O Futuro do Trabalho

Uma coisa é certa, é preciso ser criativo e pensar diferente, inovar. Isso, passa pela melhoria de qualidade e reformulação da educação.

Andreia Freitas
Economistas no Debate
5 min readFeb 1, 2021

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O mercado de trabalho vem, ao longo do tempo, se modificando. Já passou pela Revolução Industrial, pela Crise de 1929, pela Revolução Digital e continua em transformação. Há uma crescente informatização de processos e serviços, uma tendência de aumento da automação de funções e tarefas (pressupõe-se que grande parte da força de trabalho seja substituída por softwares e robôs nos próximos anos), já se utiliza robôs em cirurgias e inteligência artificial em diagnósticos.

Na medida em que requer o uso da tecnologia para driblar as imposições de isolamento causadas pelo Covid-19, a crise sanitária que estamos vivenciando acelera todo esse contexto, mas também traz novas formas de trabalho, de interação social e de aprendizado. Além disso, nos mostra o quão frágil e deficiente estamos no sentido de remediar essa situação, diante das desigualdades social e de acesso da sociedade aos recursos tecnológicos.

Mas o que muda nas relações de trabalho? Há algumas tendências que já se manifestam:

- A flexibilidade — em relação ao horário de trabalho, a maneira como de se vestir, e a forma de como e onde cumprir determinadas tarefas;

- A crescente tendência de pessoas trabalhando de forma não exclusiva — uma pessoa pode atender a mais de uma empresa;

- Maior diversidade — pessoas de formações diferentes trabalhando em conjunto num mesmo projeto;

- Gestão mais colaborativa — com pessoas trabalhando em equipe, sem a figura hierárquica marcada pelo distanciamento da posição na organização.

O trabalho exerce um papel importante na vida das pessoas, representa sobretudo a função de sustento. Mas também desempenha uma atribuição psicológica, na medida em que mostra a identidade do indivíduo para o mundo; e de competência social, que se refere à maneira como o trabalho impacta a vida das pessoas. O sentido do trabalho também vem se transformando: o aspecto financeiro vem perdendo relevância, desde que atingido o sustento, cedendo espaço ao lado psicológico e social.

As pessoas eram educadas a estudar e trabalhar, buscando uma ascensão na hierarquia do trabalho (muitas vezes numa mesma instituição), trabalhando muitas horas por dia e no decorrer de anos para alcançar um determinado grau na qualidade de vida. Hoje as gerações mais novas veem a relação com o trabalho de forma diferente. Não estão dispostas a dedicar tanto tempo ao trabalho, abrindo mão do lazer e do descanso. O que já mostra uma alteração de comportamento.

Cabe uma diferenciação entre trabalho e emprego. Este se refere à função ou cargo que a pessoa exerce numa instituição ou organização, enquanto que o trabalho é a relação por meio da ação, é o “conjunto das atividades realizadas por alguém para alcançar um determinado fim ou propósito”. O emprego, de forma geral, tende a diminuir e alguns postos de trabalho até extinguir. Vale salientar que a relação do homem com o emprego é uma relação previsível, onde se executa o que é determinado ou exigido pela função. Não há lugar para respostas alternativas, a solução é única. Já a relação do homem com trabalho é imprevisível, e há espaço para criatividade e a inovação, permitindo o surgimento de diferentes possibilidades, maneiras diversas de realizá-lo.

As atividades rotineiras darão lugar às máquinas, e as pessoas devem se preparar e estar atentas a habilidades como facilidade de se adaptar, disponibilidade a aprender, mente aberta ao novo, criar opções ao convencional. Faz se necessário pensarmos o que fazer para nos manter no mercado de trabalho. Uma coisa é certa, é preciso ser criativo e pensar diferente, inovar. Isso, passa pela melhoria de qualidade e reformulação da educação.

Para inovar devemos ter as diferentes dimensões da inovação caminhando em conjunto: desempenho científico e tecnológico; educação; ambiente econômico adequado; inovação e infraestrutura; e investimento e políticas públicas. É preciso refletir enquanto sociedade, qual o Brasil que queremos. Como se darão os rearranjos das ocupações numa sociedade em que a educação vem se deteriorando e o que investimos em inovação está muito distante das nações situadas na fronteira tecnológica. Pessoas, organizações e governos devem debater e discutir que direção seguir, atentando para o coletivo e o bem estar de todos. Os três elementos são igualmente importantes para que sustente o fluxo de renda e de bens num mercado livre.

Outro aspecto importante é como vamos lidar com a informalidade no mercado de trabalho. Postos de trabalho com carteira assinada, assim como estabelecimentos com registros de CNPJ, são ocupações formais que fazem contribuições de impostos, além de serem fiscalizadas por órgãos competentes, sendo ocupações que respeitam os direitos e deveres dos trabalhadores. A informalidade não apresenta esses atributos e vem crescendo nos últimos anos. A PNAD contínua do 3º.T de 2020 aponta 29.366 mil pessoas no setor privado com carteira assinada. E em relação ao trimestre anterior, houve queda de -2,6%; enquanto que trabalhadores sem carteira assinada são 9.013 mil pessoas, apresentando variação de 4,3% em relação ao trimestre anterior.

O mercado de trabalho vem se transformando, e conta com um percentual de trabalhadores informal crescente e uma sociedade que apresenta um grande contingente de trabalhadores de baixa instrução, como mostrado em alguns estudos de Fernandes e Menezes Filho (2002); Andrade e Menezes Filho (2005). Como fica essa massa trabalhadora? Temos que qualificar e preparar os trabalhadores para que consigam auferir sustento para sua sobrevivência e acompanhar esse movimento. É um grande desafio.

A transformação do mercado de trabalho nos faz reavaliar o seu sentido e ponderar a necessidade de atualização e desenvolvimento pessoal, nos traz o entendimento que a empatia e interação com as pessoas, fazem as mesmas mais criativas, estimulando a inovação e o pensar e fazer diferente. Fica a provocação de como conciliar as questões estruturais do emprego com a evolução do mercado de trabalho e suas exigências.

Referências:

ANDRADE, A. A. S. de; MENEZES FILHO, N. A. O Papel da Oferta de Trabalho no Comportamento dos Retornos à Educação no Brasil. Pesquisa e Planejamento Econômico — PPE, v. 35, n. 2, ago.,2005

FERNANDES, R. e MENEZES FILHO, N. A. Escolaridade e Demanda Relativa por Trabalho: Uma Avaliação para o Brasil nas Décadas de 80 e 90. In: Chahad, J. P. Z. e Menezes Filho, N. A. (Orgs.) Mercado de Trabalho no Brasil: Salário, emprego e desemprego numa era de grandes mudanças. São Paulo: Editora LTDA, 2002.

De NEGRI, F. Novos Caminhos para a Inovação no Brasil. Org. Wilson Center e Interfarma –Washington (DC), Editora Wilson Center, 2018.

https://www.dicio.com.br/trabalho/

https://ftp.ibge.gov.br/Trabalho_e_Rendimento/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domicilios_continua/Trimestral/Comentarios_Sinteticos/2020_3_trimestre/pnadc_202003_trimestre_comentarios_sinteticos_Brasil_Grandes_Regioes_e_Unidades_da_Federacao.pdf

https://www.youtube.com/watch?v=eoPXXKY1JhM

https://www.youtube.com/watch?v=ZuPKv_C7uZw

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Andreia Freitas
Economistas no Debate

Doutoranda e Mestre em Economia do Desenvolvimento (PUCRS), Especialista em Economia e Finanças (UFRGS), Graduada em Ciências Econômicas (FICM-RJ).