ELLAs no PODER: Parlamento Feminista Latino-americano delibera o primeiro fórum mundial de mulheres para 2020
Por Tainá Aragão| Cobertura Colaborativa Ella 2018
Apesar do avanço liberal e conservador na América Latina, diversas mulheres progressistas fazem frente em campanhas eleitorais, e muitas delas, estão sendo eleitas nos parlamentos deliberativos de representação política. Dentro da estrutura governamental de um regime constitucional, através da legitimidade do voto e levando pautas que representam as minorias sociais, essas mulheres, assumem e constroem junto à população mais marginalizada do nosso território políticas inovadoras de acesso.
ELLA reuniu representantes dessa potência e de movimentos sociais para debater e deliberar de forma conjunta uma agenda de estratégias para expansão e defesa das pautas progressivas que incidem diretamente na vida das mulheres.
A semente para a realização do Parlamento Feminista vem germinando desde 2016, ano no qual foi realizado o Encontro Movimenta — Forúm Ibero-Americano de Mulheres Políticas anti-patriarcado, para Democracia e Autonomias- realizado na Bolívia. Neste momento, coletivos e representantes de 11 países se reuniram, e começaram a desenvolver uma série de ações conjuntas, criando dispositivos para impulsionar a participação das mulheres na política.
A Campanha de Mulher, que reuniu diversas comunicadoras brasileiras de forma colaborativa para contribuir na campanha de candidatas nas eleições de 2018 é um dos exemplos bem sucedidos desse projeto, onde 28 mulheres que participaram do projeto foram eleitas com apoio colaborativo e solidário em comunicação.
O Parlamento Feminista nesta 4º edição do ELLA é o resultado de diferentes frentes de empoderamento de mulheres: representa a construção de outro poder, comunal, interseccional, feminista e diverso, apresentando uma nova arquitetura de organização e diálogo possível, que hackeia os manuais fundamentalistas de fazer política. Nesse sentido, o Parlamento foi dividido em dois momentos, o primeiro centrado no diagnóstico conjunto de direitos humanos na América Latina e osegundo bloco, trabalhando discussões para uma agenda feminista continental.
No bloco de análise conjuntural é possível perceber que algumas problemáticas são cortantes na América Latina: o crescimento do desemprego, a violência de gênero, a violência para com as comunidades tradicionais, a desigualdade e racismo estruturais, o crescimento das igrejas pentecostais com a insistência em legislar sobre os corpos femininos, são algumas destas problemáticas.
Para a deputada Jandira Feghali (BRA), o Brasil protagoniza um período de retrocesso contínuo desde o Golpe que retirou da presidência a primeira mulher eleita Presidenta do Brasil, Dilma Rousseff.
“Estamos numa situação de grande risco das nossas instituições democráticas, e perseguição de militantes de esquerda, de morte de ativista de direitos humanos, como de Marielle Franco. Por outro lado elegemos muitas mulheres progressistas, e por isso, temos esperança na consolidação de uma frente para possamos colocar em prática estratégias de resistência.”
O contexto chileno foi apresentado por Constanza Schonhaut, advogada e militante feminista. A violência de gênero é algo latente no país, e o crescimento da direita tensiona ainda mais a invisibilidade destas violências.
“No Chile vai crescendo em escalas grandes a ultra-direita, mas também temos uma onda feminista, a maré verde também chegou a Chile e estamos organizadas e vamos lutar pela justiça social.”
Lucía Ixchiu (GUA), mulher indígena K´iche e fundadora do espaço Festivales Solidarios, explicou que a Guatemala firmou um acordo de paz há vinte anos, desde então o país está em período de pós-guerra, porém, a paz, segundo ela não existiu no país centro-americano.
“A paz para o Estado imperialista e patriarcal só legitimou a invasão e exploração do nosso território. Na Guatemala, 60% da população é indígena, em sua maioria mulheres, e nos encontramos também com a maioria da pobreza extrema.”
“Contudo, não me impressiona que o Estado nos queira neste lugar, porque eles sabem que as mulheres independentes mudam as coisas, e por isso, querem nos submeter mais a pobreza. Contudo, a maré verde também chegou a Guatemala, e estamos imersas em uma luta permanente para a dignidade, e não somos ‘pobrecitas’, podemos nos valer por nós mesmas”, afirma.
O Uruguai é um dos únicos países da América Latina que permanece em governo progressista. Beatriz Rocco (URU), do Comité Feminista del Frente Amplio pontua os desafios cruciais para os próximos anos no país.
“No Uruguai temos um duplo desafio, por uma lado somos um dos poucos governos de esquerda que ainda resta no continente. Por outro, temos o grande desafio de continuar em um governo progressista. Ainda nos falta, e nos falta muito, e temos uma candidata mulher para as próximas eleições, temos esperança que continuaremos na luta por um país mais justo e equitativo”.
Silvia León (ARG), Secretaria de Organización del Consejo Directivo Nacional de Asociación Trabajadores del Estado, afirma que a luta na rua continua sendo de extrema importância para a construção da liberdade.
“Temos que continuar lutando internacionalmente, latinoamericanamente em paradas conjuntas para que a liberdade de mulheres, lésbicas, travestis e todas as diversidades sejam respeitadas e livres”.
“A revolução Bolivariana segue viva e segue latente no povo venezuelano.”
Essa foi a primeira frase de Guillermina Soria, argentina que mora na Venezuela, Comunicadora Social e sua tese no mestrado foi baseada em estudos sobre as mulheres. Ela explica que o contexto de guerra no qual seu país está imerso, se expressa de diferentes formas e em diferentes âmbitos.
“Uma guerra midiática, política em ataque a democracia venezuelana, e um ataque sistemático, sobretudo, ao projeto político chavista, onde sua aposta se centra no socialismo e no sistema comunal. As mulheres tem sido a principal base de sustentação da revolução bolivariana, e por isso, espero que a solidariedade entre nós se expresse de maneira concreta e contundente.”, finaliza Soria.
Marielle Ramires, fundadora do Fora do Eixo e da Mídia NINJA, falou sobre a conjuntura atual do Brasil, frente ao resultado da eleição à presidência da República em 2018.
“A resistência na verdade são eles. Nós somos o novo tempo que chegou e veio pra ficar, nós estamos juntas e vamos construir um novo mundo que todas nós queremos e vamos ter no final.”
Diante do mosaico de parcialidades e peculiaridades, cuja potência incide nesta conjuntura política de grandes desafios, as mulheres presentes no Parlamento Feminista deliberaram a emergente necessidade de organizar uma agenda continental. Algumas propostas de articulação foram aprovadas, no que se refere a criação de uma rede comunicativa para campanhas de solidariedade, com alguns temas que envolvem pobreza e violência econômica contra mulheres, violência política, racial, contra LGBTQI, e feminismo e democracia. Além disso, foi acordado a continuidade da articulação conjunta do movimento 8 de março.
O ponto alto do Parlamento foi a deliberação do Fórum Social Mundial de Feminismos, previsto para a realização em 2020, indicado pela deputada brasileira eleita em São Paulo, Isa Penna (PSOL). Esse movimento transgressor e plurifeminista pretende reinventar a política continental. A proposta de expansão visa ganhar novos horizontes e expertises das outras esferas do mundo, compondo olhares complexos e tecidos juntos através da resistência. Para assim, fazer com que a primavera feminista floresça nos quatro cantos no mundo.