A Importância do Diálogo e da Aceitação para o Progresso Humano: “The Death and Life of Marsha P. Johnson”

Vamos fazer uma viagem através de um documentário, profundamente inspirador e poderoso, em busca da Aceitação e do Progresso Humano

MikeSemantics
Emotions in Motion
6 min readNov 22, 2023

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Fonte: AdoroCinema

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Filme Documentário: The Death and Life of Marsha P. Johnson

Ano: 2017

Realizador: David France

Argumentista (s): David France, Mark Blane

Produtor (s): David France, L. A. Teodosio, Joy A. Tomchin, Kimberly Reed

Editor: Tyler H. Walk

Banda Sonora: Bryce Dessner

Entrevistados em destaque:

· Victoria Cruz

· Sylvia Rivera

· Família de Marsha P. Johnson — irmã Jean Michaels, irmão Robert Michaels e sobrinho Al Michaels

· Randy Wicker

· Ativistas da Comunidade

· Eddie DeGrand

· Matt Foreman

O terceiro filme, em análise na publicação, é intitulado The Death and Life of Marsha P. Johnson, realizado por David France e lançado, em 2017, pela produtora Public Square Films (com a distribuição da Netflix).

Vivemos numa época de reestruturação social e de procura de retificação de erros cometidos no passado. Pondo isto, não poderia deixar de abordar The Death and Life of Marsha P. Johnson, um dos documentários mais esmagadores e importantes da atualidade, que evidencia as piores facetas do ser humano e da luta dos que sofrem às suas mãos por, somente, quererem ser aquilo que são.

Idealizado pelo ativista LGBT e realizador David France, o documentário centra-se na investigação de Victoria Cruz, ativista e consultora de violência doméstica, em torno da morte, suspeita e nunca resolvida em 1992 (noticiado pela polícia como um alegado suicídio por afogamento, no rio Hudson, junto ao Christopher Street Pier em Greenwhich Village, Manhattan, Nova Iorque), da ícone transgénero Marsha P. Johnson, uma das figuras mais preponderantes, entre a década de 60 e 90, do movimento dos direitos transgénero e LGBT nova iorquino.

Ao longo do filme, temos o privilégio de acompanhar Cruz, na sua incessante procura de respostas, através de entrevistas antigas e recentes com ativistas LGBT, familiares e amigos de Johnson, como por diálogos estratégicos com os seus colegas do Anti-Violence Project (estabelecimento em Nova Iorque, onde trabalhou desde 1997 até à sua reforma), demonstrando a sua paixão e chamamento, em busca de justiça social, provido de tanta dor e sofrimento.

Fonte: YouTube | Breve História de Marsha P. Johnson

The Rosa Parks and Mother of “our movement”

Uma das partes iniciais do documentário, e das que mais me cativou, foi o seu propósito educacional e de contextualização histórica. Não só nos faz perceber as ramificações do movimento LGBTQIA+, como também nos relata e detalha a história da Marsha “mayor of Christopher Street” Johnson e de Sylvia Rivera, a sua amiga de longa data e Mother of our movement.

Ao se terem conhecido aos 12 anos de idade, a afro-americana de Nova Jérsia e “Rosa Parks” do movimento Johnson (nascido Malcolm Michaels Jr.), e a porto-riquenha nova iorquina Rivera foram duas das “forças condutoras” para a revolução sexual, perpetuada, no final da década de 60, pelo Stonewall Uprising e Gay Liberation Front.

Ao não só terem cofundado o grupo ativista STAR (Street Transvestite Action Revolutionaries, entre 1970 e 1973), focado no suporte a prisioneiros gay, acolhimento de juventude homossexual, transgéneros e sem abrigos oprimidos e violentamente e sexualmente agredidos por gangues e forças policiais, como também pela sua contribuição, como ativistas da AIDS Crisis pela ACT-UP, durante a década de 80, são relembradas e acarinhadas pela comunidade LGBTIQ+ como guerreiras que, apesar da pobreza e miséria que suportaram, tinham orgulho em si próprias e no que defendiam.

Embora nunca tenham tido o reconhecimento que mereciam em vida, pela sociedade em geral, o legado de Johnson e de Rivera continua por membros da comunidade como Victoria Cruz, Eddie DeGrand (jovem estagiário na AVP), ativistas e Randy Wicker (melhor amigo e colega de quarto de Johnson durante 12 anos), fazendo-nos querer ser mais informados e estar a par do que nos rodeia, com o objetivo de apelarmos à inclusão e aceitação, em vez da exclusão e incompreensão.

I’ll always be known reaching out to young people who have no one to help them out, so I help them out with a place to stay or some food to eat or some change for their pocket — Marsha P. Johnson

Fonte: YouTube | Sylvia Rivera na Marcha “Pride” — 1973

“Where is the T?”

