Era uma casa muito engraçada — Catete92

Ana Clara Toledo
Felipe Duarte
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6 min readJul 24, 2015

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Por Ana Clara Toledo

Comece imaginando uma casa onde qualquer um pode chegar. Pra fazer o que? Trabalhar todos os dias, dar um workshop, trocar ideias, preparar um almoço, pedir conselhos e aprender com gente nova. Um negócio e tanto, né? Não! Essa casa não é um negócio nem uma marca, é uma ferramenta para promover troca e aprendizado. Ué, como isso funciona? Sem hierarquia, gerência ou curadoria, apoiando-se sempre na auto gestão. E mais: não rola aluguel, tudo funciona a partir de contribuições. Tá achando que é utópico demais? Então é só chegar no Catete92, uma casa colaborativa de livre criação que criou um universo novo e disruptivo no Rio de Janeiro.

Não entendeu muito bem? Então é simples: vá até a Rua do Catete nº 92, toque o interfone da casa 3 e fale que quer conhecer. De primeira, você pode ficar até um pouco perdido, mas rapidinho vai entender o ritmo.

Andando por lá, a gente vê agências, aulas de tarô, sessões de massagem, cursos, palestras e reuniões. Querendo promover algum evento, é só entrar no site, marcar na agenda, fazer uma cópia da chave e seguir algumas indicações, como não fazer muito barulho e arrumar tudo do jeitinho que tava.

No Catete92, tudo funciona com base na confiança. Cada um sabe que é responsável pela segurança e pelo bem estar da casa. Se você está lá, faz a sua parte para manter o espaço vivo e saudável. O melhor é que essa filosofia de cuidado transborda para outras esferas: as pessoas trocam conhecimento, se ensinam e cuidam dos sentimentos umas das outras. O Catete92 nos leva a uma série de reflexões: quais são nossos propósitos, onde está o nosso foco, como usamos nosso tempo e assim por diante.

“É uma questão de colocar mais consciência sobre o que a gente faz”, diz Felipe Duarte, um dos idealizadores do espaço.

Ainda nas palavras de Duarte, o Catete92 “não tem nenhum objetivo além de existir”. A ideia inicial surgiu de uma conversa entre Felipe e dois outros colaboradores, Gustavo Joppert e Lucas Djahjah: eles pretendiam criar um espaço de coworking dividido entre amigos e empresas parceiras. Mas, juntando vários outros interessados, Duarte diz que decidiu arriscar. Só havia duas outras casas colaborativas e de livre criação no Brasil e essa galera acreditava que não era suficiente.

“Elas ajudam as pessoas a updatar a cabeça, ensinam sobre como se relacionar e lidar com valor. Vivemos a vida muito pragmaticamente e a verdade é que, se relacionando assim, a vida é muito rasa”, diz Duarte.

Hoje, o Catete92 cresceu e ganhou novos colaboradores. Seja presencialmente na casa, de vez em quando nos eventos ou ativamente no grupo do Facebook, essa comunidade, que está aberta para quem quiser chegar, se mobiliza cada vez mais, pensando sempre em concretizar sonhos, filosofias, pequenos e grandes empreendimentos, ações e tudo o que possa ser feito colaborativamente.

Talvez a palavra-chave para descrever a atitude de quem frequenta o espaço seja de fato colaboração. Não há um chefe ou alguém que gerencie a casa, não há regras de funcionamento ou pré-requisitos para entrar. O Catete92 não tem donos, ou melhor, é de todos. Esse modelo de auto gestão cria um universo onde a colaboratividade e a responsabilidade são essenciais; cada pessoa faz sua parte para manter a casa viva e pronta para receber gente nova.

As despesas do espaço também funcionam com base na colaboração. Para se manter, o Catete92 não cobra aluguel, ele funciona através de um esquema de contribuições. É só depositar o dinheiro em uma das urnas espalhadas pela casa ou contribuir no crowdfunding recorrente do espaço. Cada pessoa dá o quanto quiser, de acordo com o valor que vê ali. A filosofia é:

“quanto mais colaboramos, mais barato fica. Mas a decisão sobre o preço é livre e de cada um”.

Para se manter, a casa precisa de aproximadamente R$8.000 reais por mês, mas o ideal mesmo é arrecadar R$12.000. Acompanhar tudo isso é muito fácil, já que tanto a planilha de arrecadações quanto a de despesas ficam disponíveis online e são constantemente atualizadas. Tudo muito transparente para assegurar a colaboratividade.

Pode parecer difícil, mas a comunicação é tão integrada que funciona: a cada mês, por exemplo, tem alguém que dá um gás a mais para ir ao banco e pagar as contas. Como tudo é fluido e colaborativo, isso não vira um peso ou uma responsabilidade grande demais: se não vai poder fazer, é só passar a função para outras pessoas. Sem problemas, o importante mesmo é comunicar.

O propósito inclusivo do Catete92 se baseia no chamado paradigma da abundância, um ciclo que mantém vivo o DNA da casa. O espaço sempre partiu do princípio de que tem para todo mundo: é possível bancá-lo porque quem está ali acredita no que ele representa, confia nas filosofias da casa, aposta no seu sucesso e comunica isso para conseguir a ajuda necessária; dá para você fazer a atividade que quiser porque a comunidade colabora na hora de juntar recursos; cabe qualquer pessoa que chegar porque ali existe uma comunicação integrada que faz tudo se ajeitar.

Acreditando que vai ter, a gente colabora para criar. Com isso, aumentamos o fluxo e também diminuímos os custos e é assim que somos inclusivos. Logo, tem pra todo mundo:

Tudo começou e continua sendo guiado pela filosofia do ‘só vai’, ou do ‘foda-se’, como diria Djahjah. A casa, sugando sua energia da atenção dada a ela, continua viva, mas ainda é difícil de manter. “Como sociedade, não estamos prontos para aquilo”, diz Duarte, “vivemos num mundo sob a tirania do serviço e as pessoas não entendem as coisas que não funcionam assim. Mas não podemos tratar tudo como serviço”. Por isso mesmo, o objetivo final do Catete92 é muito simples: sobreviver e continuar inspirando outras pessoas.

A comunidade do Catete92 vai muito além das pessoas que trabalham constantemente lá. Para ficar ligado nesse universo e fazer parte da rede, você pode acompanhar tudo pelo grupo e pela página do Facebook :)

Feito com amor e com a ajuda de Felipe Duarte, Erik Dana, Lucas Djahjah, Rafael Bizachi e todo mundo que, de alguma forma, faz parte da história do Catete92 ❤

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