de curto prazo para a memória definitiva. Assim, pensando em longo prazo, seria então melhor virar a noite estudando para esquecer no dia seguinte ou dormir um pouco mais e consolidar o que aprendeu para utilizar posteriormente? A resposta agora é óbvia.

Como conseguir então dormir melhor?

Para saber se você vive em um estado crônico de privação de sono, pergunte-se: 1) Consegue dormir de novo às 11 horas da manhã?, 2) Se não tomar café antes de meio dia, tem sono? e 3) Não consegue acordar sem despertador? Se a resposta for sim para as três perguntas, você precisa melhorar o seu sono.

Antes de falar sobre as dicas para uma boa noite de sono, cabe ressaltar alguns métodos que não são recomendados:

  • Dormir mais no final de semana: apesar de haver uma sensação de melhora ao “recuperar” o sono perdido ao longo da semana, os prejuízos são acumulados e fazem mal ao corpo. Assim, tente dormir regularmente todos os dias, inclusive nos finais de semana.
  • Tomar comprimidos para dormir: criam uma falsa sensação de sono, já que o sono não atinge a profundidade necessária para gerar os benefícios já citados.
  • Tomar café depois das quatro da tarde: a cafeína suprime o acúmulo de adenosina e tem a meia vida (queda da concentração pela metade) de 5 a 7 horas. Dessa forma, pode inibir a pressão do sono durante a noite.
  • Uso de lâmpadas de LED no quarto: a luz azul emitida pelas lâmpadas de LED inibem a produção de melatonina, ocasionando menor sensação de cansaço. Procure usar luminárias amarelas perto da cama.
  • Temperatura excessivamente quente no quarto: normalmente o corpo se esfria ao longo da noite, assim como o ambiente. A temperatura ideal para maioria das pessoas é de 18,3˚C. Assim, é bom aquecer levemente pés e mãos para afluir o sangue e retirar o calor do centro do corpo, que pode ser realizado com um banho quente.

A seguir, seguem algumas dicas da Associação Mundial de Medicina do Sono:

Reflexão

“Quando eu morrer vou ter bastante tempo para dormir” — frase popular

Muitas vezes pensamos em dormir menos para sermos mais produtivos ou reclamamos que não temos tempo para dormir, já que somos sobrecarregados de trabalho. E se pensarmos o contrário? Só somos sobrecarregados de trabalho porque não conseguimos nos concentrar o suficiente (por falta de sono) para realizar a tarefa em menos tempo. Pensando em longo prazo, para que precisamos sacrificar as nossas preciosas horas de sono, o que resulta em problemas de saúde, se podemos dormir mais e ter uma vida mais longa para trabalharmos no que quisermos, de forma mais saudável? Fica aí a reflexão.

Bibliografia

  • Livro “Por que nos Dormimos” — Matthew Walker

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