A euforia e o vazio de morar na rua
Usuários do Albergue Municipal de São Leopoldo relatam histórias de superação após anos de dependência química
Por Paola Guimarães
“O engano dessa sociedade medíocre é achar que a gente está na rua pelo simples fato de achar bonito estar todo mulambento, às vezes fedendo, pedindo um troco para comer ou até mesmo, sim, para sustentar os nossos vícios”. Essa foi uma das frases de um dos usuários do Albergue Municipal de São Leopoldo quando questionado sobre as suas experiências dentro e fora da rua.
Michel tinha tudo: casa, carro, esposa e filhos, um bom trabalho a partir do qual podia sustentar a família e uma casa para morar. Natural de Porto Alegre, mas morador de São Leopoldo há muito tempo, era usuário de maconha, cocaína e álcool.
Sua vida desmoronou quando se mudou para Santa Catarina com a família e começou a trabalhar em um bar, conhecendo uma colega que lhe apresentou ao crack. Desde então, perdeu tudo e, há dez anos, luta contra os vícios.
Gilberto, natural de São Leopoldo, conta que há muitos anos é dependente químico. No início só fumava um “baseadinho”, até ser apresentado ao crack. Hoje ainda não está totalmente “limpo”, mas já reduziu consideravelmente a sua dependência com a ajuda do Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas (CAPS AD), onde consegue concentrar a sua energia em atividades lúdicas e artísticas.
Gilberto relata que, muitas vezes, não tem vontade de sair de dentro do CAPS, pois ali é um lugar onde esquece dos problemas, das drogas e se foca no crescimento pessoal, espiritual e profissional. Lembra que foi lá que obteve o incentivo necessário para voltar a estudar, cursar informática e ocupar o seu tempo com atividades produtivas ofertadas no próprio lugar.
Leandro tinha uma vida tranquila e bem estruturada, pessoal e profissionalmente. Natural de São Leopoldo, vive na rua há 12 anos, desde que perdeu o seu grande amor. Quando tinha 15 anos se apaixonou por uma garota de classe média, cuja família o rejeitou por ser filho de catadores.
Mesmo enfrentando esses problemas familiares, Leandro não desistiu do amor pela menina, e começaram a namorar. Pouco tempo depois a menina engravidou. Quando a família descobriu que ela estava grávida, deram um jeito de tirá-la de perto dele, mandando-a para São Paulo, onde residia uma tia. Por um tempo, Leandro manteve contato via rede social com a ex-mulher, mas até hoje não sabe realmente se a criança que ela esperava no momento da separação é sua.
Bárbara, 24 anos, vive na rua desde os seis. Tornou-se usuária de crack após ser abusada sexualmente pelo padrasto. À época, sua mãe não lhe deu créditos e, então, decidiu fugir de casa. Seguia vivendo na rua até o ano passado, quando conheceu o trabalho desenvolvido pelo CAPS AD.
Bárbara lembra que só conseguiu se afastar do vício com a ajuda do CAPS AD, substituindo o fascínio da droga por comida e cigarro. Hoje ela fuma 10 carteiras de cigarro por dia, mas vive longe do crack.
Seu Nilson, hoje com 56 anos, é exemplo de superação para os usuários do Albergue e do Centro Pop, em São Leopoldo.
Com uma história que começa no noroeste do Estado e se dissipa para inúmeras cidades gaúchas e também para outros estados do país, ele conta como se envolveu com o álcool e, depois, com a maconha, até a chegada no crack, em 2006. Lembra como chegou no fundo do poço e como se livrou de tudo quando foi internado em uma comunidade terapêutica, em 2013.
Confira, no vídeo a seguir, os relatos destes personagens que nos confiaram uma parte de suas histórias.