Predomínio dos meios digitais e pouca mídia impressa: hábitos de consumo de informação nas faculdades de Comunicação

sofia lungui
Editorial J Famecos
6 min readAug 9, 2017

Levantamento realizado pelo Editorial J investiga a maneira como estudantes de Comunicação no Rio Grande do Sul consomem informações

Por Sofia Lungui (3º sem.)

Majoritariamente pelo celular por meio de redes sociais, regularmente pela televisão e rádio, com menor frequência pela mídia impressa. É dessa maneira que estudantes de Comunicação no Rio Grande do Sul consomem informações, de acordo com uma pesquisa realizada pelo Editorial J, com o objetivo de mensurar, caracterizar e analisar o consumo de informação. Com as plataformas digitais cada vez mais presentes na vida das pessoas, o jornalismo vem passando por diversas transformações, o que impacta diretamente nas maneiras de consumir informação. Com os futuros comunicadores não é diferente, por isso é importante analisar que hábitos estão seguindo nos últimos tempos. Perpetuando uma tendência da juventude brasileira em geral, os formatos mais utilizados pelos estudantes são os dispositivos digitais: 77,4% dos entrevistados leem notícias pelo celular ou outro dispositivo todos os dias.

Aplicado durante o encerramento do 29º Prêmio SET Universitário, em setembro do ano passado na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), o levantamento questionou estudantes de Comunicação quanto aos seus hábitos de consumo de informações, tanto no que se refere à frequência com que o fazem como às plataformas, formatos e canais de informação que mais utilizam. Ao todo, foram coletadas 168 respostas; o número é relevante, levando em conta o número de pessoas no evento — cerca de 190, conforme o Núcleo de Eventos e Relacionamento (NER) da Faculdade de Comunicação Social da PUCRS (Famecos).

Distribuição por cursos. Os estudantes de Jornalismo são os maiores usuários de celular para consumo de notícias

Dentre os entrevistados, 41,7% estudam Jornalismo, 36,9% Publicidade e Propaganda, 14,3% Relações Públicas e 6,5% Produção Audiovisual. Além disso, 90,5% deles têm entre 16 e 25 anos e 61,9% são mulheres. O consumo de telejornalismo é regular: 47% consomem todos os dias, enquanto 37,5% consomem conteúdo de emissoras de rádio todos os dias. As diferenças de frequência de consumo entre as mulheres e homens são mínimas. Em contrapartida ao largo uso dos formatos digitais, 20,2% do total de estudantes afirmaram que nunca leem jornais impressos.

Distribuição por cursos. Os que menos lêem jornais impressos são os estudantes de Publicidade e Propaganda. Os que mais consomem mídia impressa são os estudantes de Jornalismo

Para Leandro Beguoci, jornalista e diretor editorial da revista Nova Escola, a análise destes padrões de comportamento pode indicar quais formatos irão ganhar destaque no futuro. “O consumo dos estudantes pode nos dar pistas sobre outras formas de fazer jornalismo. Se poucos estão consumindo newsletters, por exemplo, talvez exista algum problema, talvez não seja bom o suficiente”, afirmou. Apenas 1,2% dos acadêmicos responderam que utilizam newsletters para consumir conteúdo. 37,2% acessam os portais dos veículos de comunicação para ler notícias, embora este hábito esteja sendo cada vez menos praticado.

As redes sociais, plataformas que fazem parte do dia-a-dia das pessoas, lideram o consumo dos estudantes: 62,5% preferem acessar notícias por meio delas. Este fenômeno resulta em algumas mudanças de hábitos, como o consumo fragmentado ou acidental de informações. Como ilustrou uma pesquisa qualitativa divulgada pela Revista Anfíbia, feita com jovens leitores de 18 a 29 anos na Argentina, os consumidores passaram a ter atitude passiva, pelo fato de que estão deixando de buscar as informações, porque deparam com elas espontaneamente nas redes sociais, como o Facebook.

