“BRANCO SAI, PRETO FICA”

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3 min readNov 26, 2021

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uma mistura de documentário e ficção sobre a violência policial movida pelo racismo

Capa do documentário “Branco sai, preto fica”. Disponível em https://www.adorocinema.com/filmes/filme-228798/

“Branco sai, preto fica” é uma mistura de documentário e ficção com direção e roteiro de Adirley Queirós. É a história de dois homens negros, Marquim e Sartana, feridos durante uma ação policial em um baile na região de Ceilândia, em Brasília.

Ontem, 24 de novembro de 2021, um jovem negro foi morto na rua onde resido, entregador e morador do Morro do Palácio, em Niterói. Foram horas de protesto e gritos. Elias de Lima Oliveira. Seu irmão disse que Elias foi morto, arrastado e jogado como cachorro.

No filme, a ficção se apresenta como uma viagem no tempo, onde um viajante busca a justiça que no presente se mostra improvável. Imagens de trilhos de um trem me levantam a seguinte questão: para onde estamos indo? Em uma tentativa de contato, do futuro com o presente, com esse agente viajante, intitulado como terceirizado do Estado Brasileiro do ano de 2073, a seguinte mensagem de uma mulher é ouvida:

“As coisas aqui mudaram muito. A vanguarda cristã assumiu o poder. O clima tá tenso. Eu tenho outra notícia pra te dar. Seu teletransporte foi dado como perdido. Provavelmente você não consiga autorização para voltar. Mas você pode ficar tranquilo que a gente vai dar um jeito de ir aí te buscar. Você ainda se lembra da sua missão? Encontrou o Sartana? Você precisa encontrá-lo pra que a gente possa mover uma ação contra o Estado por crimes cometidos contra populações negras e marginalizadas.”

No inicio do documentário, Marquim narra em forma de rap o dia em que foi ferido:

“Domingo, 7 horas da noite. Já tô com meu pisante. Minha beca. Tô em frente de casa. Tô indo em direção ao centro da Ceilândia. Ah, vou passar aqui na casa do Carlinho. ‘E aí Carlinho, beleza? E aí, vai pro baile?’ Já tô em frente a feira. Já dá pra ouvir as pancadas daqui. Ó os graves. Hoje o Rubão tá botando pra quebrar. (…) Tá lotada a bilheteria. Vou ver se eu vejo alguém ali pra comprar ingresso pra mim. Ó, tá acontecendo alguma coisa. Ô, chama as mina pra cá. Tá acontecendo alguma coisa ali na portaria. O que é aquilo, véi? Vixe, é os cana. Ih, os Pé de Bota tá na área. Vixe, cachorro e o caramba, Véi. Humm… spray de pimenta. Fora. Pô, baixa a cabeça, baixa a cabeça, cara. Pra ver se.. porra! Ah não, vão parar o baile, véi. (…) ‘Bora bora bora. Puta prum lado, viado pro outro. Bora porra. Anda porra. Tá surdo negão? Encosta ali. Tô falando que branco lá fora e preto aqui dentro. BRANCO SAI E PRETO FICA, PORRA!’”

Para qual ano podemos ir para que a realidade seja outra? Ainda escuto os gritos que tanto escutei ontem.

Boné de Elias nas mãos do irmão dele — Foto: Arquivo Pessoal. Disponível em: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2021/11/24/morte-entregador-morro-do-palacio.ghtml
  • Escrito por Cíntia Ferreira, graduanda em Arte Visuais pela UERJ, pós-graduada em Fotografia e Imagem pela IUPERJ-UCAM e membro da Sociedade Fluminense de Fotografia. Também criadora do blog https://medium.com/@amulherdepreto

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