Vamos conversar sobre mudanças de carreira? Aqui eu te conto como ter sido desenvolvedora me fez a PO que sou hoje.

Carolina Arashiro
#EmpiricusTech
Published in
7 min readMar 19, 2021

Já reparou como na vida somos cobrados a seguir um roteiro sempre em linha reta? Como aqueles ao nosso redor nos questionam apenas sobre o próximo passo nesses mesmos trilhos? Profissionalmente nós vivemos aquele roteiro:

  • “Qual faculdade vai fazer? Escolha direitinho, afinal, trabalhará com isso por anos!”
  • “Agora que já começou esse curso, tem que ir até o final”
  • “Agora que se formou vai pra área A ou B?”
  • “Agora que já está na área A há tanto tempo, deveria se especializar nesse tema”

Ufa! Se você cansou de ler esse trecho, imagine viver isso, escorregando por um funil que leva a algum lugar conveniente, porém entediante ou estressante.

Esse é o destino de todo mundo que segue essa linha reta? Claro que não. Esse roteiro é bastante lógico e está aí após ter sido validado por gerações de trabalhadores. Se estiver feliz assim, vai fundo!

Mas hoje quero falar sobre esse outro grupo que pode já ter olhado para o fundo desse funil com carinha de desânimo. Para isso quero dividir para conquistar, vamos colocar a objetividade e a subjetividade para trabalhar.

Primeiro, para os apressadinhos, a objetividade.

Como é para um ex-Desenvolvedor se tornar um Product Owner (PO)

Quando você é um desenvolvedor, de modo geral, tem pouca participação na escolha de suas tarefas, recebe uma necessidade já especificada e validada para que, de posse de seu conhecimento sobre a tecnologia, atenda a essa necessidade através dos códigos que escreve e ferramentas que possui.

Eu fui desenvolvedora desde o início da minha carreira. Parte do motivo é que é relativamente mais fácil entrar no mercado de trabalho como programadora do que outras funções quando você está em um dos cursos superiores da área de computação. Mas o principal é que programação é uma coisa mágica. Você passa a ser capaz de sair do “eu gostaria que fosse diferente” para “agora ficou ótimo” com suas próprias mãos. Você também passa a entender um pouco melhor como a tecnologia dá suporte a todo tipo de tarefa e pode ver os frutos do seu trabalho ganharem vida!

Apesar de ter essa trajetória mais técnica, sempre gostei de entender e me envolver com os temas e questões do negócio, sendo aquela mãozinha levantada que pergunta “Por que isso é assim?” ou “Por que não é desse outro jeito?”. Sendo sincera, meus olhos brilham mais pelos requisitos funcionais do que pelos não funcionais. E à medida que você evolui como desenvolvedor sua carga de preocupação com o não funcional aumenta.

Nas conversas sobre carreira que tive com meus gestores abordamos essas minhas características e concluímos que ser PO poderia ser um bom caminho pra mim. Em dado momento apareceu a oportunidade de exercer essa nova função no mesmo contexto em que era desenvolvedora, ou seja, naquela aplicação que eu conhecia até os “if”s, eu passaria a planejar em vez de escrever. Aceitei essa nova aventura e estou aqui pra contar como o passado de desenvolvedora influenciou o presente.

Quando você é um PO, deve zelar pelo produto, buscando criar e organizar demandas que atendam as necessidades e oportunidades do negócio, sem soltar a mão do time de desenvolvimento no que se refere a qualidade técnica. Inclusive tem outro artigo legal sobre isso, é o “Me tornei um Product Owner, e agora?”.

Esse outro papel também é incrível porque você tem uma influência diferente sobre esses seres artificialmente vivos, que são as aplicações. Além de lidar mais diretamente com esses seres realmente vivos e muito mais complexos, que são as pessoas, enquanto elas cuidam dos seus próprios pedacinhos do todo que é a organização.

Quando em específico você é um PO que já foi parte do time de desenvolvimento, você tem a vivência desse outro lado e, com isso, uma visão mais clara da complexidade e impacto das tarefas. Essa vivência também te ajuda a especificar as demandas de uma maneira mais tangível do que seria apenas mencionando as necessidades. Além disso, você consegue prover mais amplamente os recursos e informações que podem viabilizar ou facilitar a execução da tarefa.

Mas devo também avisar, há algumas questões com as quais é preciso ter atenção. Quando você já tem uma ideia de como faria uma determinada tarefa, corre o risco de se exceder no quanto embute isso na especificação e acabar não dando espaço para que os membros do seu time apliquem as ideias deles. É preciso ter esse desapego, o que pode ser desafiador, mas quando alcançado te permite aprender muito com eles, tanto sobre os assuntos técnicos, quanto sobre os méritos e fraquezas dentro do seu próprio papel.

