A COPA EM VINTE DIAS #12
O Protagonismo brasileiro em 82 e o sonho do tetra adiado
A trajetória da Seleção Brasileira no Mundial da Espanha, superioridade que não se traduziu em título
Por: Beatriz Carvalho
Edição: Vitor Magalhães
Ruas enfeitadas de verde e amarelo, camisa da seleção no corpo e brasão no peito. 82 era o ano do tetra. Não havia como não ser. A conquista era a paranoia nacional dos anos 80. O Brasil se encontrava em uma crise social, econômica e política, a ditadura civil-militar entrava em colapso. Os principais setores cobravam a democratização. Tudo era manifestação política e crítica ao regime. A música, o teatro e, claro, o futebol.
Uma geração de rebeldes desembarcou na Espanha para o Mundial. Os comandados de Telê Santana haviam retomado um estilo ofensivo e esbanjavam bons números. Em 32 jogos com o treinador no comando técnico, (alternando entre amistosos e eliminatórias), o Brasil somou 24 vitórias, seis empates e apenas duas derrotas, para a URSS e para o Uruguai.
A seleção brasileira não havia levado gols em 14 ocasiões e só deixou de balançar as redes uma única vez. Não só os números entusiasmaram, craques como Leandro, Sócrates, Falcão e Zico enchiam os olhos do povo brasileiro. A canarinho estava voando e parecia ser imbatível.
Não se sabe ao certo se foi o estilo de jogo proposto pela seleção, a falta de um ponta-direita entre os convocados, a segurança excessiva, ou simplesmente a sorte do dia. Mas a seleção brasileira, tida por analistas e estudiosos como uma das melhores gerações de todos os tempos, perderia o mundial e se juntaria ao grupo de seleções, como a Hungria de 54 e a Holanda de 74. Equipes que encantaram o planeta, mas que não levantaram a taça.
Novos passos
A Copa do Mundo de 82 celebrou uma nova Espanha. O país esperou 18 anos para sediar o evento. Quando se candidatou para ser a anfitriã da festa, vivia sob a ditadura de Francisco Franco. O governo chegou ao fim em 75, anos depois, recém democratizada, a Espanha pôde abrir portas para todos os continentes, estreando o novo formato do mundial. Com o aumento de 16 para 24 nações, a América do Sul teve direito a três vagas (já que uma pertencia à Argentina, por ser a atual campeã), ocupadas por Brasil, Peru e Chile.
Foi um ano de memoráveis participações brasileiras, não só na seleção nacional. Peru e Kuwait também eram comandados por treinadores brasileiros. Tim, que fez fama como jogador no Fluminense e na Seleção Brasileira, comandava o Peru em 82, seleção que vinha marcada pela fatídica derrota para a Argentina, em 1978, por um placar de 6 a 0, e que acabou eliminando o Brasil da final. Na ocasião a delegação foi acusada de “entregar” o jogo para a anfitriã. Já o Kuwait veio comandado por Parreira, perito em seleções e Copas.
Mas quem atraía a atenção de toda a nação era a formidável equipe montada por Telê. O Brasil estreou com triunfo de 2-1 sobre a URSS. E as exibições não pararam por aí. Conquistou um 4-1 contra a Escócia e um 4-0 sobre a Nova Zelândia. E claro, levou a melhor sobre a Argentina também, um 3-1 de dar gosto, com direito a expulsão de Diego Maradona.
Até aí o Brasil vinha surfando em uma onda sensacional. A Itália, no entanto, encontrou muitas dificuldades. A Azzurra não vencia e quase não garantiu a classificação para a segunda fase. A seleção vivia uma crise dentro e fora de campo. Nas quatro linhas era difícil marcar gols, fora havia o envolvimento no Totonero, escândalo no qual vários dirigentes e jogadores foram acusados por venda de resultados e punidos com prisão e afastamento do futebol, entre eles Paolo Rossi, um dos protagonistas do fim dessa história.
Havia quem acreditasse no potencial da Itália e na organização do time? Sim. Mas é inegável que até o brasileiro menos otimista, já comemorava essa conquista como realizada. Triste engano. O jogo só acaba quando termina, não é o que dizem?! Pois bem.
O duelo de Sarriá
Em 1982, o palco do Espanyol, mundialmente conhecido como Estádio de Sarriá, recebeu três confrontos. Um deles o mais lembrado entre os brasileiros. Em 5 de julho, Itália e Brasil se encontraram. Mesmo com a vantagem do empate Telê armou o time ofensivamente, igualzinho como havia jogado até então, muitos diriam que esse foi o erro.
Ou teria sido culpa daquele torcedor que justamente nesse jogo resolveu usar outra camisa, ou cortar o cabelo. Meu palpite é que tenha sido o ônibus da seleção brasileira. Reza lenda que o famigerado fez o mesmo percurso do hotel ao estádio em todos os jogos. Exatamente no dia 6, o ônibus inverteu o caminho e foi para o estádio por onde costumava fazer a volta. Resultado: 2-3 para a Itália.
A Azzurra apostou em uma forte marcação, Gentille grudou em Zico e os italianos jogaram no erro dos atletas brasileiros. E assim ganharam a partida. Aos 4' um cabeceio certeiro do Paolo Rossi abriu o placar. A seleção verde e amarela não se abalou e com Sócrates decretou o empate. Rossi ainda marcou o segundo e fechou o primeiro tempo com o placar de 2-1. Na volta, Falcão não demorou a igualar o marcador novamente, mas o time não segurou a pressão. A Itália apostou nos erros de marcação brasileiros e em um deles, o Bambino D’Oro assinalou o seu terceiro gol na partida e eliminou o Brasil.
Mas como já comentei, foi um ano de participações brasileiras. O Brasil estava na final. Na partida disputada entre Alemanha e Itália (favorita a essa altura por conta da “crescente” que teve na competição), no Santiago Bernabeu, estádio do Real Madrid, Arnaldo César Coelho fez seu nome como o primeiro não-europeu a apitar uma final de Mundial. Pode isso?! Claro que sim!
Diante de um público de 90 mil torcedores e de 10 milhões de pessoas que acompanhavam pela televisão, a Itália foi campeã do mundo e igualou o número de títulos brasileiros.
Foi o tri da Itália, mas tinha tudo para ser o tetra do Brasil.