Carlos Urbim: o gigante que dá nome ao Teatro do Centro de Porto Alegre

Matheus Leandro
doze34
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5 min readDec 20, 2017

O teatro homenageia um dos maiores nomes da literatura infantil do Rio Grande do Sul

Teatro Carlos Urbim é um dos principais locais de atividades da Feira do Livro de Porto Alegre

Por Matheus Leandro e Eduardo Dorneles

Natural de Sant’Ana do Livramento, cidade fronteiriça com o Uruguai, Carlos Urbim atuou como jornalista por mais de 30 anos e foi um dos maiores escritores da literatura infantil gaúcha. Grandes clássicos como “Um Guri Daltônico” (1984), “Diário de Um Guri” (1982) e “Bolacha Maria” (2005) retratam histórias bem-humoradas que demonstram as características mais marcantes para quem conheceu de perto o artista: a inocência de um menino do Interior e a vontade de permanecer criança.

Livro autobiográfico de Carlos Urbim, lançado em 1984

“Estou aí, nasci com o saco cheio de brinquedos e sonhos de guri”, escreveu Urbim em uma das suas histórias.

A Feira do Livro de Porto Alegre, palco de muitas apresentações, sessões de autógrafos e outras atividades literárias e culturais, não foi a mesma nas últimas duas edições. Quem esteve no evento em anos anteriores percebeu que a alegria no rosto da criançada agora está diferente. Isso porque o escritor, patrono da 55ª edição e uma das figuras mais célebres do evento, faleceu em 2015, quando tentava se recuperar de um aneurisma.

Carlos Urbim era uma das figuras mais conhecidas em várias edições da Feira do Livro

Cíntia Moscovich, patrona da Feira do Livro do ano passado, contou que o diferencial em Carlos Urbim era a sua originalidade.

“Ele abordava a literatura infantil e tratava as crianças da mesma maneira com que se relacionou com os próprios filhos”, diz.

Para ela, a literatura perde um dos textos mais brilhantes que já tivemos e um grande militante da literatura infantil. Urbim inicialmente era seu colega de trabalho, depois se tornou um amigo muito próximo dela.

“Era um homem que estava sempre de bem com a vida, um jornalista sensacional, que contribuiu muito com a pesquisa histórica do Rio Grande do Sul, um ser humano inocente, que se entregava para uma verdadeira amizade”, atesta a escritora.

Alice Urbim, jornalista e viúva do escritor, disse que uma vez ouviu uma comparação interessante: Carlos Urbim era um Érico Veríssimo infantil. O argumento utilizado foi que Carlos Urbim escrevia sobre suas raízes e manteve durante toda a sua vida o sotaque na literatura.

Alice Urbim (centro) e Carlos Urbim em um evento do Grupo RBS

Surge daí o termo “urbiniano”, que se refere ao amor por ser um guri da fronteira.

“Urbim tinha mais de 60 anos e foi um escritor que sempre reverenciou a sua identidade. O Rio Grande do Sul vai sempre homenageá-lo por isso”, conta Alice.

No ano passado, uma grande homenagem foi feita ao jornalista e escritor: a criação do Teatro Carlos Urbim. Localizado na avenida Sepúlveda, entre a rua Siqueira Campos e a avenida Mauá, o local hoje substitui o antigo Teatro Sancho Pança. A troca ocorreu devido à admiração que Urbim tinha pela Feira do Livro, que anualmente lota aquela região; e pelo gosto que tinha pelas crianças.

Sua inspiração era a própria vivência como um guri da fronteira. Uma curiosidade que Alice contou foi que seu relacionamento com Carlos Urbim começou quando ele era seu professor de redação jornalística da PUCRS nos anos 70.

“Hoje, devido a toda questão politicamente correta, isso dificilmente aconteceria, mas é bem memorável. Começamos a namorar em setembro de 1975, ano em que me formei no curso de Comunicação Social e, em 4 de fevereiro de 1976, nos casamos”, lembra.

Eles tiveram dois filhos, Emiliano e Glauco, e Urbim sempre foi um pai presente na vida deles. Às vezes ia à praia ou à Serra para escrever suas histórias. Alice explicou que essa rotina funcionava como um refúgio.

“Passava dez dias fora, para escrever, mas quando estava em casa, era ele quem botava as crianças para dormir, que contava histórias”, afirma. Foi assim que despertou seu interesse pela literatura infantil.

Em meio à conversa, Alice revelou que guarda muitas lembranças do falecido marido.

“Passou a vida inteira dando o melhor presente para os amigos: um poema. Lembro-me na época em que a famosa peça Bailei na Curva estava em cartaz e ele entregou ao Julio Conte algumas anotações feitas com carinho”, salienta.

Quando perguntado sobre a convivência com um homem daltônico, como Urbim, ela responde:

“Trocava as cores toda hora. Chegava em casa feliz por ter comprado um camisa cinza linda, e eu era obrigada a dizer que não era cinza, mas rosa”, brinca. “O daltonismo tem uma gama de cores que eles (os daltônicos) confundem, mas sempre tratamos isso de forma divertida. Um tempo antes de ele nos deixar, lembro-me que me pediu para colar com fita durex um pequeno papel com a cor escrita no lápis de respectiva cor, pois ele queria colorir as ilustrações sem errar”.

Outra grande homenagem realizada a ele é o Projeto Kombina, idealizado por Carlos Urbim e pela escritora Chris Dias.

“Nossa amizade surgiu há uns 20 anos e hoje dou continuidade no nosso trabalho. O projeto integra um veículo, que chamamos de Kombi Karlos, que leva às crianças muitos objetos que fizeram parte da vida dele. Nosso objetivo é guardar a memória deste artista e mostrar para as novas gerações os seus livros, entrevistas e fotos”, explica Chris.

Projeto Kombina em uma das suas atividades

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Matheus Leandro
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Jornalista | Gremista | Apaixonado por cinema | Amante da literatura | Crítico cético da política