A animação, produzida pelo Columbia Journalism Review, resume o estudo de Ricardo Gandour sobre como a fragmentação digital está moldando a forma de consumir e produzir notícias

Contudo, o fenômeno se torna negativo para os futuros comunicadores quando a distribuição de conteúdo é desigual e os leitores não buscam diversificar as fontes de informação, explica Rodrigo Müzell, editor das notícias de Porto Alegre na Zero Hora. “Se o estudante está acostumado a buscar informações somente no Facebook, está sujeito à curadoria de um algoritmo. O algoritmo (do Facebook) restringe as fontes, pois privilegia o tipo de conteúdo que o usuário costuma receber; a tendência é que se tenha diversidade muito menor. Isso é perigoso para estudantes de Jornalismo, especialmente, que devem ter contato com coisas diferentes”, argumentou.

Outro aspecto negativo da distribuição de informações por meio de plataformas digitais é a ausência de relação financeira entre os veículos de comunicação e estas plataformas. O Facebook, por exemplo, é uma das ferramentas mais utilizadas para distribuição de conteúdo online. Mesmo após mudanças no algoritmo da rede social que priorizam postagens de amigos e familiares, boa parte dos feeds das redes sociais é ocupada por notícias, sem que os veículos recebam pela divulgação deste conteúdo. Segundo matéria d’O Globo, algumas empresas de comunicação norte-americanas estão se unindo para entrar em acordo conjunto com o Google e o Facebook, de maneira a conseguir isenção limitada da lei antitruste dos Estados Unidos.

“O consumo de informação passa por essas grandes plataformas digitais, que não assumem as responsabilidades editoriais que têm, pelo menos até então. São empresas de tecnologia que distribuem conteúdo de maneira geral, inclusive jornalístico. Portanto, a própria lógica de como estas plataformas funcionam influencia na produção do jornalismo e na maneira como as pessoas consomem o jornalismo”, analisou Moreno Osório, fundador da iniciativa digital Farol Jornalismo e professor na graduação em Jornalismo da Famecos (PUCRS).

Leandro Beguoci resumiu em seu texto “A reinvenção do jornalismo”: “A atenção migrou das plataformas integradas de produção e distribuição para as plataformas de distribuição e interação. A gráfica e o caminhão, a antena e a mesa de centro agora são sociais — e estão ficando móveis”, ressaltou. Por outro lado, as redes permitem grande interação entre os veículos e o público, aproximando as empresas de comunicação de seus públicos.

Entre as plataformas digitais, em todos os cursos as redes sociais e os portais dos veículos são o maior meio de acesso às informações, como é possível ver no gráfico abaixo. Apesar disso, alguns estudantes de Cinema e de Relações Públicas afirmaram não utilizar dispositivos digitais para ler notícias.

Distribuição por cursos. Em todos os casos, as redes sociais são o maior canal de acesso às notícias. Somente estudantes de Jornalismo fazem uso de newsletters para consumo de informação

Redes sociais como Twitter e Facebook também são terreno fértil para as notícias falsas — as conhecidas fake news, que passam despercebidas até mesmo por estudantes e jornalistas, muitas vezes. Para Müzell, a interatividade das redes sociais torna esse ambiente mais favorável para a disseminação de notícias falsas. “O algoritmo das redes permite que a gente receba fake news mais facilmente quando são compartilhadas por amigos. Além disso, há estudos que comprovam que quando alguém que conhecemos carimba uma informação, isso se torna mais confiável, por mais que a gente não perceba, fazendo com que demos credibilidade a essas informações”, opinou.

No entanto, em meio à era da pós-verdade, uma oportunidade para os jornalistas surgiu: a de servir como filtro de confiança para as mentiras, conforme Beguoci. Essa função pode e deve ser explorada por estudantes e profissionais, e no Brasil vem ganhando força com projetos de checagem de informações como o Aos Fatos. “É inegável que as redes sociais permitiram que a mentira tivesse escala, é muito fácil mentir para as pessoas hoje. Para os estudantes, uma medida para não ser enganado é desconfiar e analisar quando as pessoas concordam muito com alguma coisa”, informou o jornalista.

Independente do formato, os estudantes devem valorizar e consumir conteúdo relevante; mesmo assim, a média de consumo de informação dos brasileiros em geral é mais baixa do que a dos acadêmicos, acredita Beguoci. “A maior parte dos brasileiros nunca leu um jornal impresso na vida. As pessoas estão redescobrindo o valor do jornalismo”, afirmou.

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sofia lungui
Editorial J Famecos

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