Mais de 70% dos estudantes LGBTs sofreram homofobia na escola, diz pesquisa

Danilo Motta
Empoderamento LGBT
Published in
4 min readOct 19, 2017
Foto: Agência Brasil

Pesquisa apresentada nesta quarta-feira (18/10) em audiência pública na Câmara dos Deputados revela que 73% dos estudantes brasileiros que se identificam como LGBT já sofreram bullying homofóbico na escola. O levantamento revela, também que 60% se sentem inseguros no ambiente escolar e 37% já chegaram a ser vítimas de violência física.

A pesquisa foi realizada em sete países latino-americanos: Brasil, Argentina, Chile, Uruguai, Peru, Colômbia e México. Segundo a reportagem da Agência Câmara, os dados são muito parecidos em todos eles. A única exceção é o Uruguai, onde todas as taxas são menores do que 50%.

Para o historiador Vinícius Zavalis, mestrando em História Social, o bullying homofóbico é recorrente não só na educação básica, seja pública ou privada, mas também na universidade e até na pós-graduação. Segundo o pesquisador, uma das consequências é a evasão escolar, e o caso é ainda mais grave em relação às pessoas trans.

Vinícius Zavalis vê avanço no debate sobre a questão do bullying homofóbico nas escolas

“As pessoas trans dificilmente conseguem se manter na educação formal não só pelo bullying escolar, mas também pela falta de apoio da família”, ressalta.

Outra pesquisa divulgada recentemente aponta que quase ¼ dos jovens não vai concluir os estudos este ano. Ou seja, aproximadamente 2,8 milhões de estudantes entre 15 e 17 anos vão abandonar seus estudos, não vão se matricular para o ano seguinte ou serão reprovados, segundo informações da Agência Brasil.

O trabalho elenca 14 fatores que contribuem para o abandono escolar — dois particularmente significativos aqui neste contexto. O primeiro está relacionado à violência praticada na escola, nas redondezas ou no próprio ambiente familiar. O outro, a um clima escolar que não proporcione sensação de acolhimento. Somados aos demais, estes pontos contribuem para o desencorajamento do aluno continuar seus estudos.

“Atualmente, existem diversas praticas pedagógicas para diminuir a violência escolar e o bullying homofóbico. Debate gênero e diversidade sexual como conteúdo transversal das disciplinas escolares tem sido visto como uma das formas de diminuir a violência escolar contra a população LGBT. A participação da família das pessoas LGBT também é muito importante. Uma família atuante na escola consegue mediar e até defender seu filho de situações constrangedoras e de violência”, avalia Zavalis.

Sentindo na pele

Zavalis conta que percebe um avanço desde o seu período escolar se comparado à atualidade no enfrentamento à discriminação contra LGBTs nas salas de aula.

“Como homossexual, a época da escola não foi nada agradável para mim. Entretanto, eu percebo que de uns 5 anos para cá essas questões têm sido mais problematizadas pelos educadores. Na minha época de escola o bullying era naturalizado, mas hoje os próprios alunos e também os professores criticam o bullying e, inclusive, a homofobia. Não que hoje nos tenhamos um ambiente ideal para a população LGBT, mas nós já avançamos muito com a inclusão dos debates sobre diversidade sexual”, conta.

O historiador Rodrigo Ramos Lopes relata que em suas aulas no Ensino Fundamental e Médio sempre deixou clara sua orientação sexual para os alunos, como forma de naturalizar a questão.

Para Rodrigo Lopes, a discriminação nas escolas é um reflexo do que acontece na sociedade como um todo

“Felizmente, na escola em que trabalhei — laica, privada e na área nobre da cidade — sempre fui aberto com meus alunos sobre minha sexualidade. Ou seja, se perguntassem se eu tinha namorada, respondia com naturalidade que tinha namorado e seguia a aula. Sempre tentei trazer que esse era um aspecto da minha vida, que era completamente natural e que ao longo da vida eles encontrariam com pessoas, amigos e profissionais de vários espectros de sexualidade. Tive alunos do sexto ano do Ensino Fundamental ao terceiro ano do Ensino Médio e nunca tive maiores problemas com isso. O contraditório é que percebia que entre eles a questão era diferente: havia episódios de homofobia, ao menos na utilização de xingamentos referentes a sexualidade alheia”, detalha.

Para Rodrigo, este tipo de situação se observa por conta de um contexto sociocultural maior, que extrapola os limites da sala de aula e as escolas, muitas vezes, não só negligenciam o problema como o reforçam, através de determinadas brincadeiras e piadas de cunho discriminatório que alguns profissionais insistem em fazer em sala de aula.

“Acredito que a escola não seja um microcosmo desvencilhado da sociedade. Logo, acaba reproduzindo aspectos presentes na mesma e muitas vezes contribuindo para ampliá-los em vez de combatê-los. Existe um machismo institucional — que vem desde as primeiras instituições com a qual a criança tem contato, como a família e a religião — que pode ser combatido ou amplificado no espaço escolar. Assim, muitas vezes as crianças e adolescentes trazem esse machismo estrutural e a consequente homofobia que dele provém. A questão é que, não raro, o espaço escolar, ao invés de lutar contra isso, não só negligencia como fortalece esses aspectos”, analisa o professor.

--

--