Outro dos pontos importantes a reter é a importância da entreajuda e empatia entre membros da mesma comunidade, notoriamente assinalado em duas cenas: o discurso de Sylvia Rivera, durante a Marcha Pride de 1973, e o diálogo entre Cruz e o ativista comunitário Ted McGuire.

Enquanto na primeira cena se assiste a um apelo furioso de Rivera, em torno da vergonha que sente pela ostracização feita a transgéneros pela comunidade gay, na segunda vemos McGuire realçar a questão salientada há 40 anos atrás, apelando assim à necessidade de sentido de companheirismo, dentro da própria comunidade LGBTQI+. Tal como tantas outras comunidades, esta, por vezes, excluí os seus apesar de todos lutarem pelo mesmo: direitos humanos e liberdade de expressão.

Fonte: YouTube | Clípe do Filme Documentário “The Death and Life of Marsha P. Johnson”

“How many years has it taken people to realize that we are all brothers and sisters and human beings in the human race?”

Infelizmente, esta frase por Johnson é mais relevante que nunca, quer em termos políticos, económicos, raciais e de orientação sexual.

Durante o filme, somos catapultados para as dificuldades económicas e dura realidade de uma comunidade LGBT ostracizada pela sociedade, assediada e morta por gangues e forças policiais sem quaisquer consequências, remorsos ou sentido de responsabilidade para com as familiares e amigos das vítimas. Isto é evidenciado pelas sucessivas tentativas de Cruz em averiguar o sucedido em torno da morte de Johnson; em que, pela ajuda de gravações fornecidas por Wicker, a levam a interrogar diversas pessoas que comprovam a desumanidade e intolerância existente na sociedade.

Quer por telefonemas hostis entre Cruz e ex-polícias reformados envolvidos no caso na altura, ao não terem o mínimo interesse em cooperar; entre Cruz e Matt Foreman, o ex-diretor da AVP, sobre as constantes ameaças pelo desejo de querer saber mais sobre o caso; e entre Cruz e uma auxiliar, ao perguntar sobre os registos de autópsia de Johnson (alegando ser o único caso que, do ano de 1992, não tinham qualquer arquivo), isto leva-nos a acreditar, ainda mais, na suspeita de adultério de provas e de possível homicídio.

Esta reflexão é, ainda mais notória, quando nos deparamos com as entrevistas recentes a inúmeros ativistas LGBT, à porta do tribunal em 2016 e a acompanhar o longo julgamento de James Dixon, um homem sentenciado a 12 anos de prisão, por homicídio, em 2013, de uma mulher transgénero chamada Islan Nettles; obrigando-nos a pensar sobre a falta de direitos humanos contra a comunidade LGBTIQ+, o realizador faz-nos aplicar um paralelismo entre o caso de Johnson e de Nettles. Em qualquer um dos casos, e apesar das ligeiras melhorias ao longo das décadas, os crimes de ódio e de preconceito continuam a não ser levados com seriedade e sentido de responsabilidade.

Não só nos traz questões dúbias e inconclusivas, como também nos faz pensar sobre o papel que queremos ter no mundo: contribuir para o apreço e respeito pelo próximo, ou suportar a falta de caráter e de desumanidade.

History isn’t something you look back at and say it was inevitable, it happens because people make decisions that are sometimes very impulsive and of the moment, but those moments are cumulative realities” — Marsha P. Johnson

“Come on girl. Chin up”

Uma frase tão simples, mas que simboliza, tão bem, a força e ambição que qualquer ser humano tem que ter para enfrentar os seus obstáculos.

Ao ser dito na última cena do documentário por Victoria Cruz, após entregar os ficheiros recolhidos durante a investigação ao FBI, resume perfeitamente a capacidade de superação do ser humano oprimido e resiliente, igualmente imortalizado por outras protagonistas, como a sua amiga de longa data Sylvia Rivera.

Ao ter enfrentado longos anos a viver na rua, na juventude, e depois novamente após a morte de Johnson (durante alguns anos, ao se ter viciado em álcool e quase suicidado), conseguimos observar o rejuvenescimento de Rivera, ao ter sido acolhida pelas suas amigas drag na “Transy House” e retomar a sua caminhada ativista pelos direitos LGBTQIA+, espalhando a sua mensagem por diversos países internacionalmente e sendo respeitada pela comunidade no seu todo.

Esta prometeu, a si mesma, continuar o legado de Marsha até à sua morte (de cancro no fígado em 2002), em busca de um mundo mais uniforme que não olha para riqueza, cor de pele, sexo ou orientação sexual, mas sim para seres humanos merecedores de respeito, de compreensão e de aceitação.

“When an individual is protesting society’s refusal to acknowledge his dignity as a human being, his very act of protest confers dignity on him” – Bayard Rustin

Onde ver The Death and Life of Marsha P. Johnson: Netflix

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MikeSemantics
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