Nos bastidores da EatTasty
Como fazer comida para delivery: uma conversa com o chef Rúben Couto
Este artigo faz parte da série “Nos bastidores da EatTasty” na qual queremos dar-te a conhecer momentos essenciais à nossa operação.
Uma das grandes tarefas do chef Rúben Couto — o nosso Head of Culinary — é garantir a qualidade de entrega das refeições EatTasty numa operação como a nossa onde importa, acima de tudo, a qualidade.
Está na altura de levantar o pano para o trabalho de bastidores de cozinha da EatTasty. Segue viagem connosco ao comando do Rúben e fica a conhecer-nos melhor.
Podem já ter decorrido uns anos desde que o Rúben pousou a jaleca, as facas e a pinça e abandonou o trabalho diário na restauração convencional, mas na cabeça dele ainda moram velhos dilemas que nunca deixam de preocupar um cozinheiro profissional: como satisfazer um cliente? E surpreendê-lo? Há algum elemento crocante que entre bem neste prato? E estas texturas, será que jogam? Estará apelativo visualmente? “Trabalhar neste mundo virtual inibe aquela possibilidade de controlar ao minuto o que está a acontecer na sala e na própria cozinha. Desaparece o lado físico, sim. Mas a satisfação do cliente continua a ser o objetivo último”, admite.
Os restaurantes
Um dos grandes pilares do negócio da EatTasty são os restaurantes parceiros e, de certa forma, um dos pontos de partida de toda a nossa operação. “Onde quer que exista um bom produto dentro das nossas áreas de recolha, nós vamos atrás”. Palavra de Chef! Em Lisboa trabalhamos com mais de 40 restaurantes e em Madrid são cerca de 20.
Como?
“Temos uma equipa dividida pelas duas cidades e fazemos a gestão diária desses parceiros. Para que tudo corra bem com os nossos produtos é fundamental manter uma boa relação com cada um deles. E admito que às vezes somos um pouco intrusivos no que eles fazem”.
O ponto de partida é a escolha das receitas. “Nunca incluímos o menu completo de um restaurante. Porque nem todos os produtos podem funcionar numa operação de delivery.” Assim, mediante aquela que é a oferta do parceiro, estudam-se as receitas e os pratos a incluir no menu. “Pode ser uma, podem ser cinco, dez… não temos uma regra.” Cada uma delas deve obedecer a uma lista de critérios pré-estabelecidos, até serem alcançadas as condições perfeitas para serem incluídas no menu:
- equilíbrio nutricional;
- a forma como a comida é embalada;
- a temperatura a que tem de ser embalada;
- a avaliação de todas as condicionantes que podem acontecer no processo de transporte e as condições em que vão chegar ao cliente.
Como seria de esperar, todos os pratos são minuciosamente testados antes de entrarem no menu da EatTasty. “Tentamos ser diretos e concisos na abordagem às receitas”. O que não significa pressa, o grande inimigo da perfeição. Em conversa com os parceiros chegamos a um grupo de receitas que eles possam ter interesse em produzir — e para nós tem de haver um equilíbrio também com os outros restaurantes que já são parceiros. Depois testamos a receita uma vez e fazemos uma avaliação descritiva do resultado.
Algumas receitas ficam logo pelo caminho. No segundo teste já nos aproximamos mais daquilo que vai ser a versão final e, caso seja preciso, ainda testamos terceira vez.
Era uma vez um almoço que foi dar a volta à cidade e chegou inteiro
Para os testes, o Rúben obriga as embalagens circular pela cidade o máximo de tempo possível, como se estivesse na maior distância, espacial e temporal, entre os pontos de recolha e de entrega e avalia as condições em que os pratos são entregues.
Temos já diversos parceiros fixos, uma espécie de casamentos de longa data, com quem as relações são estáveis e apenas meia-dúzia com quem deixámos de trabalhar ao longo do tempo. Nesta altura de pandemia, houve um ou outro que perderam a capacidade de produção por causa da COVID-19, houve outros que não tinham possibilidade de produzir em escala e de dar resposta aos nossos pedidos, mas regra geral temos relações fortes.
A divulgação (ou não) ao cliente do nome dos parceiros é outra escolha feita caso a caso. Pode ser uma mais valia para as duas marcas, pode não ser. Avaliamos a linguagem deles, o trabalho, o tipo de produtos. Às vezes são cozinhas não abertas ao público, ou as chamadas ‘marcas brancas’ e não faz sentido comunicar. Sendo que o certificado de qualidade é garantido.
