Como criar produtos incríveis para pais e mães de cachorro — parte 1

Dudu Magalhães
DogHero Brasil
Published in
7 min readNov 30, 2017

No primeiro artigo que abriu a série em que conto mais sobre o meu trabalho na DogHero, falei sobre como o propósito da empresa impactou na minha vida. Agora, vou mostrar como pensamos no melhor produto para nossos Anfitriões e para os pais e mães de cachorro que usam o serviço.

Como já era cliente, achei que a minha curva de aprendizado nos primeiros dias de DogHero seria tranquila. Afinal, eu conhecia razoavelmente o negócio e as principais métricas do produto.

Obviamente, estava COMPLETAMENTE equivocado.

Logo no meu primeiro dia, reafirmei uma tese que defendo desde os passos iniciais da minha carreira:

Você não é o seu usuário!

Excelente sketchnote criado pelo Thiago Esser que explica que, ao projetar um produto digital, você não é seu usuário.

Por mais que eu tenha usado a DogHero como cliente, estudado as dinâmicas desse tipo de marketplace e conversado com alguns Anfitriões durante o processo seletivo, as características do negócio são complexas. Além disso, o padrão de experiência que eu tive como cliente não era o mesmo da maioria dos usuários da plataforma.

Para inciar o processo de empatia com nossos usuários, começamos a usar um método de Product Discovery que ajudei a criar lá em 2009, quando conceitos como Design Thinking, Lean Startup e Design Sprint eram bem incipientes. Naquela época, eu ficava desconfortável em debater soluções para um produto baseadas em strong feelings ao invés da análise de métricas ou pesquisas. Era comum ouvir a frase:

Eu, como usuário, não acho isso adequado.

A nossa experiência deve ser levada em conta, mas ela DEFINITIVAMENTE não é determinante. É preciso ter cuidado para não cair no Product Designer Paradox, brilhantemente exemplificado pela tira abaixo.

Sonhamos com um foguete cheio de funcionalidades, nos contentamos em lançar 20% disso, mas o que o usuário precisava era apenas uma pequena bicicleta e uma rampa.

Perceba que o produto mais complexo ou com mais features nem sempre é o que as pessoas precisam. Quem nunca caiu nessa armadilha? É fundamental definir claramente o problema que você quer resolver e entender com as pessoas que vão usar o seu produto qual a melhor forma de solucionar isso.

A partir daí, surgiu o Ice-Cream Method, um framework que auxilia na descoberta do que deve ser o produto e o quê as pessoas que vão usá-lo de fato precisam.

Ice-Cream Method, popularmente conhecido como "sorvetinho".

Aqui na DogHero utilizamos bastante esse método e, a cada iteração, revisamos sua aplicação e resultados. Ele pode ser usado tanto na exploração de um produto novo ou para incrementar uma funcionalidade que já está rodando.

O "sorvetinho" é composto por cinco etapas. Juntas, podem durar poucos dias ou algumas semanas (dependendo da complexidade da análise):

  1. ENTENDIMENTO: é nesta etapa que exploramos o problema que queremos resolver. É importante entender os principais objetivos da companhia, o quê os players mais relevantes do mercado estão fazendo e quais são as dores e desejos de anfitriões, clientes e potenciais usuários.
  2. DEFINIÇÃO: baseado nos aprendizados da etapa anterior, vamos definir as hipóteses de como e o quê deve ser o produto que estamos criando.
  3. VALIDAÇÃO: é a hora de colocar à prova as hipóteses levantadas na etapa de definição. Através de diversas técnicas, consultamos grupos de potenciais usuários e validamos todas as dúvidas e problemas que aprendemos até aqui.
  4. APLICAÇÃO: momento em que consolidamos todo o aprendizado das etapas anteriores. O produto ganha vida e fica disponível para os usuários finais.
  5. APRENDIZADO, MENSURAÇÃO e ITERAÇÃO: colocar o produto no ar não significa que o trabalho está finalizado. É agora que a coisa começa de fato. Acompanhamos as métricas, identificamos se os resultados estão de acordo com o que a gente esperava e, acima de tudo, iteramos com nossos usuários.

Nesse artigo, vamos focar na etapa de ENTENDIMENTO do problema que vamos resolver (as três bolinhas do "sorvete"). Esse momento do processo é dividido em três fases:

1.1 Entrevistas internas

Essa é a hora em que entendemos qual a percepção da DogHero sobre o produto que estamos criando. São conversas com pessoas do time em que coletamos expectativas e sugestões sobre o assunto que está sendo analisado.

Antes de cada conversa, procuro montar um pequeno roteiro sobre o que quero aprender com a pessoa que vou conversar. Além disso, tento deixá-la a par do assunto antes do bate-papo, para que ela possa se preparar e ajudar com críticas e sugestões.

