Como empreender e se sustentar ao mesmo tempo?

Larusso
Empreendedorismo Brasil
9 min readMay 2, 2015

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Por Larusso.

É o dilema de todo empreendedor em estágio inicial. Você precisa de tempo pra aprender a entregar valor e fazer dinheiro com seu negócio, mas tem contas a pagar.

Pra começar, nenhum empreendimento começa se (te) pagando. Um novo negócio requer um tempo de maturação, um período de aprendizado do empreendedor, até que ele realmente passe a entregar valor para as pessoas e receber dinheiro por isso.

Isso posto, eu não tenho a grande resposta. Se você quiser parar de ler por aqui, tudo bem. Suspeito que não exista uma única verdade, que sirva pra todo mundo. Dinheiro é um assunto profundo que esconde muitos outros. Como a nossa relação com o que consumimos, nossa autoestima, nossa humildade e ambição, nosso medo e coragem. Não é minha pretensão matar a charada tão cedo.

Mas tenho quatro ideias em construção pra te dar. Espero que elas possam te ajudar a entender este momento. Busco melhorá-las e estou à procura da quinta. Se ela estiver com você, por favor, me dê. Obrigado.

Antes, três toques:

Primeiro, acredito que empreender por dinheiro não é um bom negócio. Se esta é sua grande motivação, volte duas casas e leia este artigo.

Segundo, parto do princípio de que empreender com dívida é um negócio ainda pior. Terrível, na verdade. Por isso, desconsidero a possibilidade de um empréstimo bancário. Sugiro você investir o mínimo de grana em um novo negócio. Te adianto um aprendizado do LAUNCH!: o mínimo é zero. Feche a torneira, diminua os custos agressivamente.

Terceiro, só tempo de aprendizado não basta para prosperar financeiramente. É preciso entregar muito valor. Resolva brilhantemente um problema, preferencialmente grave, e você poderá receber dinheiro. Tem que trabalhar, não tem jeito.

Chega de pormenores. Aí vai a primeira das quatro ideias pra você se sustentar e empreender ao mesmo tempo.

1. Gaste sua poupança

Se você parasse de fazer dinheiro hoje, quanto tempo conseguiria viver com os mesmos padrões de consumo? Essa é uma medida de riqueza. Tendo seis meses de economias, talvez você tenha três para começar a ganhar algum dinheiro com seu novo negócio.

Se conseguir, será rápido. Considere que você levou muitos anos para ganhar dinheiro trabalhando pra alguém. Se não conseguir, você ainda tem mais três meses para voltar a fazer o que fazia, ou continuar tentando, com mais aprendizados acumulados.

Um dia, tive uma poupança para seis meses, trabalhando como assalariado. Antes de decidir usar essa grana para bancar meu período de aprendizado, me perguntei francamente:

Por que estou juntando esse dinheiro? Para ter mais qualidade de vida, um dia? Vou ter agora. Estou trabalhando para, um dia, poder parar de trabalhar? Vou parar agora.

Foi a reflexão que bastou para eu não ter medo de gastar minha poupança.

Se um dia o pé de meia me deu segurança para “caso alguma coisa acontecesse”, considero que essa coisa aconteceu. Eu estava muito infeliz e usei o dinheiro que tinha para mudar completamente de vida. Ele durou um ano. Muito mais do que imaginei. Meus custos diminuíram. Foi o tempo suficiente para eu aprender muito sobre mim, a vida que eu quero levar e, principalmente, como eu posso gerar valor e ser pago por isso.

Não foi fácil, mas foi muito melhor do que a vida que eu levava. Gastar a poupança foi um excelente negócio para mim. Hoje, entendo que o dinheiro está a meu serviço, e não eu a serviço dele. E só descobri isso quando passei a usá-lo para o que importa, no caso, descobrir o que queria fazer e viver a vida que sempre desejei.

Talvez você não tenha uma poupança e essa ideia não te sirva. Com você, a ideia número dois.

2. Faça jornada dupla

Ninguém disse que seria fácil.

Deve existir uma escala infinita entre o trabalho insuportável e o emprego maravilhoso. Se você está mais pro lado dos que batem ponto com um sorriso no rosto, provavelmente nem pensa em empreender. Mas, como está lendo este texto, o faniquito está em você. Empreender é coisa de quem está incomodado.

