Machismo
Jornalismo esportivo: por que o machismo desemprega mulheres
Episódios machistas no meio esportivo estão cada vez mais evidentes. Falta de oportunidades e obstáculos impostos às jornalistas são parte do problema
Ao longo dos anos, as mulheres têm superado inúmeros impedimentos de cunho profissional impostos a elas pelo caráter machista da sociedade. No jornalismo esportivo isso não é diferente. Na TV fechada, segundo dados do UOL Esportes, apenas 13% dos profissionais que aparecem na televisão, são mulheres. Quando o assunto é a narração esportiva, por exemplo, não existe nenhuma mulher atuando neste cargo, de fato. Já entre as comentaristas contratadas, apenas três profissionais do gênero exercem essa função.
A repórter do portal Globoesporte.com, Thaís Jorge, afirmou em entrevista coletiva que não há uma outra explicação para que hajam poucas mulheres atuando como comentaristas ou narradoras esportivas, senão o machismo. Ela destacou ainda a situação vivida por essas profissionais, que já entram no meio sabendo que existem dificuldades extras para as mulheres.
“Eu gosto muito de comentar jogo, mas eu sei das barreiras que me impedem de fazer isso além. A gente teve uma mulher agora no Esporte Interativo que narrou pela primeira vez uma Champions League, mas, pra isso, ela precisou participar de uma espécie de reality show”, conclui.
Em março deste ano, a repórter Bruna Dealtry, do canal Esporte Interativo, foi beijada à força por um torcedor vascaíno, enquanto fazia a cobertura de um jogo da Libertadores. Três dias antes, um torcedor do Internacional agrediu e insultou a repórter Renata Medeiros, da Rádio Gaúcha, que cobria a partida entre Grêmio e Inter.
Os frequentes episódios desencadearam uma campanha que ganhou força no cenário nacional, principalmente, através das redes sociais, a #DeixaElaTrabalhar. Uma ação organizada por um grupo de cerca de 50 jornalistas mulheres, de todo o Brasil, que tem como objetivo chamar a atenção para os casos de assédio sofridos por elas, indo muito além do que acontece dentro dos estádios. Comentários violentos e ameaças de estupro de torcedores nas redes sociais também estão entre as agressões.
Quando perguntada sobre a campanha, Thaís destaca que antes essas questões pareciam estarem “guardadas no armário”. A repórter ressalta a importância do poder da manifestação como fator fundamental para gerar uma mudança no cenário atual do jornalismo esportivo.
“A caminhada ainda é longa, mas ela começou. E ela começou de forma organizada, com as meninas do Sudeste do país, e aos poucos, eu acho que a gente vai tendo mais voz, mais visibilidade e vai ganhando mais força pra lutar”, encerra.
E foi justamente essa repetição de casos que levaram o Drible da Vaca a fazer a seguinte pergunta:
Por que mulher falando de futebol incomoda tanto?
Para descobrir a resposta, basta olharmos para trás. Ao longo da história, o esporte feminino, assim com a participação das mulheres na cobertura esportiva, não tiveram os mesmos investimentos e oportunidades dados a parte masculina desses meios. A questão histórica é um fator determinante para a falta de visibilidade e preconceito que estão presentes até hoje. A primeira publicação esportiva de que se teve notícia no Brasil, foi “O Atleta”, de 1856. O veículo informativo, tratava do aprimoramento físico dos homens que moravam no Estado do Rio de Janeiro. O futebol como o conhecemos hoje, começou a ser jogado por trabalhadores de fábricas e ferrovias na Inglaterra, mais especificamente, por homens. As mulheres não tinham quase nenhum espaço no meio. Entretanto, em 1892, na Escócia, houve uma exceção. Foi disputada a primeira partida de futebol feminino do país, antes da modalidade ser banida da ilha, em 1921. Aqui no Brasil, falar de futebol era um assunto de exclusividade dos intelectuais da elite social e de alguns líderes sindicalistas. Isso porque, o homem branco que tinha boa condição financeira, ou que estava em posição de poder, tinha absoluto domínio social sobre as demais classes, e o privilégio de exercer sua voz e opinião frente a elas.
Apesar de ser maioria nas redações atualmente (64%, segundo a Federação Nacional dos Jornalistas), apenas 7% das mulheres assinam matérias sobre esportes. Ter a presença de uma mulher na equipe esportiva faz toda a diferença no resultado final, elas trazem uma nova forma de olhar a cena, coisas que muitas vezes escapam aos homens, não passam desapercebidas por elas. Mulheres vão lá e fazem tão bem quanto, ou até melhor.
Quando Glenda Kozlowski participou de uma inédita narração esportiva na Rede Globo, foi chamada de “louca histérica” por internautas. Na Alemanha, Cláudia Neumann, a primeira mulher a narrar uma partida da Eurocopa masculina na televisão alemã, foi crucificada por ser mais uma mulher no futebol. Após o feito histórico, foi acusada de ter uma “voz irritante” e ameaçada de estupro por alguns telespectadores. Enquanto faltam mulheres atuando nessa área, ainda sobram clichês e preconceitos.
As jornalistas estão em constante provação e precisam driblar a desconfiança sobre sua capacidade e sobre como conseguem as informações. São postas em xeque por seus leitores, espectadores e colegas de trabalho, mas resistem firmemente. O fato é que independentemente do lugar onde ocorram os casos, o machismo é a raiz do problema, e ele deve ser combatido a todo custo.