Escolher os melhores ingredientes
Descobrir o que faz vender um prato — além da fome, claro — é um dos desafios do trabalho do Rúben. E um dos seus estímulos. “É realmente desafiante olhar para uma caixa e perceber o que é que se pode fazer lá dentro. Pôr-me no lugar do cliente e pensar como é que posso ficar satisfeito.” Assim, como num puzzle onde se vão juntando as peças até ter a imagem final, aqui, em contacto com os parceiros, vão-se trabalhando os ingredientes e sabores, até chegar a uma fórmula vencedora. “Sei que não vou poder nunca pôr alface ao lado de produtos quentes, porque vai cozer, então temos de pensar cada um dos produtos individualmente e construir uma receita.” Além da combinação de ingredientes, entra em jogo também todo o processo sensorial do acto de comer. “É a velha história: comer um pacote de 50 gramas de batatas fritas sacia e satisfaz mais do que comer 300 gramas de puré.” Assim, antes de darmos uma receita por concluída, estudamos desde as texturas às cores do prato, desde o jogo de sabores à capacidade de saciar.
O Rúben já domina os ingredientes e receitas que dificilmente vão resultar:
A batata-frita?
“A convencional, fina, de palito, já sabemos que à partida não funciona.”
Os panados?
“Só há prazer em comer se existir uma crosta com alguma crocância. Conseguimos chegar a uma receita com amêndoa no polme, que lhe dá alguma espessura. E só depois de lá chegarmos é que pensámos na guarnição desse prato.”
Um sonho antigo?
“Gostaria muito de incluir um bacalhau à Brás, mas é complicado, e ter também uma pizza que chegasse ao cliente como se tivesse acabado de sair do forno. Estamos a trabalhar em diferentes tipos de massa de pizza. A calzone, por exemplo, permite manter alguma humidade…”.
Novidades para breve? Provavelmente.
Menu Perfeito? Temos a fórmula
Para a construção do menu diário, que junta as receitas dos diferentes parceiros, entram muitas variáveis. “Primeiro temos sempre à volta de cinco ou seis pratos, para simplificar a escolha do cliente, e que não se repetem ao longo da semana.” Depois existe um percentual de receitas de carne, de peixe e vegetarianas, de forma a que seja construído um menu bastante democrático — apesar de sabermos que a carne é o que mais vende, em particular a carne branca.
“Cada uma das referências [receitas] tem ainda uma série de dados particulares associados, como por exemplo a técnica usada na confecção, e isso também vai influenciar a construção do menu, porque devem ser pratos que entre si permitam a maior variedade possível.”
Resumindo, apenas para Lisboa, com as cinco diferentes áreas de distribuição da EatTasty, cada uma com o seu menu, somam-se uma média de 30 pratos diferentes. Números que não incluem snacks, entradas e jantares, que começámos a entregar desde o mês passado.
Gerir o dia-a-dia
A produção da comida fica a cargo dos parceiros, mas toda a parte operacional é organizada por nós. “Enviamos um plano semanal com os dias em que vamos precisar de cada restaurante e com uma previsão do número de pratos que precisam de confecionar.” Essa previsão é construída através de um algoritmo que permite aos parceiros organizar a sua operação em termos de recursos humanos, stocks e food costs.
“Depois, no próprio dia, às 11h30, no caso dos almoços, e às 19h30, no caso dos jantares, têm de ter os pratos embalados e prontos a ser recolhidos.”
Apesar da fiabilidade deste algoritmo, às vezes há algum desperdício. “Quando estabelecemos alguma parceira com os restaurantes, tentamos escolher produtos que não deem origem a grandes perdas. De qualquer forma, quando há algumas sobras, trabalhamos de perto com associações que recebem a comida, como é o caso da Refood. Nem sempre o desperdício é uma coisa má”, admite o Rúben.
Mas mesmo com a operação bem oleada, há sempre factores externos que podem influenciar a experiência, como o atraso da parte de um parceiro, ou um problema com o packaging. O maior erro é sempre humano. E quem produz as nossas refeições são pessoas. Há sempre uma percentagem de algo que pode falhar.
“Já me aconteceu ter um erro na construção de um prato e ele sair ainda melhor.”
Podem surgir problemas de transporte e logística — “todos os dias temos dezenas de estafetas a circular, já houve acidentes, claro” -, mas tentamos que todas essas variáveis estejam controladas à partida. “Temos fichas técnicas muito detalhadas de tudo, desde a receita ao ato de embalar.” Já para evitar acidentes de percurso — no sentido literal.
Medir, Medir, Medir
Todos os dias recebemos reviews. E todos eles nos fazem repensar, reavaliar e fazer melhor. Por outro lado, também estes comentários dos nossos clientes ajudam a perceber que receitas estão a fidelizar os utilizadores. Se um prato tem médias constantes e boas, digamos um 4.8 [a escala de vai de 0 a 5], com dezenas de avaliações boas por dia, é porque as coisas estão bem. Quando há muitas oscilações, neste caso temos de reavaliar a situação.
“Todos os dias faço testes. Se recebo um comentário menos positivo sobre alguma receita, eu próprio a peço para avaliar.” É que, como o próprio Rúben diz: “posso não estar na roda [zona de passagem entre a cozinha e a sala, onde os chefes executivos estão, nos restaurantes convencionais] a olhar para o prato que vai seguir para a mesa, mas estou em cima da operação.” Todos os dias.