Eu sei que continuar suportando um trabalho sem sentido, o chefe autoritário e a sensação de que a vida está passando lá fora é horrível. No entanto, se você não tem uma gordura pra segurar as pontas, manter-se no emprego enquanto você empreende um novo negócio talvez seja um caminho viável. Tudo bem se não é a coisa mais deliciosa do mundo.

Se você já realiza um trabalho que é valorizado financeiramente por outras pessoas, talvez deva aproveitar dessa facilidade enquanto cria uma nova profissão para si mesmo. Às vezes, temos que vender nosso tempo fazendo o que não queremos, mas gerando valor, enquanto desenvolvemos as competências necessárias para fazer o que queremos e sermos pagos por isso.

A questão é: o plano paralelo precisa ser executado.

O trabalho das 8h às 18h muda de cara se for encarado como o que sustenta o trabalho das noites e fins de semana. É o famoso vender o almoço pra comer a janta. São várias as histórias dos empreendedores que mal dormiam a noite, passaram anos construindo o caminho paralelo em horários alternativos. Se você for bom no que quer fazer, talvez não precise se sacrificar tanto. O trabalho não acontece no trabalho. Das oito horas que passamos no escritório, quando muito, metade é realmente produtiva. Ou seja, dá pra fazer muita coisa em pouco tempo no turno inverso. Comece desligando a tv.

Ao longo do tempo, a tendência é que uma das jornadas sobreponha a outra, já que ninguém aguenta viver sem descanso e tempo livre. O importante é começar agora e encarar os próximos dias no emprego como um período de transição. Não haverá o momento em que você estará 100% pronto pra demissão e o salto de fé. O caminho é feito de pequenos passos. Aumente o tempo e a energia dedicada ao seu próprio projeto. E, se possível, diminua gradativamente a carga de trabalho principal, na medida que a grana do seu novo negócio começa a entrar.

Eu, infelizmente, não sou bom com jornada dupla. Até tentei criar um caminho paralelo enquanto mantinha o emprego. Não deu certo. Preferia usar meu tempo livre tentando compensar com lazer a semana de trabalho pesado. É claro que também não deu certo, em termos de empreendedorismo. Fazer jornada dupla é pra quem consegue desligar uma chavinha na cabeça e se manter motivado. Tanto no trabalho do dia, quanto no da noite. Eu não sou desse tipo.

Mas o Estaleiro Liberdade nasceu assim. Como projeto paralelo em relação a outro negócio que fundei meses antes, o Nós.vc. Pouco a pouco, a escola pirata foi tomando o posto de principal negócio na minha vida. Meus dois sócios da época, também tocavam outros empreendimentos; Cabral, Engage e Amaral, Semente. Isso fez o Estaleiro nascer ousado e ao mesmo tempo sem pretensão. Não tínhamos a obrigação de fazer dinheiro rapidamente. O que é maravilhoso. Criar e desenvolver um negócio assim o torna muito mais leve e, por incrível que pareça, aumenta as chances de prosperar financeiramente.

Agora, se o seu comichão é imenso, assim como a tristeza ao acordar na segunda-feira de manhã, talvez a jornada dupla só te leve a querer ainda mais abandonar o emprego. Aí vai a terceira ideia das quatro.

3. Seja sustentado por alguém

Calma, vou explicar.

Acreditamos, num primeiro olhar, que ter as contas pagas por outra pessoa é coisa feia. Já encarei assim também. Hoje, apesar de não viver na pele esta situação, mudei de ideia. Convivi com pessoas que têm essa oportunidade e entendi que ela também é um dilema. Parecia uma questão fácil, mas é assunto cabeludo, envolve uma boa dose de humildade, coragem e profundidade na relação.

Talvez exista um trauma coletivo em torno da ideia de ser sustentado pela família, amigos ou companheiros. Duas figuras que você não quer ser, presentes no imaginário popular. O eternamente jovem vagabundo profissional que não consegue sair da casa dos pais, mesmo depois dos 30, 40… Outro, o marido, ou a esposa, que é completamente dependente da renda do parceiro e se sente menor por isso.

No nosso caso, o cenário é diferente. Queremos mudar de atividade, empreender, trabalhar com o que importa, realizar nossos sonhos e receber grana justa por isso, certo? Ser sustentado por alguém não é uma condição permanente, nem um objetivo. Assim como gastar a poupança, ou fazer jornada dupla, ter as contas pagas por alguém não é pra vida toda.

