Centenário da primeira travessia aérea do Atlântico Sul

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8 min readJan 4, 2023

A aventura que começou com uma viagem experimental à ilha da Madeira

Hidroavião da primeira travessia aérea Lisboa-Funchal, na baía do Funchal | 1921–03–28 | PERESTRELLOS PHOTOGRAPHOS | Fotografia colorida através de IA |

A proeza protagonizada a 22 de março de 1921, pelos pilotos Sacadura Cabral e Ortins Bettencourt, o navegador Gago Coutinho e o mecânico Roger Soubiran, a bordo do hidroavião Felixstowe F3, implicou uma viagem de sete horas e meia. Foi o primeiro raid aéreo Lisboa-Funchal.

Hidroavião Felixtowe F.3, dos aviadores Gago Coutinho e Sacadura Cabral | PHOTOGRAPHIA VICENTE | Fotografia colorida através de IA |

Esta viagem não foi opção de acaso, nem resultado de uma mera aventura infundada. Tratava-se de fazer chegar o hidroavião à baía do Funchal ao longo de uma navegação precisa e limitada em termos de combustível.

A concretização da ligação aérea entre Lisboa e o Funchal foi o grande teste para o sucesso da primeira travessia aérea do Atlântico Sul entre Lisboa e o Rio de Janeiro, realizada em 1922.

Hidroavião da primeira travessia aérea Lisboa — Funchal, na baía do Funchal | 1921–03–22

Antes de iniciarem a aventura de ligar Portugal ao Brasil pelo ar, os dois aeronautas portugueses, Gago Coutinho e Sacadura Cabral, tinham de testar em termos práticos os métodos de navegação aérea que haviam treinado em conjunto. Para isso, programaram uma viagem experimental à ilha da Madeira, precisamente para experimentar o sistema de navegação aérea. Usaram para o efeito o primeiro sextante com horizonte artificial concebido e aperfeiçoado por Gago Coutinho e um outro instrumento construído com a colaboração de Sacadura Cabral, a que deram o nome de «plaqué de abatimento» ou «corretor de rumos», que permitia calcular (e corrigir) de forma simples e diligente o rumo a seguir.

Sem comunicação prévia à imprensa, o hidroavião descolou do Tejo às 10h25m, do dia 22 de março de 1921. Durante o voo, o vento esteve sempre favorável e os navios que iam sobrevoando deram indicações de que mantinham a linha de navegação Lisboa-Madeira.

Um voo que durou 7 horas e 40 minutos

Às 18h04, na baía do Funchal, amararam os heróis. Foi um voo que durou 7 horas e 40 minutos, sem registo de qualquer incidente, na qual foi mantida uma navegação rigorosa, integrando as técnicas de navegação desenvolvidas pelos aeronautas portugueses.

| Fotografia colorida através de IA |

Durante os dias seguintes foram agraciados com inúmeros eventos sociais, que foram retribuídos com voos de cortesia às elites madeirenses.

Estava demonstrado que era possível navegar sobre o mar, utilizando métodos astronómicos, sem os aviadores se perderem, conduzindo com segurança, para pontos de grande precisão, as suas aeronaves.

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Essa conquista ninguém a rouba aos Portugueses que, no século XX, igualaram no ar os feitos náuticos dos seus maiores do século XV.

Faltava, agora, ligar com a mesma precisão científica, Portugal ao Brasil. O ano de 1922 era o mais propício para o fazer, porque nele se comemorava a independência desse filho distante, mas muito querido no coração dos Portugueses.

Travessia aérea Lisboa — Rio de Janeiro | Sacadura Cabral e Gago Coutinho antes da partida | 1922–07–06 | Lisboa | Fotografia colorida através de IA |

100 anos depois… a exposição itinerante

A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) associou-se à organização para a celebração do centenário da primeira travessia do Atlântico Sul em avião, realizada por Gago Coutinho e Sacadura Cabral, garantindo desta forma um reconhecimento internacional àquele feito.

Com a coordenação científica da Professora Doutora Fernanda Rollo, a exposição é composta por 10 painéis que retratam as várias fases da viagem destes dois heróis portugueses.

