O compositor Wolfgang Amadeus Mozart pode ser considerado um dos pioneiros no uso do crowdfunding

Crowdfunding: As Origens Não Reveladas

As primeiras inciativas de financiamento coletivo no Brasil e no mundo são anteriores a internet ou os computadores.

Anthony Ravoni
Empoderar
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5 min readNov 12, 2016

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A chegada do termo crowdfunding (financiamento coletivo) ao Brasil por meio de reportagens em cadernos de tecnologia e a inicial adoção de sua nomenclatura em inglês podem causar a impressão de se tratar de um fenômeno extremamente novo, fruto da sociedade virtualmente conectada. Mas essa não é a realidade.

Apesar das diferentes adaptações do conceito nos últimos anos e sua transformação em um modelo de negócio para inúmeras plataformas digitais, a dinâmica por trás do termo é uma concepção muito anterior a instalação dos cabos formadores da world wide web.

A Guerra de Tróia e a saga do guerreiro Aquiles se popularizaram através da nossa sociedade graças a uma iniciativa pioneira de crowdfunding

Os pioneiros

Em 1713 o poeta britânico Alexander Pope recebeu contribuições financeiras de 750 pequenos patrocinadores para publicar 15.693 linhas de poemas que ele havia traduzido do grego antigo para o inglês. Segundo Pope “This Work shall be printed in six Volumes in Quarto, on the finest Paper, and on a letter new Cast on purpose; with Ornaments and initial Letters engraven on Copper”. Cada apoiador contribuiu com duas moedas de ouro e como agradecimento teve o seu nome listado no livro inicial da série de seis volumes. Na publicação financiada coletivamente se encontra uma tradução da saga grega Ilíada de Homero utilizada até os dias atuais.

Lista dos apoiadores do “crowdfunding” de Alexander Pope

O compositor austríaco Mozart sempre foi considerado um talento precoce, aos 5 já compunha suas primeiras sinfonias e aos 12 já dominava mais de 5 instrumentos musicais. Mas o que muita gente não sabe é que sua falta de paciência com patrões e mecenas fizeram com que ele fosse precoce também no uso do financiamento coletivo.

Estes três concertos, que podem ser realizados com a orquestra completa, incluindo instrumentos de sopro, ou apenas por um quarteo, que está com 2 violinos, 1 viola e violoncello, estará disponível no início de abril para aqueles que se inscreveu para eles (muito bem copiados , e supervisionado pelo próprio compositor)”

Essa foi a “descrição da campanha” que o músico empreendeu para financiar coletivamente seus concertos. A recompensa oferecida aos mais de 176 contribuintes foram os manuscrito das obras que seriam apresentadas.

Campanha de arrecadação de fundos para a construção do pedestal da Estátua da Liberdade

Crowdfunding da Estátua da Liberdade

A Estátua da Liberdade foi a primeira intervenção urbana do mundo financiada por crowdfunding. O monumento foi esculpido em comemoração ao centenário da assinatura da Declaração da Independência dos Estados Unidos em um gesto de amizade da França para com o país norte-americano. A estátua foi projetada e construída pelo francês Frédéric Auguste Bartholdi e sua confecção viabilizada por meio de uma arrecadação de fundos promovida pela recém criada French-Ameican Union. A iniciativa contou com uma adesão massiva dos cidadãos franceses. Entretanto, quando a obra desembarcou no porto de Nova Iorque em 1885 ainda não havia sido construído nenhum suporte onde ela pudesse ser erguida. A estátua então teve de ser descarregada na ilha de Bedloe e aguardar a doação de um montante suficiente para a construção de um pedestal que pudesse suportar suas mais de 200 toneladas. Ao contrário das expectativas, essa doação não veio de nenhum cidadão milionário da cidade de Nova Iorque ou do governo americano, mas sim através de uma campanha de financiamento coletivo guiada no exemplo francês e promovida pelo editor e jornalista Joseph Pulitzer.

Pulitzer arrecadou mais de US $ 100 mil em seis meses através de uma campanha massiva em seu periódico jornalístico, o New York World,. Dinheiro mais do que suficiente para construir o pedestal. Ele propôs imprimir o nome de cada indivíduo que fizesse uma contribuição na capa do seu jornal, independente do valor doado. Quem contribuísse ganharia uma miniatura da Lady Liberdade para cada unidade de dólar doado. Por se tratar de uma publicação de massa os editorias do jornal faziam um apelo à responsabilidade cívica da classe trabalhadora.

“A Estátua da Liberdade não é um presente dos milionários da França para os milionários da América, mas um dom de todo o povo da França para todo o povo da América” — Joseph Pulitzer

Em 11 de Agosto de 1885, a campanha já havia recolhido as doações de mais 125 mil pessoas que contribuíram em média com U$ 0,86 cada uma.

Considerado “uma das novas 7 maravilhas do mundo”, o Cristo Redendto foi erguido com os fundos arrecadados coletivamente através de uma campanha organizada por Dom Sebastião Leme em setembro de 1923: a “Semana do Monumento”. Se levarmos em conta os inúmeros relatos que são possíveis encontrar sobre essa ação de captação de recursos em sites na internet e veículos de comunicação do governo do estado do Rio de Janeiro, é possível afirmar que o sonhos de construir um monumento de tal tamanho genuinamente brasileiro foi capaz de mobilizar grande parte da sociedade brasileira, incluindo a comunidade indigena dos Bororós no estado do Mato Grosso. Infelizmente, ao contrário dos relatos sobre a construção do pedestal para Estátua da Liberdade, os relatos consultados sobre a campanha de arrecadação para a construção do Cristo Redentor são imprecisos e não citam informações como o montante arrecadado por meio da campanha encampada por Dom Sebastião e o número aproximado de colaboradores.

A prática posteriormente denominada como crowdfunding já era presente em nossas sociedades, a expansão do acesso à internet e a chamada Web 2.0 apenas permitiram que a dinâmica do financiamento coletivo deixe de reunir apoiadores por uma proximidade geográfica e passasse a reunir por uma proximidade ideológica.

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Artigo escrito com base em pesquisa acadêmica realizada no bacharelado de Estudos de Mídia na Universidade Federal Fluminense (UFF).

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Anthony Ravoni
Empoderar

Consultor de Mídias Digitais & Crowdfunding com foco em projetos de impacto social e cultural. Já passou por Medicos Sem Fronteiras e @catarse