A importância das mulheres na luta contra o aquecimento global [Continuação]

“Uma criança, um professor, um livro e uma caneta podem mudar o mundo.”

doebem
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7 min readJan 25, 2018

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Em nosso primeiro post, falamos sobre o impacto do planejamento familiar na luta contra o aquecimento global. Nesta segunda mensagem, trazemos novamente a tradução de um excerto do livro Drawdown — The most comprehensive plan ever proposed to reverse global warming — Edited by Paul Hawken (O plano mais abrangente proposto para reverter o aquecimento global) com o argumento do autor sobre o impacto da educação de mulheres e garotas em países em desenvolvimento no combate ao aquecimento global.

Educação de Garotas

A educação de garotas acabará tendo um efeito dramático no aquecimento global. Mulheres com mais anos de escolaridade administram ativamente sua saúde reprodutiva, têm menos crianças, e essas crianças têm mais saúde. Em 2011, a revista Science publicou uma análise demográfica do impacto da educação de garotas no crescimento populacional. Ela detalha um cenário de “via rápida”, baseado na escalada da Coréia do Sul de um dos menos para um dos mais educados países do mundo. Se todas as nações adotassem uma taxa similar e alcançassem 100% de matrículas de garotas no ensino primário e secundário, em 2050 teríamos 843 milhões de pessoas a menos no mundo (ao comprar com a população que teríamos ao manter as atuais taxas de matrícula). De acordo com a Brookings Institution, “a diferença entre uma mulher sem nenhum ano de escolaridade e uma com doze anos de escolaridade é de 4 a 5 crianças por mulher. E é precisamente nessas áreas do mundo onde garotas estão tendo dificuldade em conseguir acesso à educação que o crescimento populacional é mais rápido”.

Nos países mais pobres, a emissão de gases de efeito estufa é baixa. Pessoas não têm energia suficiente para higienizar adequadamente sua água, ler ou estudar à noite, ou energizar seus pequenos negócios. No mundo, há 1,1 bilhão de pessoas que não tem nenhum tipo de energia elétrica. De 0,1 tonelada de dióxido de carbono por pessoa em Madagascar a 1,8 toneladas na Índia, as emissões per-capita nos países de menor renda são uma fração da taxa americana de 18 toneladas por pessoa/ano. Apesar disso, mudanças na fertilidade desses países teriam múltiplos benefícios em virtualmente todos os níveis da sociedade global.

O Quênia teve ganhos significativos na educação, com mais de 80% de todos garotos e garotas matriculados na educação primária. Na educação secundária, a taxa de matrícula caiu para 50% para ambos os sexos. Pobreza é a principal causa da baixa taxa de matrícula e, dadas as atuais normas socioeconômicas, garotos recebem prioridade no ensino superior quando há alguma restrição financeira.

A ganhadora do prêmio Nobel e ativista pela educação de garotas, Malala Yousafzai, ficou famosa por ter dito, “uma criança, um professor, um livro e uma caneta podem mudar o mundo”. Um enorme corpo de evidências apoia sua convicção: primeiramente, crianças educadas recebem salários maiores e têm maior mobilidade social, contribuindo para o crescimento econômico. As taxas de mortalidade materna caem assim como a de seus bebês. Elas são menos sujeitas a casarem quando crianças ou contra sua vontade. Elas têm menor incidência de AIDS e Malária — efeito conhecido como “vacina social”. Suas terras agrícolas são mais produtivas e suas famílias melhor alimentadas. Elas são mais empoderadas em seus lares, no trabalho e na sociedade. Um direito intrínseco, a educação proporciona a fundação para vidas vibrantes de garotas e mulheres, suas famílias e suas comunidades. É a mais poderosa alavanca disponível para romper o ciclo de pobreza inter-geracional, enquanto mitiga emissões de CO2 ao limitar o crescimento populacional. Um estudo econômico de 2010 mostra que investimentos em escolarização de garotas são “altamente custo-competitivos com quase todas as opções existentes de abatimento de emissões de carbono” — talvez apenas US$ 10 por tonelada de dióxido de carbono.

A educação também proporciona resiliência quanto aos impactos da mudança climática — algo que o mundo irá necessitar conforme a temperatura aumentar. Nos países de baixa renda, há uma forte ligação entre as mulheres e a vida comunitária e familiar. Mulheres, geralmente e cada vez mais, desempenham o papel de administradoras da alimentação, solo, árvores e água. Conforme garotas educadas se tornam mulheres educadas, elas podem fundir o conhecimento tradicional herdado com as novas informações acessíveis por meio da palavra escrita. Conforme os ciclos de mudança que estão por vir se concretizem — novas doenças danificando árvores frutíferas, alteração na composição do solo de jardins e dos tempos de semeadura —, mulheres educadas estarão no comando, buscando conhecer as múltiplas maneiras de observar, entender, reavaliar e agir para sustentar a si mesmas e aqueles que delas dependem.

Educação também equipa as mulheres para enfrentarem as mais drásticas mudanças climáticas. Um estudo de 2013 concluiu que educar garotas “é, isoladamente, o fator econômico e social mais importante associado à redução de vulnerabilidade a desastres naturais”. O mais importante é a conclusão a que chegam examinando as experiências de 125 países desde 1980 e ecoam em diversas outras análises. Garotas e mulheres educadas têm uma melhor capacidade para lidar com choques advindos de desastres naturais e eventos ambientais extremos e são menos prováveis de se acidentarem, serem deslocadas ou mortas em tais desastres. Essa redução de vulnerabilidade também se estende às suas crianças, famílias e aos mais idosos.