A Região Autónoma da Madeira continua na rota deste feito histórico

No dia 11 de novembro, pelas 17 horas, no Salão Nobre do Governo Regional, realizou-se a abertura desta exposição com a presença do Secretário Regional de Educação, Ciência e Tecnologia, Jorge Carvalho, e o Presidente da Comissão Nacional da UNESCO, Embaixador José Filipe Moraes Cabral.

Segundo o Embaixador, foi com especial agrado que a Comissão Nacional da UNESCO acolheu o desejo das autoridades madeirenses de apresentar esta exposição no Funchal «enriquecendo-a com contributos de grande valia, que respeitam à ligação especial daqueles dois pioneiros da aviação com a Madeira».

Registo da memória do mundo

A importância deste feito fica ainda demonstrada nas palavras do Embaixador, quando referiu que desde 2011 «o relatório da travessia aérea, elaborado pelos seus dois “atores”, faz parte do Registo da Memória do Mundo, um programa da UNESCO destinado a incentivar a preservação, conservação e divulgação de documentos considerados de maior relevância histórica para a humanidade, passando a estar a par de outros marcos de primeira grandeza da História da Expansão Marítima Portuguesa como a Carta de Pêro Vaz de Caminha, o Tratado de Tordesilhas ou o diário da viagem de Vasco da Gama à Índia».

O evento terminou com uma visita guiada à exposição conduzida por Eduardo Simões, coordenador do Núcleo de Arquivo da Secretaria Regional de Educação, Ciência e Tecnologia.

Inauguração da Exposição do centenário da primeira travessia do Atlântico Sul em avião

A síntese do evento em vídeo

Apontamentos históricos pouco conhecidos

Ao longo da visita foram abordados episódios inusitados e peripécias pouco conhecidas do público.

Sabia que…

O hidroavião ‘Lusitaniana’ foi batizado à revelia dos pilotos. Sacadura Cabral depois escreveu que «não gostava». Tinha prometido a uma atriz inglesa que havia conhecido no comboio Paris/Londres, e que era entusiástica da aviação, que ia batizar um hidroavião com o seu nome.

… ou ainda que…

A aeronave que fez a travessia transportava uma garrafa de vinho do Porto da casa ‘Ramos Pinto’ que, segundo Sacadura Cabral, seria usada para “situações extremas” e que se relata ter chegado vazia, não se sabendo ao certo o destino do seu conteúdo. Atualmente, essa garrafa histórica, assinada pelos aviadores, está em exposição no Museu Adriano Ramos Pinto, situado em Vila Nova de Gaia.

Estas e mais histórias deixaram o mote para uma visita à exposição posteriormente acolhida no Espaço ‘EntreArte’, à entrada da SRE.

Imagens da exposição que esteve patente no Espaço ‘EntreArte’

Os dez painéis que constituem a exposição itinerante ganharam, no Espaço ‘EntreArte’, alguns elementos adicionais referentes à viagem experimental realizada em 1921. Foram expostas cópias de fotografias que pertencem ao espólio do Museu de Fotografia da Madeira — Atelier Vicente’s, e a cópia do documento de fundação do Monumento que assinala a Travessia Aérea do Sul do Oceano Atlântico.

Segundo a informação site da Direção Regional de Arquivo e Biblioteca da Madeira, o monumento ao aviador foi mandado erigir pelo banqueiro Henrique Augusto Vieira de Castro. Sacadura Cabral assistiu ao lançamento da primeira pedra, a 28 de março, tendo a sua inauguração ocorrido a 22 de março de 1923.

Cerimónia no Jardim Municipal do lançamento da primeira pedra do monumento em homenagem aos aviadores Gago Coutinho e Sacadura Cabral pela travessia aérea Lisboa-Funchal | 1921–03–28

Curiosamente…

Documento fundador do lançamento da primeira pedra do monumento que comemora a primeira viagem aérea à ilha da Madeira | Exposto no Teatro Municipal Baltazar Dias é propriedade da Câmara Municipal do Funchal

Fique com a galeria de imagens da exposição:

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