A falsa realidade vendida nas redes sociais

LudiF
e o design com isso?
5 min readNov 1, 2021
Fonte: Pixabay

A vida das redes sociais ou a vida das aparências. Onde tudo é perfeito e todos são calculadamente belos. Literalmente calculados, não adianta a academia de segunda a segunda e a alimentação regrada, para ficar parecida com a “influencer”, somente através de cirurgiões, anestesias e milhares de reais isso é possível. A vida virtual nos vende uma mentira que compramos e nos cobramos por não ser igual a pessoa A ou B. Compramos a mentira de que o normal é a pessoa gastar milhares em intervenções estéticas, até ficar irreconhecível. Se submeter a uma cirurgia se tornou tão banal, que o novo normal são pessoas cada vez mais novas com silicones, rinoplastias e inúmeras intervenções. Se não consigo ficar igual a influencer A, logo não possuo a beleza necessária. Esticada, empinada, remendada… este é o novo padrão de beleza.

Tudo isso gera um sentimento de fracasso, afinal, a pessoa B tem a minha idade e já comprou o carro do ano e uma casa maravilhosa, enquanto eu mal consigo pagar minhas pequenas dívidas. Tornou-se corriqueiro ostentar um tênis de 10 mil reais para se sentir superior e, claro, você TEM que mostrar o seu tênis de grife, pois todo mundo precisa saber que você o tem, caso contrário, não tem graça tê-lo. Trabalhar o mês inteiro, ônibus cheio, cansaço, contas para pagar e não ganhar em um mês o que uma pessoa ganha publicando a foto de um produto.

“Na sociedade positiva, na qual as coisas, agora transformadas em mercadorias, têm de ser expostas para ser, seu valor cultual desaparece em favor do seu valor expositivo (…) sua existência perde totalmente a importância. Pois, tudo o que repousa em si mesmo, que se demora em si mesmo passou a não ter mais valor, só adquirindo algum valor se for visto.” (HAN, 2016, p.27)

Nas redes sociais você é quem você quer ser, você mostra o que você quer mostrar. E isso é geral. Por que nos sentimos piores sendo que só estamos vendo uma ponta da vida da pessoa? Que, a propósito, é completamente manipulada para fingir ser perfeita. A que preço vale toda essa exposição?

Queremos usar a roupa que eles têm, compramos o que eles nos falam para comprar, mudamos hábitos que achamos nos convém porque queremos ser como eles. Queremos viajar várias vezes no ano para lugares paradisíacos também. Mas a nossa vida é outra e quando percebemos que isso não irá acontecer, fazemos da nossa realidade ainda mais triste do que de fato é.

Vivemos em um mundo em que queremos ter para mostrar, para nos sentirmos parte do todo. Em que queremos agir de tal forma para nos encaixar, as redes sociais criaram essa necessidade de ter algo que não vai nos deixar mais felizes, não vai resolver os nossos problemas, mas nos vendem essa ideia. No entanto, a vida de quem está por trás de tudo aquilo também não é perfeita, mas mesmo assim somos convencidos de algo que não existe. Pensando bem, quem é verdadeiramente feliz nos dias de hoje?

O que foi criado para nos conectar e nos distrair, na verdade, nos isola, nos deprime e nos vicia. Deixamos momentos da nossa vida passar por que estamos “conectados” demais, ou, como prefiro dizer, alienados demais. Como nos conectamos se na realidade ficamos horas curvados diante de uma tela sem nem de fato prestar atenção nas coisas que acontecem ao redor? Como vamos de fato viver se apenas queremos fazer ou ter, apenas para filmar e postar? Sinto que nos tornamos apenas pessoas solitárias que preferem ficar horas a fio rolando uma página, do que de fato viver o mundo que existe fora dela.

É comprovado, segundo o The Guardian, que as redes são mais nocivas para mulheres jovens, que se cobram mais por não ter o tão sonhado corpo de “modelo”, que como disse, é todo remendado e irreal. É muito fácil alguém dizer para “se amar como você é “ ou dizer que está “de cara limpa” depois de preenchimentos, harmonizações, lentes nos dentes, implantes de cabelos, silicones, retirada de bochechas, cílios falsos, etc. Traços que há pouco tempo atrás eram motivo de chacota como sobrancelhas grossas, olhos levemente puxados e bocas carnudas. Não para ficar modificando o corpo de acordo com a “tendência” do momento. Aliás, o que eles ainda não inventaram? É injusto se cobrar por algo que é totalmente manipulado para que pareça de determinada maneira.

Nos colocamos em uma competição que sequer existe de forma declarada. Quem tem mais seguidores, mais curtidas, o carro mais bonito ou o corpo mais escultural na competição de quem é o melhor. Mas o melhor na definição de quem? Como vamos saber o ganhador se nem sabemos as regras definidas?

Agora, por que continuamos insistindo em algo que claramente nos deixa deprimidos? Algo que toma nosso tempo a ponto de não conseguirmos executar nossas tarefas cotidianas com excelência? Por que continuamos a comparar nossas vidas com a de terceiros sendo que somos indivíduos diferentes com subjetividades diferentes? Será que não seríamos mais felizes se usássemos o nosso tempo dedicado às redes sociais lendo um livro, passando um tempo com a família ou buscando uma realização profissional? É possível usar as redes sociais sem nos compararmos com outros?

E para os criadores destas plataformas, quanto mais viciado você fica, melhor, afinal, quanto mais tempo passamos online, mais dinheiro para eles. Inclusive, no documentário “O Dilema das redes sociais”, é citado que se você não paga para utilizar um serviço, você é o produto.

“Na sociedade expositiva cada sujeito é seu próprio objeto-propaganda (…) o excesso de exposição transforma tudo em mercadoria” (HAN, 2016, p. 22)

No fim das contas, por que nos permitimos afundar em um lugar manipulado — aparentemente quase sem saída — onde prevalecem falsas vidas e falsos corpos? Lógico, a fantasia pode ser bem melhor do que a realidade, mas devemos estar cientes de que tudo não passa de uma encenação.

REFERÊNCIAS

HAN, Byung-chul. Sociedade da Transparência. 1. ed. São Paulo: Vozes, 2016.

LANIER, Jaron. Dez argumentos para você deletar agora suas redes sociais . 1. ed. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2018.

O DILEMA das redes sociais. Direção de Jeff Orlowski. Estados Unidos: Netflix, 2020.(89 min.).

GREITEMEYER; SAGIOGLOU, Tobias e Christina. 2014. Disponível em: <www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0747563214001241>. Acesso em: 28 out. 2021.

STRESS and social media fuel mental health crisis among girls. The Guardian. 2017. Disponível em: <www.theguardian.com/society/2017/sep/23/stress-anxiety-fuel-mental-health-crisis-girls-young-women>. Acesso em: 28 out. 2021.

--

--