Luiz Felipe Adurens Cordeiro
É quase Shakespeare!
3 min readOct 5, 2018

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“Quando publiquei um livro chamado Imbecil Coletivo, todo mundo só pensou que era insulto. Não! O conceito de “imbecil” é um conceito filosófico”, afirma Olavo de Carvalho

PEQUENO MÉTODO PARA RECONHECER-SE (OU NÃO) UM IMBECIL

PRIMEIRO PASSO: ENTENDER O FENÔMENO DA IMBECILIDADE

“Imbecil”, “idiota”, “estúpido” embora sejam termos usados pejorativamente como xingamentos, formas de depreciação, são conceitos fundamentais da filosofia.

Em seu “Bases Morais da Comunicação em uma Democracia”, afirma o filósofo Eric Voegelin que a estupidez sempre foi um fenômeno reconhecido pelas civilizações antigas: o nabal (tolo) em hebraico, o amathes (homem irracionalmente ignorante) platônico, o stultus (estulto) de Tomás de Aquino.

O “tolo homem irracional ignorante e estulto” é, segundo Voegelin, o responsável por criar a desordem na sociedade, e isto pelo seguinte motivo: ele tem uma “imagem defeituosa da realidade”.

Em uma aula em que aborda a filosofia de Santo Agostinho, o filósofo Olavo de Carvalho expressa do seguinte modo o fenômeno da imbecilidade:

“O ser humano emerge para dentro da vida a partir de um fundo que lhe permanece desconhecido, mas que continua dentro de si como um componente problemático. Então o homem é aquele que se pergunta sobre o seu fundamento. Isto já estava dito nos gregos. Platão colocava que o homem que não tem esta interrogação sobre o fundamento da sua existência era chamado amathes (mathes, da raiz “saber”), o homem sem saber, sem sabedoria. Amathes pode ser traduzido como “homem estúpido” (ou idiota, ou imbecil).

“Quando publiquei um livro chamado Imbecil Coletivo, todo mundo só pensou que era insulto. Não! O conceito de “imbecil” é um conceito filosófico que tem uma tradição de 2.400 anos. É um conceito perfeito…Não, não estou brincando! É uma coisa perfeitamente delineada, que tem uma imensa bibliografia, que vai desde Platão até o século XX, quando se tem estudos sobre isso. Há o famoso estudo de Robert Musil, Über die Dummheit. Dummheit é uma palavra até mais…até pelo som se vê. Esse “dum” quer dizer que o sujeito é um negócio fechado, sem nenhum interesse, é maciço. Dummheit só pode ser estupidez maciça. Esse é um livro de trinta páginas, absolutamente maravilhoso, continuação de uma tradição”.

“Então, quando um filósofo fala da imbecilidade ou da estupidez, ele sabe do que está falando. É um fenômeno gravíssimo da constituição humana que se manifesta pelo desinteresse pelo fundamento. O fundamento é aquilo que está dentro de você e que o transcende, é a parte misteriosa, é o apeíron, o indefinido que está embaixo e dentro de você, e acima também. Quando você se fecha para este fundo, quando não quer mais saber dele, fechou-se só naquilo que constitui você mesmo tal como você está; fechou-se no mesmo. “Mesmo”, em grego, é idios, então você se tornou um idiotes, que é um indivíduo que só sabe do mesmo, que não conhece aquela alteridade, aquele outro, aquele fundamento abissal que existe dentro dele. Só sabe dele mesmo, daquilo que ele mesmo pôs no circuito dele mesmo. Tudo o que constitui sua verdadeira realidade e que vem de fora, vem de cima e vem de baixo, vem do infinito, para ele não existe. Então, é evidente que é um idiota! Ele não sabe onde está!” .

SEGUNDO PASSO: O “EU” QUESTIONA A PRÓPRIA CONSCIÊNCIA

Compreendido o conceito de “idiota”, “imbecil”, “estúpido”, resta o mais difícil e árduo passo: o exame da própria consciência. Eis uma série de perguntas sugeridas a partir da definição do fenômeno:

1) Qual a imagem que tenho da realidade?

2) Ela é ou não uma imagem defeituosa? Como posso me assegurar disso?

3) Reconheço que, como ser humano, de fato emergi para dentro da vida a partir de um fundo que me permanece desconhecido? Reconheço que esse fundo continua dentro de mim como um componente problemático? Eu me pergunto sobre o meu fundamento, sobre o fundamento da minha existência?

4) Eu sou um “negócio fechado, sem nenhum interesse, maciço” ou, ao contrário, estou aberto, interessado, curioso, “oco”; tenho uma mente, um espírito, uma vida interior que se sabe necessitada de preenchimento?

5) Estou fechado nisto que me constitui tal como estou? Estou fechado no mesmo (idios)? Conheço a alteridade, o outro, o fundamento abissal que existe dentro mim? Ou, ao contrário, só sei de mim mesmo, do que eu mesmo coloquei no circuito de mim mesmo?

6) Minha verdadeiro realidade — ou seja, o que vem de fora, vem de cima e vem de baixo, vem do infinito — existe para mim?

7) Eu sei realmente onde estou?

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