Malala Yousafzai, nascida no Vale Swat, no norte do Paquistão, é uma ativista pela educação de garotas. Educada principalmente por seu pai, Yousafzai foi reconhecida muito jovem pela comunidade global pelo seu comprometimento com os direitos à educação sob o espectro da crescente influência do Talibã em Swat. Em outubro de 2012, um atirador do Talibã tentou assassinar Yousafzai enquanto ela ia de ônibus para casa após fazer uma prova. Malala é a mais jovem ganhadora de um prêmio Nobel e continua seus estudos, além de seu trabalho por meio da Fundação Malala, que objetiva garantir 12 anos de educação de qualidade e segurança para garotas ao redor do mundo.

Nos últimos 25 anos, a comunidade global aprendeu muito sobre a educação de garotas. Muitos desafios dificultam as garotas de obterem o direito à educação e ainda, ao redor do mundo, elas têm se empenhado para conseguir um lugar na sala de aula. Barreiras econômicas incluem a falta de recursos monetários de suas famílias para o pagamento de uniformes e mensalidades escolares, assim como o benefício mais imediato de ter as garotas buscando água ou lenha, trabalhando em mercados ou no cultivo da terra. Barreiras culturais englobam crenças tradicionais de que garotas deveriam cuidar do lar ao invés de aprender a ler e escrever, deveriam se casar cedo e, quando os recursos estão curtos, serem preteridas aos garotos no recebimento de educação. A segurança também é uma barreira. Escolas que são distantes de casa colocam as garotas em risco de sofrerem violência baseada em seu gênero em seu caminho de ida e volta, para não mencionar os riscos e desconfortos dentro da própria escola. Deficiência, gravidez, parto e a mutilação genital feminina também configuram obstáculos.

As barreiras são reais, mas também são as soluções. As abordagens mais efetivas combatem o problema de acesso (escolas a preços acessíveis, próximas e apropriadas para as garotas) e qualidade (bons professores e bons resultados de aprendizado). Mobilizar comunidades para apoiar e sustentar o progresso na educação de garotas é um acelerador poderoso. O livro enciclopédico “O que funciona na Educação de Garotas" (What Works in Girls’ Education) mapeia sete áreas de intervenções interconectadas:

  1. Escolas com preços acessíveis. Por exemplo, fornecer às famílias uma pequena remuneração para manter as garotas na escola.
  2. Ajudar garotas a superar as barreiras de saúde. Por exemplo, fornecendo tratamento contra verminoses.
  3. Reduzir o tempo e a distância para chegar à escola. Por exemplo, fornecer bicicletas às garotas.
  4. Tornar as escolas mais amigáveis às garotas. Por exemplo, oferecendo creches às mães jovens.
  5. Melhorar a qualidade das escolas. Por exemplo, investir em mais e melhores professores.
  6. Aumentar o engajamento da comunidade. Por exemplo, treinar ativistas comunitários pela educação.
  7. Sustentar a educação de garotas durante emergências. Por exemplo, estabelecendo escolas em campos de refugiados.

Hoje, 62 milhões de garotas são negadas o direito de ir à escola. A situação é mais triste no ensino secundário. No sudeste asiático, menos da metade das garotas — 16,3 milhões — estão matriculadas no ensino secundário. Na África Subsaariana, menos de 1 em 3 garotas estão no ensino secundário e, apesar de 75% de todas as garotas iniciarem os estudos, apenas 8% terminam o ensino secundário. Atualmente, a ajuda internacional para projetos de educação é de aproximadamente US$ 13 bilhões anuais. Dada a relação entre a educação de garotas e o aquecimento global, fundos para a mitigação e adaptação ao novo clima poderiam permitir ao mundo escalar as soluções rapidamente. Poderia ser um poderoso casamento entre a necessidade de fundos para a educação e a necessidade mundial por soluções climáticas comprovadas. Ademais, sincronizar o investimento na educação de garotas com aqueles relativos ao planejamento familiar seriam complementares e se reforçariam mutuamente. A educação está baseada na crença de que cada vida borbulha com um potencial inato. Quando pensamos em aquecimento global, nutrir essa promessa para cada garota pode dar outra forma ao futuro de todos.

Análise de Impacto

Duas soluções influenciam o tamanho das famílias e o crescimento populacional: educar crianças e o planejamento familiar. Dado que a dinâmica exata entre essas duas soluções é impossível de ser determinada, nosso modelo aloca 50% do potencial total de impacto para cada solução. Supomos que esses impactos resultam de 13 anos de escolaridade, incluindo o ensino primário e secundário. De acordo com a UNESCO, fechando a lacuna anual de US$ 39 bilhões, a educação universal em países de baixa e média renda pode ser alcançado. Isso resultaria em 59,6 gigatoneladas de redução de emissões até 2050. O retorno econômico de um investimento desses seria incalculável.

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Este post foi traduzido do livro “Drawdown — The most comprehensive plan ever proposed to reverse global warming” por Fernando Moreno e revisado por Guilherme Samora e Elisa Mansur.

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