Não converse apenas com os stakeholders. Geralmente, busco insights também em entrevistas com pessoas de todos os times da empresa, como Marketing, Tecnologia e, especialmente, Customer Experience, Hosts e Trust & Safety. Essas são as pessoas que lidam diariamente com problemas dos nossos clientes e Anfitriões e sabem identificar os seus principais anseios.

Não encare as questões levantadas nas conversas com seus superiores como ordens. Conflite as hipóteses deles com as ações tomadas pelos players de mercado, com a opinião de outros colegas seus e, sobretudo, com o que você vai ouvir dos seus usuários.

1.2 Pesquisa de mercado

Aqui na DogHero, diariamente olhamos para o mercado, tentando entender o contexto em que estamos inseridos e quais movimentos estão sendo feitos pelos principais players.

Escolha bem quais competidores serão analisados. No nosso caso, não olhamos apenas para companhias que atuam no mesmo mercado que a gente, mas estudamos outros marketplaces que utilizam dinâmicas parecidas com as nossas (falo, por exemplo, de Airbnb, Uber, Thumbtack, Turo e Wyzant).

Para ter esse overview do mercado, utilizo o App Annie, ferramenta que mostra a performance dos aplicativos que estão na Google Play e App Store. Lá, consigo ver quantidade de downloads, estimativa de receita e números de retenção. Com isso, é possível identificar empresas que podem ser referência para a análise que estou fazendo.

Infográfico que explica o modelo que utilizamos para definição dos players que iremos analisar.

Outra iniciativa dessa etapa do processo é ler os reviews que clientes dessas empresas escreveram sobre a experiência de usar seus aplicativos. Nada melhor do que ouvir as pessoas que utilizam um produto para aprender sobre seus pontos fortes e fracos. No próprio App Annie você consegue ler essas avaliações, com a vantagem de filtrar por região, versão ou período.

1.3 Entrevistas externas

É quando você conversa com pessoas que já usam o seu produto ou ainda nem conhecem o que você faz. O aprendizado desta etapa é riquíssimo em todos os aspectos.

Saída de campo realizada em um shopping de São Paulo.

Uma das práticas que utilizamos são as Saídas de campo. Estamos baseados em São Paulo, bem próximos do Parque do Ibirapuera. Lá, existe um cachorródromo em que pais e mães de cães levam seus pequenos para se divertir.

Por diversas vezes fomos até esse local para conversar com essas pessoas e observar seus comportamentos. Também vamos a alguns shoppings em que existem pet shops que conseguimos autorização para conversar com os clientes desses locais.

Lembre que nessas conversas você vai ter pouco tempo para falar com as pessoas. Crie um roteiro que oriente esses bate-papos e que ajude na exploração dos problemas. Aproveite cada segundo disponível, seja rápido e vá direto ao ponto. Uma dica valiosa: aborde essas pessoas em momentos casuais. Evite falar com elas quando estão se deslocando de um ponto a outro. A probabilidade delas reservarem uns minutos para falar com você é bem menor.

Enquete feita por uma das nossas Anfitriãs no grupo do Facebook.

Também criamos algumas estratégias para ficar próximos dos nossos Anfitriões. A que tem proporcionado melhores resultados é o grupo de Heróis da DogHero no Facebook. Nessa comunidade, além de comunicar melhorias na plataforma, criamos enquetes para validar hipóteses ou entender mais profundamente um problema. Esse grupo funciona tão bem que os próprios Anfitriões criam enquetes e pedem sugestões aos colegas sobre funcionalidades para a plataforma.

Outra iniciativa que usamos tanto com Anfitriões como clientes são os questionários online. Recrutamos da nossa base os usuários que tem mais possibilidade de estar enfrentando o problema que queremos entender e enviamos uma pesquisa por e-mail para eles.

Tenha em mente que você não vai questionar as pessoas sobre o quê elas querem que você inclua no seu produto. Explore o problema que elas enfrentam e como isso dificulta a vida delas. Seja bastante impessoal, crie empatia com quem vai responder o questionário. Torne o processo prazeroso e que não tome muito tempo.

Evite criar perguntas em que as respostas sejam "sim" ou "não". Você pode influenciar as pessoas a responder o que você quer, perdendo uma oportunidade preciosa de aprendizado. Gaste um bom tempo planejando o que você vai questionar e quais as ações você vai tomar com base nas respostas dos seus usuários.

Espero que esse processo possa ajudar no seu dia-a-dia. No próximo artigo, vou tratar das etapas de DEFINIÇÃO e VALIDAÇÃO. Como criar e validar hipóteses que vão resolver os problemas dos seus usuários.

Até lá! 🐶

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Dudu Magalhães
DogHero Brasil

Group Product Manager @RDStation | Expert & Mentor @SomosTera