Catherine de Cleves e seu raro manuscrito sombrio

Editora Wish
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3 min readJun 28, 2019
As Horas de Catherine de Cleves

As Horas, de Catherine de Cleves, é um raro manuscrito holandês dos anos 1440, além de ser considerado uma das mais sofisticadas obras já criadas

Catherine de Cleves viveu um intenso drama político durante boa parte de sua vida. Prometida desde cedo a Arnold de Egmond, duque de Guelders e conde de Zutphen, uniu-se a ele em matrimônio em 1430, quando tinha apenas treze anos de idade. Ao longo dos dez anos seguintes, ela concebeu seis filhos em um casamento infeliz. Depois deste período, Catherine se recusou a seguir morando com o marido, passando então a residir em Nimega — no leste dos Países Baixos e atualmente próximo à fronteira com a Alemanha — e Lobith — uma aldeia na atual província holandesa de Gelderland.

Durante o período medieval, a região dos Países Baixos era consistida de vários ducados, condados e dioceses, todos pertencentes ao Ducado de Borgonha e ao Sacro Império Romano. Arnold estava envolvido em uma das várias guerras dispendiosas que aconteceram naquele tempo, e já não era um dos governantes mais bem-sucedidos da época. Forçado pela esposa a ceder o trono para seu filho, Arnold foi preso e permaneceu assim até meados de 1471.

Nesse ínterim, acredita-se que Catherine tenha sido responsável por encomendar “As horas”, um livro ilustrado com devoções para que ela pudesse orar ao longo do dia e, com isso, redimir seus pecados, esperando evitar a condenação eterna ao reino dos demônios, que na obra é retratada de maneira vívida. Algumas fontes também afirmam que o livro foi encomendado por sua família como presente de casamento.

Textualmente rica, além das tradicionais Horas da Virgem e Ofício dos Mortos, a obra também contém preces incomuns para as Horas de cada dia da semana, complementadas com uma Missa apropriada. O livro também apresenta um conjunto invulgarmente rico de cinquenta e sete sufrágios, ou petições a santos individuais.

O manuscrito contém 157 miniaturas das 168 originais, que revelam paisagens coloridas e interiores domésticos detalhados. Algumas delas retratam coisas do cotidiano, como vacas leiteiras, manteiga e pão assado. Outros estão cheios de borboletas, moedas, armadilhas para pássaros, frutas, até peixes meticulosamente representados, pintados sobre papel de prata.

O Mestre das obras foi um iluminador anônimo, mas estima-se que ele possa ter sido membro da família de pintores Van Aken, e suas obras são consideradas as melhores e mais originais iluminuras do norte da Holanda. O estilo é equilibrado e quase clássico, com igual atenção à representação naturalista e a harmonia da composição. Seu interesse pela representação realista de luzes e texturas deriva de predecessores como Jan Van Eyck e Robert Campin, e compartilham muitas semelhanças. No entanto, ao longo das Horas, pode-se observar o crescimento e amadurecimento do estilo de seu criador, desenvolvido ao longo dos anos que a obra levou para ser concluída. As últimas miniaturas foram retratadas com imaginação e originalidade, com as cores vibrantes que caracterizam a pintura. Sua atração por gêneros e objetos do cotidiano — muito à frente de seu tempo — foi florescer na pintura holandesa de natureza morta durante o século XVII.

Imagens: The Morgan Library and Museum

Enciclopédia Do Incrível ao Bizarro, Editora Wish, 2019

As Horas é um dos livros presentes na Enciclopédia Do Incrível ao Bizarro.

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