Se você é amado por pessoas que podem e estão dispostas a te bancar nesse período de transição, agradeça. Isso é raro. Agora, cabe a você fazer sua parte. Não é fácil aceitar ajuda. Tampouco é saber pedir. Olhe menos pro próprio umbigo e entenda a posição do outro.

Muitas vezes, quem está bancando se sente feliz por poder ser útil e cuidar de você. Este é um jeito de estarem mais próximos. É humano o desejo de sentir-se parte de uma construção conjunta, poder contribuir para a realização de sonhos e conectar-se profundamente com quem amamos.

Conseguir ser ajudado é também uma forma de ajudar.

Alcancem um acordo sobre valores, tempo de suporte e objetivos comuns e tornem o caminho mais saudável. Se ficar confortável pra todos os envolvidos, por que não aceitar? Só será desconfortável pra você, que está sendo sustentado por alguém, se você for incapaz de tornar as coisas claras. Talvez seja necessário encarar o sentimento ruim de ficar em dívida. E seguir em frente. Talvez um dia você poderá pagar, de diversas formas. Talvez não. Lidem com isso.

Se alguém deposita tamanha confiança em você, a ponto de te sustentar enquanto você aprende a empreender, que bom, você tem um privilégio que pouca gente tem.

Agora, se você não tem uma poupança, não está disposto a fazer jornada dupla e não tem ninguém pra te sustentar enquanto começa a empreender, não vai ser fácil. Sinto lhe dizer que a quarta ideia é a mais difícil de todas.

4 . Volte no tempo e seja uma criança empreendedora

Desculpe se te desapontei, mas não há segredo. Para pagar as contas e ter seu tempo de aprendizado, até gerar valor com seu negócio, é preciso queimar uma gordura. Um recurso excedente que está ao seu alcance. Poderia ser uma grana guardada, um salário, o suporte de quem te ama. Ou, ainda, você poderia ter aproveitado o momento em que teve tempo e energia de sobra, sua juventude.

Um novo negócio é como a semente de uma plantinha. Ela ainda não é capaz de produzir a própria energia. Mas guarda em si um pequeno estoque de nutrientes até que consiga fazer fotossíntese. Ela herdou esse excedente. Por outro lado, ainda não consegue gerar frutos.

O novo negócio precisa de um tempo de evolução até parar de pé. Enquanto isso, é sustentado por um excedente.

Naturalmente, nós, seres humanos, também temos um tempo em que somos sustentados. Adultos cuidam de crianças até que aprendam a andar com as próprias pernas. O grande problema é que passamos muitos anos da vida nos preparando para fazer provas. Depois, somos ensinados a obedecer alguém. Perdemos muito tempo sem nos responsabilizar pelo nosso próprio caminho. Assim, fica difícil viver a vida, se privando de aprender com ela acontecendo.

Se, quando criança, conversássemos mais sobre dinheiro, aprendêssemos a fazer as coisas e tocássemos nossos próprios pequenos projetos, teríamos muito mais condições para empreender quando adultos. Faríamos melhores escolhas. Teríamos mais autoconfiança. Ganharíamos em técnica e prática. O que acontece é que não aprendemos a voar e caçar quando éramos filhotes de passarinho. Crescemos e continuamos esperando alguém vir nos alimentar.

Conheço alguns exemplos de crianças e adolescentes empreendedores. Não estou falando de trabalho infantil. São projetos escolhidos por eles, para serem executados no tempo deles. Muitas vezes sem pé, nem cabeça. Não importa. O mais valioso é o aprendizado. É o tipo de educação que considero muito mais empolgante que a escola.

Voltar no tempo (ainda) não é possível. Mas podemos oferecer algo diferente aos nossos filhos e netos. Haverá um período na vida em que eles serão sustentados por nós. Se tiverem uma educação empreendedora, talvez não precisem ler este textão.

Quanto a nós, pobres adultos, só nos resta começar agora.

Já que não começamos ontem. No futuro, descobriremos que iniciamos cedo nosso caminho empreendedor. Sempre pode ser cedo. Seremos os velhinhos que começaram a empreender quando eram jovens. Não importa sua idade, você sempre pode ser jovem, se quiser.

Originalmente publicado no meu blog, onde escrevo todos os dias.

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Larusso
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