O PIB e a confiança dos agentes

Andreia Freitas
Economistas no Debate
4 min readJul 5, 2021

Hoje estamos vivendo momentos muito peculiares, únicos, repletos de transformações. Tempo em que a sociedade repensa seus hábitos, altera comportamentos, consumo; e até valores são colocados em cheque. Esse período mostra a capacidade do ser humano de se reformular em busca da sobrevivência. Evidencia o uso da criatividade para driblar as dificuldades; além disso, mostra a desigualdade do nosso país; e como é importante a ciência para uma nação sair da pandemia.

Assim como pessoas, empresas e governos também têm que se organizar e reavaliar suas ações, afim de que possam ter um resultado mais equilibrado possível. Financeiramente, para que possam manter ativas as suas atividades econômicas, e de forma sustentável, para que as decisões tomadas promovam menos desigualdade social e ambiental.

Num contexto tão conturbado e agravado pela crise sanitária da Covid-19, onde mudanças são necessárias e algumas aceleradas pelo momento; é válido olhar para as expectativas e o quanto influenciam no resultado.

Os índices de confiança da FGV-IBRE são ferramentas que auxiliam as decisões econômicas. Buscam por meio das pesquisas antecedentes monitorar o comportamento dos agentes, e assim antecipar os movimentos cíclicos da economia. Assim, através das expectativas dos agentes, esses índices apontam que valores abaixo de 50 pontos revelam falta de confiança, enquanto que valores acima mostram confiança. Conforme a Tabela 1, o Índice de confiança do empresariado (ICE), da Indústria (ICI), do Serviço (ICS), comércio (ICOM), da Construção (ICST) e do Consumidor (ICC), mostram um crescimento na confiança, a partir de março, que parece decorrer do próprio resultado do 1º. Trimestre de 2021, aliado à expectativa de uma campanha de vacinação mais rápida, com uma maior oferta de vacinas, além do início da produção nacional de vacinas.

Verificando o desempenho do PIB¹ no 1º.Trimestre de 2021, encontramos um aumento de 1,2% em relação ao trimestre anterior. Esse valor, pelo lado da produção, se deve principalmente pela elevação da agropecuária em 5,7%, destacando a soja; da indústria extrativa em 3,2%, decorrente do aumento de preços das commodities e da construção civil que subiu 0,1%. O lado da despesa aponta o crescimento da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) em 17%, atingindo 19,4% em comparação ao ano anterior (estimulado pela alta de máquinas e equipamentos e investimento em softwares).

Esse resultado do PIB surpreendeu as expectativas dos agentes e o resultado ficou acima da previsão divulgada em março pela Carta de Conjuntura nᵒ. 50 do IBGE, que apresentava queda de 0,5%

Comparando os índices de confiança com os resultados do PIB do 1º. Trimestre de 2021, verifica-se que os resultados foram melhores do que previstos pelos índices de confiança da FGV-IBRE. Indicando, que as expectativas influenciam o resultado e são também influenciadas pelo próprio resultado.

São muitas questões envolvidas e incertezas no caminho a percorrer, mas a expectativa é o que nos move. Se ela é positiva, vamos adiante, seja na economia ou na vida pessoal. Tempos incomuns, de instabilidade, como os de hoje, ressaltam a sua relevância. Dessa forma, devemos promover incentivos e mecanismos que estimulem boas expectativas. Promover políticas e ações, no sentido de desenvolver um mercado de trabalho mais capaz, de permitir que o empreendedorismo se torne mais sólido, de possibilitar um ambiente econômico menos burocrático, são exemplos de medidas que sinalizam que as coisas podem dar certo.

Políticas que integrem as esferas: governo, setor privado e sociedade em programas de desenvolvimento sustentável², são medidas relevantes. Como exemplo: a Criative Industries Task Force, uma alternativa para o crescimento econômico, frente à manufatura decadente, encontrada por Tony Blair em 1997. A estratégia envolvia vários setores no desenvolvimento das Indústrias Criativas, e fez o PIB do Reino Unido crescer em média 8% ao ano no período de 1997 a 2001; o que levou outras nações a olhar com atenção para o setor criativo.

Outra sugestão é olhar o mar como um setor econômico, assim como a agricultura e demais setores. Carvalho³ conceituou e mensurou a economia do mar do Brasil, encontrando 19% do PIB do Mar no PIB Nacional, o que coloca o Brasil em posição de destaque, pois apresenta o PIB do Mar maior que nações como Austrália, China, EUA, que são nações que consideram o mar como potencial econômico, e já apresentam grandes políticas voltadas para o mar.

Os exemplos citados são possibilidades de se promover e incentivar as atividades incluídas no projeto de cada setor (Criativo ou do Mar). Ambos agregam valor às ocupações decorrentes de suas atividades, além de participar, de forma efetiva na formação do PIB brasileiro. Ações destinadas a esses segmentos, de certa forma, também agregariam valor a atividades informais a eles relacionadas; o que permitiria um acréscimo de renda para as pessoas envolvidas com essas funções. Além disso, contribuiriam para amenizar os resultados da informalidade, considerada um desafio para o mercado de trabalho, que já vinha num processo de transformação, que se acelerou com a pandemia.

Referências Bibliográficas:

CARVALHO, A. B. Economia do Mar: Conceito, Valor e Importância para o Brasil, Tese de Doutorado — Programa de Pós Graduação em Economia do Desenvolvimento, PUCRS, Porto Alegre, 2018.

FLORIDA, R. A Ascensão da Classe Criativa Tradução: Ana Luiza Lopes, Porto Alegre: L&PM Editores, 2011.

REIS, A. C. F. Das Indústrias Criativas à Economia Criativa, In Economia da Cultura e Desenvolvimento Sustentável: O Caleidoscópio da Cultura. Editora Manole, Barueri, SP, 2007.

https://ciclo-economico-ibre.fgv.br/

https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/conjuntura/210601_nota_21_atividade_pib_2.pdf

¹ Carta de Conjuntura — IPEA.

² Reis, 2007.

³ Carvalho, 2018.

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Andreia Freitas
Economistas no Debate

Doutoranda e Mestre em Economia do Desenvolvimento (PUCRS), Especialista em Economia e Finanças (UFRGS), Graduada em Ciências Econômicas (FICM-RJ).