Isso significa que você sempre deve guardar seus conhecimentos e opiniões para si? Não! Nessa posição você justamente consegue ajudar enriquecendo as explicações com o ponto de vista técnico, num sentido de sinalizar possíveis dificuldades antecipadamente. Suas experiências anteriores podem também agregar sugestões e casos análogos que podem auxiliar na compreensão e resolução de problemas.

Esse é um aspecto a destacar, a comunicação. Quando você já esteve do outro lado, você fala o mesmo idioma que os desenvolvedores, que é esse “tecniquês” misturado com negócio e com referências ao próprio código. O que facilita bastante quando eles precisam te sinalizar algum impedimento, necessidade ou complexidade.

Em resumo, quando seu papel é ser uma ponte, todo conhecimento que tiver sobre os dois lados que você interliga pode gerar valor de alguma forma.

Agora, se tiver mais alguns minutos nessa vida corrida que levamos, a subjetividade e eu te oferecemos chá e biscoitos enquanto conversamos sobre “carreira” e a parte do “mudar”.

Por que mudar? Como saber qual é a melhor escolha?

Se formos românticos, podemos dizer que no trabalho dedicamos grande parte de nossas vidas ao propósito da carreira e da organização que escolhemos estar. Se formos práticos, temos uma pilha desses atestados de adulto, chamados boletos, para pagar.

Eu, por exemplo, escolhi o mais humano dos cursos de computação, Sistemas de Informação. Encantei-me com o ideal dele de ajudar empresas a prosperar através da tecnologia, diferentemente dos demais, tendo a tecnologia como um meio e não um fim. Legal, né? Mas pra fazer isso é preciso adquirir uma infinidade de conhecimentos, dos temas mais interessantes àqueles que fazem nos perguntarmos se vale a pena.

O ponto é, como tudo na vida, equilíbrio. Nós nunca vamos fazer apenas aquilo que gostamos no trabalho, sempre há aquelas tarefas que você não gosta muito, mas o seu emprego precisa te motivar para que não seja apenas um fardo. Além disso, dificilmente você será um bom profissional detestando o que faz. Por mais brega que seja, o que é feito com o coração tem muito mais qualidade.

No fim das contas, autoconhecimento é sempre parte da resposta. Entenda suas habilidades, necessidades e motivações e elas te indicarão o caminho. Se você é bom numa coisa, como poderia fazer ela ser bem aproveitada? Se você ama uma coisa, como se aprimorar nela para ter sucesso?

No campo de motivações, há diversas, como aprendizado, autorrealização, remuneração e outras mais. Todos temos várias em alguma dose e elas são determinantes na sua satisfação geral com sua carreira.

Há um livro muito interessante sobre esse assunto chamado “Seja a pessoa certa no lugar certo” do Eduardo Ferraz. Nele são abordados temas em torno desse alinhamento entre você e a sua carreira, como motivadores, perfil comportamental, talentos, entre outros. Traz inclusive alguns testes pra te ajudar a identificar os seus. Fica a recomendação.

Quando pensamos em mudança de carreira, sempre nos vem à mente aquelas pessoas que mudaram radicalmente. Conheço biólogas que se tornaram administradoras, farmacêuticas que se tornaram desenvolvedoras e designers web que abriram lojas de roupas. Essas são mudanças incríveis porque necessitam de muita coragem e humildade para recomeçar. Imagino que também resultem num sentimento mais forte de “Agora estou no meu lugar”.

Mas não é preciso ser radical. No meu caso, os meus próximos passos naqueles trilhos estavam apontando justamente para aquela parte do meu trabalho que eu gosto menos. Sendo sincera, eu gosto de estar no meio e fazer um pouco dos dois, mas chega o momento de dar o próximo passo e o meu foi para o lado.

Percebi que eu posso, tanto continuar em contato com as coisas que eu fazia de outra maneira, agora organizando em vez de executar, quanto encontrar novos interesses. Por exemplo, eu sempre gostei de aprender e descobri recentemente que eu adoro ensinar, cada vez que um colega vem tirar uma dúvida conceitual e sai com tudo mais claro meu coração fica contente.

Esse contentamento de um trabalho bem feito é o que vai fazer aquelas horas todas não serem apenas um fardo e sim uma parte da vida como outras.

O epílogo

Nessa grande variedade de áreas, empresas e funções pode ser difícil encontrar um bom caminho a seguir. Eu comecei um e agora estou começando outro que faz um novo proveito das minhas habilidades, compõe um equilíbrio diferente das minhas motivações e traz toda uma coleção de novos desafios. É muito importante lembrar que ninguém disse que é obrigatório mudar e nem que só é possível mudar uma única vez. Nós, humanos, vamos buscar a felicidade enquanto estivermos vivos, então sempre haverá uma próxima chance.

Muito obrigada pelo seu tempo, foi um prazer compartilhá-lo com você. Até logo =)

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