Como são financiados os empreendimentos em Jornalismo digital no Brasil

Atentos à fragmentação, os empreendimentos digitais do Jornalismo criam, no início das suas atividades, a expectativa de obter recursos de várias fontes de financiamento. Em tese, esse modelo poderia reduzir a dependência de uma única fonte de receita e daria a possibilidade de testar outras que pudessem vir a ser mais rentáveis ou mais promissoras para a sustentação econômica do negócio no futuro. Na prática, o modelo é um pouco diferente.

Como se pode ver no primeiro gráfico abaixo, na fase de planejamento ou no início das atividades, os negócios digitais do Jornalismo independente pretendem contam com várias de fontes de receita. O número em cada uma das barras indica a quantidade de iniciativas que pretendiam obter recursos de cada fonte de financiamento antes do começo da operação. Gerar receita com produção de eventos, por exemplo, era o desejo de 20 das 64 iniciativas.

A maior expectativa recai sobre a publicidade e a rentabilização do conteúdo, o que acompanha a lógica dos negócios tradicionais de mídia, mas as iniciativas também se mostram esperançosas de contar com financiamento a partir de negócios correlatos, relacionados ao ecossistema em que vão atuar ou à capacidade de se tornarem relevantes para os públicos e as comunidades com quem pretendem dialogar.

A questão é mais preocupante quando esses dados são cruzados com a realidade, a expectativa comparada ao que efetivamente essas empresas são capazes de obter das fontes pretendidas. Nesse aspecto, o segundo gráfico é preocupante. Nele, é possível perceber que a Publicidade, embora fosse prevista como fonte de financiamento por 42 das 64 iniciativas pesquisadas, só gera receita para 26 delas. Portanto, somente 61,9% dos empreendimentos que pretendiam se financiar com publicidade estão de fato conseguindo recursos dessa fonte. O que equivale dizer que somente 40,6% das iniciativas pesquisadas recebem algum valor por exibição de anúncios.

Situação semelhante ocorre com as demais fontes de financiamento previstas. Somente 45,7% dos que pretendiam receber recursos advindos de assinaturas e venda de conteúdo estão recebendo algum valor e assim por diante: 44% de cursos e palestras; 45% de eventos; 44,4% de consultorias; 22,2% de e-commerce; 42,8% de doações e crowdfunding; 71,4% de editais e apoios institucionais; e metade dos que pretendiam receber recursos de publicações (livros etc).

Esse quadro mostra o quanto ainda é difícil lidar com a fragmentação. A diversificação da origem de receita exige mais de recursos que já são limitados. Vender conteúdo, criar cursos, promover eventos são atividades que exigem esforços e recursos que muitas iniciativas não dispõem. Em muitos casos, além da falta de fôlego e de mão de obra, há também a falta de conhecimento de como operar com algumas dessas fontes. É surpreendente, por exemplo, que mais de um terço das iniciativas que se propuseram a buscar receita de publicidade, mas não conseguem comercializar seus espaços, não usem modelos de exibição de anúncios negociados por terceiros como Google, Bing, YouTube e outros.

Há dois outros números muito importantes revelados pela pesquisa. Das 64 iniciativas pesquisadas, 13 não estavam recebendo nenhum recurso no período da consulta. Ou seja, 20,3% dos empreendimentos não contavam com nenhum ingresso de recursos financeiros naquele momento. Se esse número é preocupante, o outro dá esperanças. Dos 64 empreendimentos, 12 recebem recursos de outras fontes que não estavam previstas no planejamento ou no início das atividades. Isso demonstra que 18,7% das iniciativas, por opção ou necessidade, foram capazes de reinventar seu negócio para continuar operando.

Este texto foi originalmente publicado em interatores.com.br

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