Bhakta Krpa
4 min readAug 11, 2015

Começa com um jazzão monstro do Bernard Herrmann,
o “Thank God for the Rain

Os trompetes entram cheios e murcham, tipo uma respiração profunda.

Os pratos seguem num som frisante enquanto o narrador entra por cima.

O dia não termina. Estou trabalhando há doze, catorze horas. Indo e voltando.
O mesmo maldito trajeto. Não faz diferença alguma.

Não me importo.
Doze, catorze horas. Pra mim pouco importa.

Me mantém ocupado e eu ganho algum dinheiro.

Um louco se jogou na frente do 809F/10.
O miserável nem terminou seu cachorro-quente antes de se matar.

No instante antes do impacto ele segurava o lanche no alto.
Essa imagem mexeu com quem estava ali na hora.

Ideias ruins foram surgindo e não demorou muito pra que incendiassem o ônibus.
O carro ainda desceu duas ou três quadras, sem ninguém no volante.

Totalmente em chamas.
Um ônibus fantasma.

Nunca se sabe quando um desgraçado desses vai pular na sua frente.

Os piores mal olham na minha cara.
A porta vai sempre abrir, eles sabem disso.

Só há um Rei e Juiz aqui. Procure pelo assento mais alto.

— Passa por baixo aí, fera, mas só dessa vez.

“Passa por baixo aí, fera”. Essa é a moeda.
Deviam pôr catracas nos mercados, seria tudo mais honesto.

Duas paradas depois, o sujeito desce.
Tempo suficiente pro Rei se acomodar.

Agora toca “Still Can’t Sleep/They Cannot Touch Her”,
na parte do sax, glorioso.

Betsy…

…no seu vestido branco.

A sujeira das ruas não a toca.
Devíamos dar uma volta. Ver um desses filmes suecos, tomar um café.

Não importa.

— Betsy! Preciso te falar…

— Beth, meu nome é BETH, ok? Some daqui senão eu vou gritar.

Não consigo fugir.

Sou um solitário.

— Ei, Tavares! Aonde você vai?